Qual a explicação, então?
A quebra no poder de compra dos salários médios per capita acontece, essencialmente, porque a subida da compensação média por trabalhador (por conta de outrem) é de apenas 2,9%, o sexto registo mais fraco do grupo das três dezenas de economias da OCDE. Na Europa, pior só na Dinamarca (2,6%) e na Suíça (1,2%). Fora da Europa, destaca-se o México onde as remunerações médias individuais quase estagnam (0,7%). Tudo considerado, o trabalhador médio português enfrenta um ano mais apertado do ponto de vista do poder de compra e porque, sendo um país endividado, a fatura dos juros também vai pesar nos orçamentos familiares. Segundo as contas com base nas novas previsões da OCDE, a erosão salarial portuguesa prevista para este ano na ordem dos referidos 3,5%, provocada pela inflação, é claramente superior à média da zona euro e do grupo da OCDE (ambos com uma queda esperada que ronda os 2,8%).
Economia esvai-se, défice cai
Ontem, a OCDE também revelou que, pelas suas contas, o défice público português deste ano deverá ser ainda mais baixo do que a meta de 1,9% do produto interno bruto (PIB) prevista pelo ministro das Finanças, Fernando Medina, no Orçamento do Estado de 2022 (OE2022).
Mas a retoma da economia este ano será inferior ao esperado há seis meses (5,4% em vez de 5,8%) e o ritmo da expansão portuguesa deve colapsar para menos de metade no ano que vem (1,7%, três vezes menos), num ambiente em que a inflação mais do que triplica (6,3% agora em vez dos 1,7% previstos em dezembro). Diz a entidade baseada em Paris que o turismo parece estar a reanimar, mas o resto, como o consumo interno, o investimento e a aderência dos fundos europeus estão mais lentos face à urgência do momento. Juros e energia começam a pesar. Mesmo com a economia a crescer mais de 5% este ano, o consumo das famílias é revisto em baixa, o investimento também. As exportações contrariam a tendência e avançam mais do que o previsto em dezembro pela OCDE.
Problema: a inflação muito alta veio baralhar as contas e o poder de compra interno e a capacidade das empresas; e começa a causar estragos num país ainda muito endividado e dependente do petróleo e energia importados. Recorde-se que o governo de António Costa concedeu aumentos à função pública de 0,9% este ano (inflação prevista para 2022 em outubro de 2021). Em abril passado, na segunda proposta de OE2022 (entretanto aprovado), a previsão de subida dos preços este ano engordou para 3,7%.
Como referido, face ao Outlook de dezembro, a OCDE prevê agora que o produto interno bruto (PIB) de Portugal cresça 5,4% em termos reais, um pouco menos do que os 5,8% de há seis meses. Em comparação, a zona euro avança muito menos (2,6%). A guerra na Ucrânia está a complicar o crescimento em muitos países (Portugal é referido como relativamente menos dependente da energia do Leste), os mais expostos à energia da Rússia.
Daí, a Alemanha, a maior economia do euro, só avançar 1,9% pelas contas da OCDE. É um problema para a Europa e para Portugal em particular porque os alemães são dos maiores parceiros económicos do país como investidores e clientes. Mas em 2023, mesmo com fundos europeus, área onde a OCDE também nota problemas e atritos no arranque, a vaga da retoma portuguesa perde muita força: a organização estima um avanço de apenas 1,7%, uma décima mais do que a média da zona euro (1,6%). Ainda converge, mas num quadro de declínio rápido e acentuado (Dinheiro Vivo, texto do jornalista Luís Reis Ribeiro)
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