quarta-feira, março 09, 2016

Opinião: dívidas, confusão, "Cuba Livre", etc

Surpresa
Foi com enorme surpresa que fiquei a saber hoje que Alberto João Jardim e João Cunha e Silva vão ser ouvidos perante a justiça na qualidade de arguido, no âmbito do processo "Cuba Livre", instaurado na sequência da chamada "dívida oculta" da Madeira, de 1,1 milhões de euros, que ficou conhecida em Junho de 2011, depois da troika ter desembarcado em Lisboa e de várias entidades terem apressadamente colocado em cima da mesa toda a documentação existente e não divulgada. Não sei se este quadro corresponde à realidade, mas a verdade é que esta constatação foi sendo repetidamente veculada desde então que hoje dificilmente qualquer pessoa aceita outro argumento, por muito válido e compreensível ou verdadeiro que seja.
Obviamente que este processo não ppode surpreende ninguém, dado que há muitpo que foi noticiado que o famoso juíz Carlos Alexandre decidiu remeter todo o processo para a Madeira por entender que não tinha competência legal para continuar com o apuramento de responsabilidades. Era tudo uma questão de tempo e essencialmente uma questão da imunidade política e/ou parlamentar deixar de vigorar por força da cessação de funções públicas.
Componente político-partidária
É inquestionável que existe uma forte componente política, partidária e mesmo pessoal, subjacente a este processo. Não fosse assim há quanto tempo a justiça teria agido, por iniciatva própria, sem estar sentada de sofá à espera de iniciativas populares, para perceber quem conduziu o país à falência, ao pedido de ajuda externa, à troika e à austeridade de 2011. Até hoje será que os portugueses sabem o que se passou, sabem porque faliu Portugal, sabem qual a dimensão da dívida quando foi pedida a ajuda externma, sabem quanto se gastou e mal entre 2005 e 2011, sabem qual a parcela dessa dívida pública nacional que foi dissipada ou ocultada pelos governos nacionais?
Acresce que este processo conheceu evolução política, sobretudo depois do envolvimento de dirigentes do extinto  PND e do próprio envolvimento do autarca de Santa Cruz, eleito pela JPP, o que confirma a existência clara de motivações políticas facilmente percetpíveis e que os tribunais não podem ignorar.
Estanoa a falar de um processo que já tinha cinco arguidos conhecidos, a que se juntam agora as duas principais figuras do anterior governo regional da Madeira. Não sei como é que as coisas se vão desenvolver mas cada vez mais percebo uma constatação inegável: o assunto não pode nem deve ser desvalorizado, deve ser olhado com atenção, desmistificando ou não as acusações, retorquindo com suporte documental e com factos.
Confusão entre a dívida regional e a dívida oculta
É igualmente inquestionável que se faz uma tremenda confusão, a começar pela comunicação social, entre a dívida da Madeira (que ascendia a 6.008 milhões de euros a 30 de Setembro de 2015, menos 628 milhões de euros face ao valor apurado no final de 2012,) e a chamada "dívida oculta" de 2011 (1,1 mil milhões de euros) que esteve na origem deste processo judicial. Basicamente há uma enorme confusão quando se fala no "Cuba Livre". Um acosia é falar na dívida da Madeira, estimada em cerca de 6 milhões de euros, outra coisa  e falar na tal dívida oculta de 1,1 milhões de euros, basicamente resultante de financiamentos contraídos pela RAM para garantir a realização de investimentos públicos, depois das dificuldades decorrentes da dramática quebra de receitas  imposta pela revisão da lei de finanças regionais de 2007 que viria a estar na origem de eleições regionais antecipadas. Uma lei que se manteve em vigor nos anos seguintes, enquanto Sócrates se manteve em funções.
A queda eleitoral em 2011
Em consequência disso, as eleições regionais de 2011 - e não vou falar do que se passou nesse acto eleitoral porque não é propriamente de História que estou a falar neste apontamento, certo de que um dia ficaremos a conhecer os contornos de tudo o que se passou nesses dois meses de campanha eleitoral, tudo o que de dramático e de surpreendente ocorreu, nessas eleições que viriam a ser as mais difícveis, desgastantes e desmotivantes de todas - ficaram marcadas por essa dívida, pela exigência de responsabilização, reclamada do CDS à extrema-esquerda de responsabilidades e protagonistas,  pela polémica em torno da sua dimensão e das consequências de tudo isto num pais falido e em crise grave, acabando o PSD regional, apesar de ter ganho e obtido a maioria absoluta, por sofrer um primeiro grande revés em eleições regionais (perda significativa de votos, deputados e aumento da abtenção para valor recorde) que eram, sempre foram, a sua praia. O aviso estava dado e provavelmente os sinais que daí resultaram foram assimilados. 
O PAEF
Seguiu-se em Janeiro de 2012 um  PAEF que se manteve em execução até final de 2015 e que serviu para resolver os problemas criados pelos tais 1,1 milhões de euros de dívida não contabilizados que tinha que ser incluída na contabilidade nacional e mais do que isso, tinha que ser quantificada e normalizada em termos da contabilidade orçamental da RAM. O relatório de avaliação da execução do PAEF referente ao 1º trimestre de 2012, o primeiro divulgado, referia que "para a avaliação do não agravamento do endividamento da Região, é necessário atentar à evolução da necessidade de financiamento que, de acordo com o Procedimento dos Défices Excessivos de Março, foi de 1.125 M€ em 2011". É um facto que o PAEF implicou mais austeridade, não apenas devido a cortes substanciais na despesa pública - as quedas do investimento público acabaram por gerar mais desemprego - mas também mais austeridade para os madeirenses, devido à execução de um conjunto de medidas específicas constantes do PAEF que Alberto João Jardim disse sempre ter sido imposto por Lisboa - e eu sei que foi - apesar da carta ter data do Funchal, sido impressa em papel timbrado do Governo Regional e assinada pelo Presidente do Governo Regional.
Nada de precipitações
Segundo a LUSA, que cita o Juiz Paulo Barreto, o facto de Alberto João Jardim e João Cunha e Silva constarem do requerimento de instrução, isso dá-lhes o direito "de serem constituídos arguidos para que, mesmo antes de serem ouvidos pela primeira vez, possam gozar de uma série de direitos processuais conferidos pelo Código de Processo Penal. Mas o facto de serem agora arguidos não significa que já haja uma avaliação do tribunal". Este processo teve por base um inquérito mandado instaurar a 28 de Setembro de 2011, pelo então procurador-geral Fernando Pinto Monteiro, e envolveu buscas e a apreensão de material e de documentação no edifício da agora extinta Secretaria Regional do Equipamento Social da Madeira, além da audição de 40 testemunhas e da constituição de uma equipa técnica. Em investigação estiveram as alegadas irregularidades na elaboração e execução dos orçamentos da Madeira e a problemas com o reporte dos encargos assumidos e não pagos, tendo o valor da dívida oculta sido estimada em 1.100 milhões de euros (LFM)

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