quarta-feira, fevereiro 06, 2013

Opinião: Os “mistérios” da RTP e da UTAO…

"I.O que se passou com o processo de privatização da RTP, com contradições, "casos", acusações de ingerências políticas, tentativa de destruição da empresa no âmbito de uma alegada desvalorização da sua imagem pública, etc., continua a ser um mistério. De um lado o ministro Relvas apostado em "despachar" a RTP alegado que a empresa custa muito ao coitado do Estado que não se importa de pagar milhares de milhões com as PPP, de ter queimado mais de 6 mil milhões de euros com o BPN (e aqui vamos ainda…), dos milhões que todos pagamos com a recapitalização da banca - farta de encher a pança graças a milionários lucros à custa até das negociatas com a dívida pública portuguesa - e com outros negócios, como é o caso das rendas da energia. Quanto custa ao Estado e aos contribuintes todas essas PPPs bem como a enigmática recapitalização dos bancos, neste caso pago com o dinheiro emprestado pela troika e que será pago por todos os contribuintes (capital e juros)? O que é que os contribuintes beneficiaram com essa recapitalização? O que é que os contribuintes têm a ver com as PPPs que custam mais de 40 mil milhões aos cofres do Estado?
O mistério deste processo de pretensa privatização da RTP tem a ver com a descoberta tardia do ministro Relvas – estranhamente feita apenas quando a suposta privatização da RTP falhou – de um enigmático plano de reestruturação que mais não é que um exemplo mais pequeno do pretendido corte das despesas do Estado. Ou seja, aqui não se trata de cortar 4 mil milhões de euros. O que está em causa na RTP, segundo o próprio ministro Relvas, é a redução do seu quadro de funcionários para que a empresa seja capaz de passar a viver, a partir de 2014, apenas com as receitas que seja capaz de gerar.
Ou seja, no atual contexto de crise económica, quando as receitas publicitárias estão em queda livre na comunicação social e com esta cada vez mais preocupada em lutar pela sobrevivência e pela preservação dos postos de trabalho, há outros iluminados de pacotilha que brincam com coisas demasiado sérias, até numa perspetiva humana, propagandeando a ideia de que a partir do próximo ano o OE deixa de transferir qualquer verba para a RTP, como se isso resolvesse os problemas do estado e dos portugueses. Ou seja, segundo eles os males do país residem no financiamento da RTP, em grande medida como pretensamente, para uma certa oposição regional vazia de conteúdo, os problemas da Madeira limitam-se ao financiamento do Jornal da Madeira – empresa pública como a RTP – ou aos dinheiros do futebol profissional.
Segundo a propaganda, sem a RTP resolvem-se os problemas do Estado! O que se passa é que, falhada a privatização (se é que foi essa a opção que realmente esteve em cima da mesa…), assistimos agora a uma espécie de "vingança servida a frio", aliás bem ao estilo deste governo de coligação. Em vez da paulada que todos viam e geraria repulsa e revolta, usa outros procedimentos mais "discretos".
E nem falo no estado de espírito, na ansiedade que toda esta trapalhada gera junto dos trabalhadores da empresa que ficam obviamente desmotivados quando não sabem qual será o seu futuro daqui a dois ou três meses. Falar em despedimento com a leviandade como tem sido feito é asqueroso. Brincar com a vida das pessoas é criminoso e bandalho
Estranho é o fato do ministro Relvas ter descoberto que a empresa (RTP) está sobredimensionada e precisa de despedir funcionários e reduzir custos, depois de ter falhado a privatização. Afinal, por que razão quando foi lançada a privatização e consultado o mercado esses problemas não se colocaram? Porque é que só agora o ministro Relvas se preocupa com isso? Para justificar um fracasso de um processo de ele próprio liderou?
Mais, porque falhou afinal a privatização da RTP? Quem eram os interessados que, segundo o consultor Borges, tinham "categoria" e "prestígio"? Porque não dizem aos portugueses quem estava interessado na RTP, se é que alguma vez houve alguém realmente interessado? Terão sido estabelecidos pelo governo de coligação compromissos com potenciais investidores futuros? Estará a RTP a servir de moeda de troca com alguma coisa ou instrumento de chantagem e pressão contra as televisões privadas?
E que dizer da absurda recomendação da maioria PSD/CDS na Assembleia da República, no quadro da sua desorientação e falta de categoria, para que a RTP reponha um programa sobre agricultura e pescas?! Mas isso não é competência das estruturas da RTP responsáveis pela área de informação? Ou será que a maioria deseja que a Direção de Informação da RTP se transfira para o parlamento? E porquê um programa sobre a agricultura e as pescas e não sobre a saúde, a segurança social, a pobreza, o trabalho, a falta de emprego, a educação, etc?
Tenham juízo, deixem a RTP da mão, respeitem os seus trabalhadores e resolvam os problemas, esses sim, reais e sérios que afetam os portugueses.
II. Outra notícia que temos que reter - pelo menos até Março, quando o Eurostat confirmar, ou não, o défice orçamental de 2012 anunciado pelo governo de coligação - foi divulgada esta semana e comporta outro potencial mistério quanto ao que ainda nos poderá acontecer este ano, caso venha a ser necessária uma "arrumação" forçada das contas públicas de 2012. Falo da anunciada (e esperada) quebra da receita fiscal em 2012 e que ficou "muito acima do esperado pelo Governo", situação que "pode criar efeito de arrastamento em 2013". Ou seja, segundo a UTAO, "as receitas fiscais em 2012 ficaram muito abaixo do que aquilo que o Governo estimava na sua proposta de Orçamento do Estado para este ano, algo que poderá afetar as projeções realizadas para 2013, tornando ainda mais difícil a concretização do objetivo do défice”. Os técnicos da UTAO dizem que, “face à estimativa realizada em Outubro pelo Governo, a receita fiscal obtida em 2012 ficou 670 milhões de euros abaixo, um valor equivalente a 0,4%", desvio que foi compensado por receitas extraordinárias e cortes nas despesas com juros e investimento, para além de resultados mais positivos nos outros subsectores para além do Estado (especialmente administração local e regional e serviços e fundos autónomos).
Segundo a notícia que venho citando, o problema, confirme alerta a UTAO, "é que a projeção feita pelo Governo para a receita fiscal de 2013 tem como ponto de partida a cobrança estimada no passado mês de Outubro para a totalidade de 2012, que acabou por não se concretizar. Como diz o relatório da unidade técnica, este desvio de 670 milhões de euros face à estimativa de receita fiscal efetuada em Outubro passado poderá, por efeito de arrastamento, implicar uma dificuldade acrescida na obtenção de receita no corrente ano, uma vez que aquela estimativa terá servido de base à projeção da receita fiscal de 2013". Será que o Eurostat nos vai reservar alguma surpresa? Será que estes truques de utilização de receitas extraordinárias (caso da privatização da ANA) serão aceites pelo organismo comunitário de estatística? Ou será que nos espera uma desgraça adicional, leia-se mais austeridade, em 2013 para resolver o problema de 2012, caso ele venha a surgir por decisão do Eurostat, e que nada tem a ver com a austeridade que, reportada a este ano, todos dizem ser inevitável? Estou desejando de perceber a resposta que o país e os cidadãos darão a tudo isto" (JM)