O primeiro aspecto, de natureza política e pessoal
Em situações normais borrifar-me-ia para o deputado do PTP nem perdia tempo a elaborar este texto de opinião na medida em que são conhecidos os procedimentos e os seus
excessos no julgamento do carácter das pessoas. A justiça que ele reclama para
ele, e bem, acaba ele próprio por não conceder a ninguém já que segundo o
discurso do deputado são todos um bando de ladrões, bandidos e corruptos. Não
há ninguém que segundo JMC deva ser elogiado.
Este radicalismo
- que o próprio deputado devia perceber que não lhe favorece nem lhe rende
eleitoralmente nada - como as últimas eleições regionais o confirmarem, delas
ficando a dúvida sobre se teria sido ou não, claramente salvo pela adesão à
coligação com o PS - leva-o a exageros, não só de linguagem mas de atitudes.
O que aconteceu
na Assembleia Legislativa da Medira, provavelmente a contar com a imunidade parlamentar, não dignifica, desde logo o deputado protagonista do grotesco, mas também e sobretudo o parlamento, a instituição de que faz parte. Não sei se JMC
acha que deve desprestigiar a Assembleia, se entende que tudo isto reforça a
autonomia regional, sobretudo depois dos últimos grandes esforços e avanços
realizados na normalização da vida parlamentar regional. Tão pouco sei se existe
aqui presente aquela máxima - vem nos manuais - de que quanto pior, melhor,o
que não será o caso concreto. O que eu sei é que as pessoas não gostam disto,
detestam quando ultrapassam a linha vermelha da tolerância, mesmo na política,
com todos os seus defeitos e virtudes. Não acredito que os madeirenses,
independentemente das razões de queixa que possam ter, e terão, da política,
dos partidos e da política, não toleram que se destrua a imagem das
instituições democráticas representantes do povo.
Por isso, e com
base nessa lógica irrefutável, o que JMC fez foi desastroso e errado. Por isso condenável. Se pretendesse fazer aquele número, se pretendesse passar uma
mensagem à justiça - e adiante falarei disso - poderia tê-lo feito de muitas
outras formas. Nunca usando o plenário, desprestigiando a instituição e,
repito, desprestigiando os próprios deputados. Mesmo na oposição havia quem
achasse piada, antes das regionais de 2015, nestas diatribes. Hoje esse
sentimento não existe e admito que a maioria dos deputados, mesmo da oposição,
se sintam feridos e ofendidos no seu orgulho por fazer parte de uma instituição
ridicularizada desta forma. Salvo se o facto de terem sido eleitos pelo povo é
comparável a um qualquer mercenarismo político. Neste caso e para semelhante ente, tudo vale.
Teria compreendido esta reacção mais radical de JMC, se o palco tivesse sido outro, até porque
acho muito sinceramente que há alguma coisa de estranho, de muito esquisito,
por detrás da condenação a que o deputado alude, sobretudo pelos contornos do
caso e pela evolução entretanto registada e reconhecida pelo próprio Juiz Paulo
Barreto, no ano passado, relativamente à pessoa que movei o processo por
difamação contra JMC.
No fundo falamos
de uma questão pessoal que penaliza financeiramente o deputado por culpa própria.
Confundir política com a ofensa é absurdo e patético. JMC segundo a agente de
execução em causa ofendeu-a e o Tribunal, perante os factos, deu-lhe razão. O
que é que a política tem a ver com isso? O que é que o PSD da Madeira tem a ver
com isso? O que é que a Assembleia Legislativa tem a ver com isso?
Pelo contrário, até
podem revelar-se comportamentos perigosos para o deputado na medida em que
perante tudo o que se passou e considerando a obrigação dos eleitos de
dignificarem e protegerem a instituição pública de que fazem parte, estas situações
podem até ser passíveis de uma iniciativa imediata do próprio Ministério Público
contra os protagonistas, sejam eles deputados ou não – quantos assistentes dos
plenários da Assembleia da República estão a braços com processos nos tribunais
em Lisboa por terem interrompido os plenários parlamentares para protestarem?!
Se os cidadãos que votaram e que elegeram se arriscam a estas situações porque
razão os próprios membros das instituições têm imunidade e gozam de impunidade
quando se excedem e ultrapassam os limites do razoável?
Recomendo por isso
ao deputado JMC que tenha em consideração tudo isto e que separe o direito à
indignação e a liberdade de protestar, da escolha dos locais adequados e usando
para o efeito métodos e procedimentos que não lhe coloquem problemas adicionais
que apenas pioram a sua situação e podem até conduzir inclusivamente à perda de
mandato por decisão judicial.
Segunda questão, de natureza judicial
Repito
e insisto. JMC está a braços com um problema pessoal, decorrente de declarações
prestadas por iniciativa do próprio num quadro mais alargado da política
regional que o levou ao banco dos réus. Aliás isso nem sequer é novidade.
Eis-nos
chegados à segunda vertente deste assunto, que não pode ser descurada e que tem a ver com a justiça e com o reclamado direito à honra e dignidade pessoais que nalgumas situações concretas não tem legitimidade para ser posta em cima da mesa.
E é essencialmente por estas questões, pelo reverso da medalha de tudo isto, que percebo e compreendo a frustração de JMC, pressionado com várias derrotas nos tribunais que motivaram o pagamento de indemnizações impostas pelas sentenças proferidas.O problema é que se é um facto que JMC se terá excedido na linguagem utilizada nos ataques contra a agente de execução - entretanto suspensa das suas funções, envolvida em milhares de suspeições e que tem protagonizado uma estranha e caricata situação, denunciada na comunicação social, sem que a justiça portuguesa pareça dispor dos meios adequados para a localizar, investigar e julgar se for caso disso - outra coisa é denunciar ilegalidades e ao mesmo tempo fazer a apologia de uma condenação antecipada sem que os tribunais se pronunciem sobre o caso em concreto.
Ou seja, com o devido respeito pela justiça, é um facto que a partir do momento em que estão lançadas as suspeitas sobre o comportamento de determinada agente de execução, que por coincidência tem sido um alvo preferencial dos ataques do deputado do PTP, a questão que se coloca, e que confronta a justiça, é a de saber até que ponto os protagonistas de comportamentos alegadamente criminosos, passíveis de procedimento judicial e até de cumprimento de penas de prisão, se se provarem as acusações, têm ou não direito a reivindicar a defesa da honra e à dignidade pessoais. Duvido que uma pessoa, suspeita de cometer crimes - e não vi nada do que foi dito ser desmentido - e que alegadamente estará sem paradeiro conhecido (o que não deixa de ser estranho) tem direito a reclamar essa e essa dignidade. Não aceito que assim seja, pelo menos até que as acusações sejam negadas, que as dúvidas, incluindo de apropriação indevida de dinheiro, se dissipem e que todas as suspeitas sejam anuladas. Muito sinceramente recuso defender a honra e a dignidade de quem estiver nesta situação.
Acho que os tribunais não deviam julgar qualquer processo judicial movido por cidadãos nestas condições, neste caso concreto por uma agente de execução alegadamente fugida da justiça e da prestação de contas, até que tudo se clarifique. Como é que se aceita e compreende que um Tribunal julgue um cidadão, deputado ou não, por alegadamente ter proferido, e proferiu, declarações críticas excessivas, e foram, consideradas ofensivas, e admito que o possam ser, que visaram concretamente uma cidadã que a própria justiça reconhece estar sob suspeita, acusada de procedimentos indevidos, passíveis de roçarem a ilegalidade.
Não aceito que a justiça, contra a qual nada tenho, resolva julgar um processo associado a uma acusação de pretensa ofensa pessoal, quando a autora de tal procedimento judicial é um dos alvos da justiça. Não me parece, muito sinceramente, que o tribunal que julgou este caso saia bem do retrato ou que a justiça, que tem que ser imaculada, saia impunemente disto. Não se pode defender na barra dos tribunais a honra e a dignidade pessoal de uma pessoa alvo de suspeição por parte dos próprios tribunais, porque este comportamento acaba por alimentar a dúvida ou a suspeição, o que não é nada recomendável, sobre se determinados procedimentos foram ou não desencadeados só porque o réu era o deputado do PTP, conhecido por ser um crítico veemente e também excessivo da justiça em geral, e de alguns dos magistrados em particular.
É considerando as teias desta situação, as aparentes contradições envolvendo este caso, que compreendo a frustração, o desespero e a irritação de um deputado, com o vencimento penhorado em 700 ou 800 euros mensais, obrigado a pagar uma indemnização destinada a compensar as ofensas à "honra" e "dignidade" de uma pessoa que antes do deputado já devia ter sido detida, ouvida e porventura sentada no banco dos réus.
Pena foi que JMC tenha resolvido dar corpo a esse protesto legítimo e compreensível, não no plenário da Assembleia, ainda por cima sem que veja resolvida a situação, mas em locais mais directamente ligados à evolução deste caso judicial. (LFM)
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