terça-feira, agosto 16, 2016

Opinião: Galpgate e Kamovgate

O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, que “não acautelou o interesse público” no caso dos helicópteros Kamov, fará o mesmo no diferendo fiscal com a Galp? A Galp ofereceu viagens para o Euro 2016 a vários membros do governo e autarcas, do PS e da CDU, provavelmente não com o objetivo de obter vantagens diretas e imediatas disso, mas para “olear” o caminho para necessidades futuras. Parece imprescindível que a Galp seja obrigada a divulgar a lista de todos os que aceitaram o convite, como castigo imediato à empresa e a todos os beneficiados, mas também como profilaxia de ofertas futuras, desta e de outras empresas. É possível que a ameaça da divulgação futura de uma lista negra seja o suficiente para colocar um mínimo de bom senso e pudor em algumas cabecinhas.

Fernando Rocha Andrade, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais envolvido no Galpgate, tem uma longa e infeliz história de funções públicas. Entre 2005 e 2008 foi subsecretário de Estado da Administração Interna, tendo sido uma personagem central do estranho caso dos helicópteros Kamov, que foram entregues muito fora de prazo, para além de inúmeros problemas no seu funcionamento. Nessa altura, de acordo com auditoria do Tribunal de Contas, de 2014, o então secretário de Estado “não acautelou o interesse público de exigência do cumprimento integral dos contratos de fornecimento, tendo, ao invés e numa altura de incumprimento contratual, que não podia desconhecer, aligeirado os requisitos de entrega das aeronaves e flexibilizado as condições de fornecimento e de pagamento”.
Estão em causa milhões de euros de indemnização a que o Estado tinha direito e que foram simplesmente “perdoados”. Este gesto de Rocha Andrade, não sendo necessariamente corrupto, levanta uma forte suspeição. O que fez o Ministério Público, que recebeu o parecer do Tribunal de Contas através do representante da procuradora-geral da República junto do tribunal? Não é público ou, pelo menos, não tenho conhecimento de nada. Caso não tenha feito nada, tem de se dizer que a sua omissão é, ela própria, muito pouco tranquilizante.
Em 2016, nas suas novas funções no fisco, Rocha Andrade conseguiu gerir da forma mais inábil possível a revisão da forma de cálculo do IMI, revelando a sua enorme falta de tato político. Infelizmente, a reforma essencial de que o IMI necessita ficou esquecida. A fórmula de avaliação de imóveis usada pela Autoridade Tributária consegue esse prodígio de ignorância e incompetência de NÃO usar o valor da renda recebida pelo imóvel. 
Isto cria situações loucamente absurdas e injustas em que dois andares em tudo o resto iguais, mas um com uma renda antiga mínima e outro com uma renda atual, são considerados como valendo o mesmo. Pior ainda: o senhorio das rendas antigas, que já paga um imposto implícito brutal pelo subsídio de rendas que é obrigado a fazer, porque o Estado não assume as suas responsabilidades, é ainda obrigado a pagar tanto IMI como se recebesse uma renda de mercado.
Passado pouco tempo deste infeliz episódio, eis que Rocha Andrade nos brinda com uma nova demonstração da sua inadequação ao cargo que ocupa, aceitando um convite da Galp que, por mera coincidência, tem o Estado em tribunal por cerca de 200 milhões de euros que a empresa não quer pagar de imposto. 
Vários membros do governo já deram o caso por “encerrado” mas, em primeiro lugar, não o podem fazer porque todos os dias há novos desenvolvimentos e a revelação de novos convidados. Em seguida, porque ainda não ouvimos a opinião do Presidente da República. Cheira-me que Rocha Andrade só vai sair quando a sua saída já não ajudará nada o governo e só o prejudicará (texto de Pedro Braz Teixeira, Jornal I, com a devida vénia)

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