terça-feira, abril 02, 2013

"Que se Lixe a Troika": Núcleo duro dominado por militantes do BE e do PCP...

Escrevem os jornalistas do Jornal I, Carlos Diogo Santos e Pedro Rainho, que "bloquistas e comunistas representam um quinto do total dos activistas que organizaram maior manifestação desde 1974. O que defendem os membros do movimento que organizou as maiores manifestações desde 1974 contra o governo e a política de austeridade acordada com a troika? Quem são os seus membros? Como estão organizados? Estas são as perguntas a que o itentou responder nas últimas semanas com uma investigação jornalística ao movimento Que Se Lixe a Troika (QSLT). A primeira conclusão é que a entrada no QSLT não é fácil. O facto de os subscritores do manifesto do movimento terem de ser convidados e o alargamento estar dependente da aprovação interna é visto, confidenciaram ao i várias fontes do QSLT, como a prova de que este grupo não está aberto a todos, como defendido publicamente. O movimento apresenta-se, por outro lado, como apartidário, mas, segundo diversas fontes do movimento relataram ao i, quatro dos seis membros que compõem o núcleo duro são militantes activos do Bloco de Esquerda (BE) e do Partido Comunista Português (PCP). Segundo as mesmas fontes, Belandina Vaz, João Camargo e Marco Neves Marques são militantes do BE, enquanto Tiago Mota Saraiva pertence ao PCP. Já Magda Alves e Nuno Ramos de Almeida não estão actualmente filiados em nenhum partido, mas Alves tem um percurso ligado ao Bloco de Esquerda, enquanto Ramos de Almeida, actualmente editor-executivo do jornal i, foi durante 23 anos militante do Partido Comunista, passando mais tarde para o BE, onde foi eleito em 2005 para a mesa nacional (órgão máximo daquele partido entre congressos). É este grupo de seis que define as linhas orientadoras do movimento, estando a maioria na génese da sua criação. Olhando para o total dos 120 subscritores, são mais de 20 os que militam activamente – alguns são dirigentes – no BE, no PCP e no PS. Cerca de 15 elementos são bloquistas, cinco são comunistas e dois pertencem ao PS. Há também outros exemplos de ex-militantes que desempenharam funções nestes partidos da oposição parlamentar.
De deputados em assembleias municipais eleitos pelo BE a membros da mesa nacional do mesmo partido, passando por dirigentes comunistas e membros da Juventude Socialista, o Que Se Lixe a Troika conta também com a presença de figuras públicas, sobretudo músicos e actores, como é o caso de Álvaro Faria, Joana Manuel, Luísa Ortigoso e São José Lapa. Dos mais de 20 elementos que militam activamente naqueles três partidos parlamentares, Adriano Campos, Belandina Vaz, João Camargo, João Mineiro, Miguel Cardina e Sara Goulart foram eleitos o ano passado para a mesa nacional do Bloco de Esquerda. Do mesmo partido, o Que Se Lixe a Troika conta ainda com Ada Pereira da Silva, Bruno Gonçalves, Fabíola Cardoso, Isabel Louçã, Marco Marques, Mariana Avelãs, Paula Gil, Pedro Feijó e Tatiana Moutinho. E esse activismo não é só próximo do BE. Os militantes comunistas Bruno Carvalho, Lúcia Gomes, Sandra Monteiro, Tiago Mota Saraiva e José Neves são os cinco elementos que subscreveram o manifesto, uns a 15 de Setembro, enquanto outros entraram depois.
Diversas fontes do movimento contactadas pelo i explicam que internamente existem três blocos informais: um afecto ao Bloco, outro formado pelos militantes do PCP e um terceiro que reúne os activistas que não estão filiados em nenhum destes partidos. A configuração actual do grupo de subscritores, que poderá em breve ser alargado, não foi sempre igual. O BE teve desde o início diversos militantes a integrar o movimento Que Se Lixe a Troika, depois de na experiência com a Plataforma 15 de Outubro a posição de elementos ligados ao partido não ter conseguido um grande destaque. Por outro lado, até 15 de Setembro, o único militante comunista a integrar o grupo era Sandra Monteiro, mas o número cresceu depois dessa primeira grande manifestação do grupo, em Lisboa. Também a partir desse momento de apresentação, o QSLT afirmou-se como o principal movimento social na contestação ao governo e à troika. Ao mesmo tempo, os seus elementos procuraram demarcar-se do protesto quando a tensão escalava. O primeiro e mais concreto exemplo aconteceu na greve geral de 14 de Novembro, em que houve uma demarcação relativamente aos confrontos entre alguns manifestantes e a polícia, em frente à escadaria da Assembleia da República. Serão esses os dois objectivos comuns a unir as várias sensibilidades no seio do grupo: evitar a radicalização dos protestos de rua e secar o protagonismo de outros movimentos nessa contestação.
O i tentou contactar a semana passada todos os membros que são militantes activos em partidos políticos, enviando questões escritas para o email geral do movimento, mas apenas Nuno Ramos Almeida se disponibilizou para responder, salvaguardando tratar-se de uma posição pessoal. O activista, referido na imprensa como porta-voz e organizador, negou porém que exista um núcleo forte dentro do grupo e criticou quem se refere ao Que Se Lixe a Troika como um movimento: “O QSLT é um conjunto de subscritores e todos os subscritores são iguais. O que significa que não há organizadores, dinamizadores ou subscritores de um ideário. Não existem dirigidos nem dirigentes, não existem representantes. O_QSLT não tem estrutura normal de movimento social.” Para António Costa Pinto, politólogo, este “movimento, muito embora tendo activismo político e social próximo de alguns partidos, goza evidentemente de um grande beneficio de dúvida por parte da sociedade portuguesa por ser formalmente apartidário”.
Manifestações
O QSLT organizou manifestações nacionais a 15 de Setembro do ano passado – considerada a maior manifestação em Portugal desde 1974 – e a 2 de Março. Portugueses descontentes com o clima de austeridade e com o cumprimento rigoroso de um Memorando de entendimento com a troika – Banco Central Europeu, Comissão Europeia e Fundo Monetário Internacional – saíram às ruas nas principais cidades do país, juntando-se ao grupo dos subscritores do manifesto. Em declarações ao i, António Costa Pinto considera que existe um desfasamento entre as expectativas políticas dos activistas e as dos cidadãos que decidiram juntar-se a estes para protestos. “Politicamente, em movimentos como o QSLT, o activismo está bastante mais radicalizado que aqueles que participam efectivamente.” A posição é desvalorizada por Ramos de Almeida. “Alguns sim e outros não. No 15 de Setembro vi skinheads e eu não gostava de ter ali skinheads… Não se controla as pessoas que estão na manifestação, nem quem está na manifestação controla o que vai na cabeça dos elementos do QSLT – e é assim que se vive em democracia. O que há é um propósito comum que baliza o facto de estarmos juntos”, disse o também porta-voz".