quarta-feira, abril 27, 2016

Opinião: Os Papeis do Panamá e os nomes e...os nomes!

Na sequência do que escrevi ontem neste blogue, sobre os critérios presentes nesta tarefa imensa de procurar desvendar os chamados Papeis do Panamá, no que a Portugal diz respeito, e da possibilidade de estarmos perante uma certa caça ao homem e ao nomes, sobretudo de políticos, em vez da procura da verdade no tocante à eventual de participação, sim ou não, de empresas e empresários, em negócios obscuros no âmbito dos offshores denunciados pelos referidos Papeis, fui hoje confrontado com uma notícia que, gostem ou não de o ouvir, no fundo dá-me razão absoluta:
Sindicato dos Jornalistas pede ao Expresso que revele os jornalistas nos Papéis do Panamá

O jornal refere uma lista de nomes que recebiam pagamentos regulares do "saco azul" do Grupo Espírito Santo. Dessa lista constam nomes de jornalistas. O Sindicato dos Jornalistas pediu ao jornal Expresso para divulgar os nomes dos jornalistas que diz estarem envolvidos numa investigação judicial relacionada com o designado "saco azul do BES".
"O Sindicato dos Jornalistas insta a que sejam revelados os nomes dos mencionados 'jornalistas', à semelhança do que tem acontecido, aliás, com outros profissionais, de forma a poder atuar em conformidade nos casos que, e se, vierem a ser provados", lê-se num texto divulgado na terça-feira na página na internet do sindicato.
O sindicato pede uma "clarificação, realçando que a credibilidade do jornalismo é fundamental em democracia".
"A credibilidade do jornalismo é fundamental em democracia e não podemos deixar que ela seja minada por suspeitas cuja existência ainda está por provar, nem permitir que toda uma classe fique sob suspeita. Saudando o jornalismo de investigação, o Sindicato dos Jornalistas apela a que o jornal Expresso aja com a responsabilidade que lhe compete", acrescenta.
Segundo o mesmo texto, o sindicato escreveu na terça-feira ao diretor do Expresso a pedir esta clarificação e "lamentando que o semanário tenha posto em causa todos os jornalistas, ao não identificar aqueles que, segundo afirma, constarão de uma lista de alegados envolvidos numa investigação ao Grupo Espírito Santo (GES)".
Na edição de sábado, o jornal refere que o Ministério Público tem em sua posse uma lista de nomes alegadamente envolvidos em pagamentos da ES Enterprises, o 'offshore' conhecido como "saco azul" do Grupo Espírito Santo. Dessa lista constam nomes de jornalistas, segundo o Expresso.
As novas notícias sobre "o saco azul do BES" têm sido divulgadas pelo Expresso e pela TVI no âmbito da investigação conhecida como "Papeis do Panamá".

Sou jornalista - detentor da Carteira  Profissional nº 318 - percebo que não é fácil gerir tanta informação passada para o exterior por uma "garganta funda" da Mossak e Fonseca, empresa com larga experiência na criação de empresas que operam no âmbito de offshores. Sei que a pressão é grande, a concorrência entre as equipas jornalísticas de investigação nos diferentes países - mais de 200 jornalistas - também não ajuda e não permite que um país, por exemplo, fique uma semana em silêncio absoluto enquanto outros países vão divulgando informações relativas ao que neles se passa.
Estranhamente o Sindicato dos Jornalistas parece alinhar numa certa psicose da caça ao nome, ao reclamar a identificação dos jornalistas que alegadamente terão sido pagos pelo GES/BES através de contas existentes em offshores.  O cenário admitido pelo Expresso em si mesmo é demasiado grave, pode porventura desvendar teias e ligações perigosas (será mesmo assim?) entre o chamado jornalismo económico e grupos empresariais ou financeiros. Julgo que se o Expresso não optar pela contenção, poderemos ser confrontados com uma realidade nova - independentemente de eu até perceber os argumentos do Sindicato dos jornalistas -  que em nada abonará a favor dos envolvidos e de uma classe em geral. Recordo que quando os Papeis do Panamá começaram a surgir, a primeira ideia que foi passada cá para fora foi a de que o "garganta funda" deste processo, o chamado bufo da empresa envolvida, terá alguma coisa a ver com os EUA e com interesses que não foram contudo devidamente desvendados. Ficou a dúvida sobre a existência ou não de interesse obscuros subjacentes a uma fuga de informação surgida do acaso. Mas que curiosamente deixou os EUA de fora de tudo quando todos sabemos o que se passa quando se fala de EUA, de offshores, de lavagem de negócios, de negociatas obscuras, etc.
Não sei o que vai acontecer a partir deste ponto, não sei tão pouco o que pretende o Sindicato dos Jornalistas, se pressionar a investigação se apenas forçar a que sejam divulgados os nomes reclamados, com todas as implicações daí resultantes. Mas mesmo aceitando que pouca ou nenhuma diferença existe entre os nomes de advogados-políticos só porque no âmbito da sua actividade profissional obtiveram procurações judiciais para criarem empresas em offshores (qual o crime?) e os jornalistas-tarefeiros que poderão ter sido pagos por vias a clarificar, não se sabe para quê e a troco do quê (e aqui as coisas podem complicar-se e muito), se faltar o bom senso e o pragmatismo, nesta fase em que as coisas estão, provavelmente o jornalismo poderá ser o grande derrotado de tudo isto. O meu receio é esse, sem visões corporativistas. Aceitando contudo ser urgente purificar tudo o que represente uma ameaça à credibilidade do jornalismo e dos seus profissionais (LFM)

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