“Campeões do mundo em 1966, os britânicos
chegaram com estrondo ao México. Antes, Bobby Moore foi detido por supostamente
ter roubado uma pulseira de esmeraldas e ficou retido na Colômbia.
A história da seleção inglesa no Campeonato
do Mundo de 1970 é uma delícia. Prepare-se para aceitar que a sua vida é um
bocado aborrecida. É tempo de meter uma moedinha na máquina do tempo. Vamos a
isto: Bobby Charlton e companhia chegariam ao Mundial do México como campeões
do mundo. Quatro anos antes, no Inglaterra-66, os ingleses maravilharam os seus
adeptos e venceram a final de Wembley contra a Alemanha Ocidental (4-2). Geoff
Hurst foi o herói com um hat-trick — no total, marcou quatro golos, os mesmos
do alemão Franz Beckenbauer. Os “Magriços”, a seleção de Eusébio (nove golos) e
companhia, tinham sido eliminados por esta equipa nas meias-finais do torneio
(1-2).
Agora o México-70. A preparação da seleção
orientada por Alf Ramsey, o obreiro do título mundial que contava com Booby
Moore (capitão), Gordon Banks e Bobby Charlton, passava por jogar dois
particulares contra a Colômbia e Equador. O filme digno de Hollywood ocorreu em
Bogotá. Os ingleses estavam hospedados no Hotel Tequendama, onde havia algumas
lojas, entre elas uma joalharia. Bobby Moore, o capitão, e Bobby Charlton
decidiram então dar uma espreitadela para o segundo encontrar um presente para
a sua mulher. Charlton teria gostado de um anel que viu na montra mas não
ficaria muito tempo na loja. “Eu vi um anel em exposição mas não tinha preço e
decidimos entrar para saber o valor. A jovem senhora retirou o anel de uma
vitrina e trouxe-o até nós. (…) Discutimos o preço e percebemos que era
demasiado caro, por isso fomos embora… Estivemos na loja cinco minutos no
máximo. Eu não vi, certamente, uma pulseira de diamantes e esmeraldas como um objeto
que nos despertasse algum interesse”, explicou Bobby Charlton mais tarde.
Danilo Rojas, o dono da joalharia Fuego
Verde, e a sua assistente, Carla Padilla, ligaram para a polícia assim que os
dois jogadores saíram. Os agentes chegaram e os futebolistas defenderam-se das
acusações. Uma testemunha, Alvaro Suárez, corroborou a teoria dos donos da
joalharia, afirmando que viu a pulseira no bolso de Moore. Conclusão? O capitão
da seleção inglesa ficaria detido, num processo que duraria até 28 de maio, a meros
cinco dias do primeiro jogo do Campeonato do Mundo contra a Roménia do capitão
Mircea Lucescu, o agora treinador que passou os últimos dez anos na Ucrânia, a
treinar o Shakhtar Donetsk.
Alguns diplomatas britânicos entrariam em
ação em nome do primeiro-ministro, Harold Wilson, que exigia que o jogador
fosse libertado o mais rápido possível. Afinal, havia um título de campeão do
mundo para defender. Mesmo com um país inteiro contra eles: os episódios menos
infelizes que aconteceram e estariam para acontecer levariam os mexicanos a
torcer a favor dos adversários da seleção inglesa.
Alguns relatos sugerem que as autoridades
colombianas procuravam saber quem era o terceiro elemento junto dos dois
jogadores na loja. Já depois da morte do jogador, em 1993, Jeff Powell, o
jornalista que escreveu a sua biografia, revelou o que Moore lhe disse. “Talvez
um jovem da equipa tenha feito algo estúpido, uma brincadeira em más
circunstâncias”, desabafou. Powell chegou a dizer num documentário que Moore
lhe contou a versão inteira, mas só depois deste lhe prometer que a levaria
para a sepultura. A 28 de maio, Bobby Moore foi libertado, ainda que com
algumas condições ao barulho, pois ainda não estava livre do processo. O
capitão chegaria a tempo do primeiro jogo. Um-zero contra a Roménia, cortesia
de Hurst, o tal herói da final de 1966.
A novela continuou até 1972, altura em que
um juiz colombiano decidiu deixar cair as acusações contra Moore. No entanto, o
caso seria aberto um ano depois. O ponto final nesta história aconteceu em
dezembro de 1975, quando o caso foi finalmente fechado. De vez. O chefe da
polícia, Jaime Ramirez, reconheceu então que Moore foi vitima de uma armadilha
e que Suárez, o dono da joalharia, pagou a Rojas para testemunhar contra o
inglês. O plano seria chantagear o futebolista e, simultaneamente, obter
publicidade gratuita para o estabelecimento. Mais: a ideia de fazer mossa à
seleção campeã do mundo também não era de deitar fora. Rojas e Suárez seriam
ouvidos por um juiz, enquanto Padilla, a assistente, teria fugido para os
Estados Unidos.
Depois da vitória contra a Roménia, a
seleção de Alf Ramsey, na qual Moore era o capitão, perdeu com o Brasil (0-1,
Jairzinho) e venceu a Checoslováquia (1-0, Clarke). A mítica defesa de Gordon
Banks a cabeceamento de Pelé é digna de ser aqui lembrada. Épica! A queda dos
ingleses surgiria nos quartos-de-final contra um velho conhecido: a Alemanha
Ocidental. Beckenbauer seguia como o imperador daquela seleção, que contava
agora com um super avançado, um bombardeiro, “the one and only” Gerd Müller.
Três-dois para os germânicos e um bilhete de regresso para casa para os
ingleses. Perder é chato, mas já imaginaram o mar de histórias que Bobby Moore
levou para casa para deliciar os seus amigos e familiares? Isso não tem preço.
1970:
The England football team. Back row, from left: Shepherdson, B Labone,
Gordon Banks, T Cooper, Bobby Charlton, Martin Peters, Bobby Moore (1941 -
1993) and L Cocker. Front row, from
left: Alan Ball, F Lee, A Mullery, T Wright and Geoff Hurst. (Photo by Keystone/Getty Images)
“UMA EQUIPA DE BÊBADOS E LADRÕES”
Como se a história do capitão da equipa dos
três leões não bastasse, há ainda uma outra que em nada abonou a favor dos
então campeões do mundo. Reza a lenda, esta muito mais complicada de cruzar
informação e confirmar, Jque eff Astle, um avançado que ficaria na história do
West Bromwich Albion, não gostava nada de andar de avião. Solução? Beber uns
copos para acalmar os nervos e aguentar a viagem entre a Colômbia e o México.
Existem alguns relatos de que o jogador chegou embriagado e que terá tido ajuda
dos companheiros para se deslocar. Um jornal mexicano não perdoou e escreveu na
manchete de uma edição diária: “Uma equipa de bêbados e ladrões” (texto do Observador, com a devida vénia)