domingo, agosto 09, 2020

Cofinanciamento chega a 100% no instrumento de recuperação

Primeiro esboço do Plano de Recuperação e Resiliência, coordenado por Nelson de Souza, será apresentado numa das próximas reuniões do Conselho de Ministros. O ministro do Planeamento, Nelson de Souza, já está a trabalhar com os outros membros do Governo para abrir, o mais depressa possível, o cofre dos €13 mil milhões de subsídios europeus do novo instrumento de recuperação e resiliência. A chave para abrir o cofre chama-se Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), um documento a submeter à Comissão Europeia com as medidas e projetos de investimento em que o Governo pretende aplicar as verbas entre 2021 e 2026. Nelson de Souza é quem vai coordenar a elaboração do PRR. O Expresso sabe que ao longo dos últimos dias têm decorrido reuniões com os diversos ministérios. O objetivo é recolher propostas setoriais que irão integrar um primeiro esboço do PRR a apresentar numa das próximas reuniões do Conselho de Ministros. A este primeiro esboço o ministro deverá juntar os contributos do plano do consultor António Costa Silva, após a conclusão do processo de consulta pública, que decorre até final do mês de agosto. O objetivo é iniciar já em setembro o processo de auscultação dos diversos parceiros e apresentar a base do PRR em meados de outubro.

ENVELOPES DIFERENTES
Este novo envelope de €13 mil milhões acresce ao envelope de €21 mil milhões de fundos da coesão a aplicar no próximo quadro comunitário Portugal 2030, mas há regras diferentes para cada um dos envelopes. Os fundos tradicionais financiam até 85% os investimentos nas regiões menos desenvolvidas do país. Já o novo instrumento de recuperação pode financiar investimentos até 100% em qualquer região.
Trata-se de um instrumento bastante apetecível para ministros, autarcas e demais promotores públicos ou privados. O Governo pode decidir aplicar taxas de cofinanciamento até 100% e assim libertar o promotor de ter de entrar com as verbas da chamada contrapartida nacional.
Uma intenção do Governo, já noticiada na última edição do Expresso, é a de aproveitar a flexibilidade dos novos subsídios europeus para investir na região que menos acesso tem aos tradicionais fundos comunitários: a Área Metropolitana de Lisboa.
Em causa estará uma iniciativa para enfrentar “as maiores bolsas de pobreza do país”, que se escondem nas grandes áreas metropolitanas. O Ministério do Planea­mento já está a trabalhar nesse sentido, não só para financiar a Área Metropolitana de Lisboa, como também a do Porto e eventualmente outras cidades grandes do país. Mas o Ministério do Planea­mento escusa-se a comentar quaisquer medidas ou investimentos concretos a incluir no documento a submeter a Bruxelas até que o primeiro esboço do PRR passe pelo Conselho de Ministros.
PRIORIDADE É VERDE E DIGITAL
O desafio do PRR é conci­liar diversas “peças do puzzle”, desde as estratégias do Governo às propostas de Costa Silva e aos contributos que venham a ser recolhidos junto dos parceiros sociais. Para ver desbloqueadas as verbas, o PRR deve ainda responder ao duplo caderno de encargos imposto por Bruxelas.
Por um lado, a proposta nacional deve estar alinhada com a nova estratégia de recuperação europeia, designadamente enfrentar os desafios da transição ecológica e digital. Por outro lado, deve responder às recomendações especificamente feitas a Portugal pela Comissão Europeia no âmbito do semestre europeu, designadamente enfrentar o problema das baixas qualificações dos trabalhadores portugueses e demais bloqueios estruturais que têm impedido o país de crescer de forma mais sustentada ao longo das últimas décadas.
TEMPO É DINHEIRO
Na decisão das medidas e projetos de investimento a incluir no PRR pesará ainda o tempo necessário para as concretizar no terreno. É que os novos subsídios europeus também diferem dos tradicionais fundos comunitários pelo menor prazo dado ao país para os executar. Se o Portugal 2020 dispõe de 10 anos para aplicar todas as verbas, entre 2014 e 2023, o novo instrumento de recuperação promete fechar a torneira após 2026.
Mas o horizonte de Nelson de Souza vai até ao fim da década. O ministro do Planea­mento está também a trabalhar no acordo de parceria com a Comissão Europeia para estruturar a aplicação dos quase €30 mil milhões dos fundos comunitários do Portugal 2030 e demais ­apoios do próximo quadro financeiro plurianual para aplicar entre 2021 e 2029.
Outra prioridade é garantir a execução de 100% das verbas do atual quadro Portugal 2020 até 2023. Em causa estão perto de €15 mil milhões, incluindo o reforço de €2 mil milhões que virá do REACT-EU, o novo instrumento europeu para antecipar a resposta à crise pandémica. Tudo somado, Portugal disporá de quase €58 mil milhões até ao fim da próxima década entre os tradicionais fundos comunitários e os novos apoios do plano de recuperação europeu.
BAZUCA, ORGIA OU PATACAS
O dinheiro é tanto que as metáforas não param. Durão Barroso, o antigo presidente da Comissão Europeia que apelidara o Portugal 2020 de “pipa de massa”, refere-se agora ao fundo de recuperação europeu como “orgia financeira” em entrevista ao “Observador”. Uma semana antes, em entrevista à “Visão”, o primeiro-ministro, António Costa, resumia assim o momento atual: “Temos a bazuca. É preciso aproveitá-la e não falhar o tiro.”
O ministro do Planeamento já alertara o Expresso, em julho, para que “não se crie um clima de que será a árvore das patacas ou um novo Brasil… Esta é, de facto, a última oportunidade de dispormos de recursos financeiros para resolvemos, de vez, os nossos problemas”. Nelson de Souza disse então que importa “estabelecer uma visão estratégica, com prioridades precisas, selecio­nando aquilo que se deve fazer”. Em causa está a capacidade de transformar “os nossos sonhos de sempre em percursos realizáveis”, isto é, de transformar a estratégia em programas, projetos e investimentos concretizáveis num curto espaço de tempo.
FUNDOS
13, são os milhares de milhões de euros de subsídios europeus que Portugal pode receber do novo instrumento de recuperação e resiliência
30, são os milhares de milhões de euros que Portugal também vai receber do próximo quadro financeiro plurianual da União Europeia, incluindo os tradicionais fundos comunitários do Portugal 2030
100%, é quanto pode atingir a taxa de cofinanciamento do novo instrumento de recuperação e resiliência. Os tradicionais fundos comunitários só costumam pagar até 85% dos investimentos (Expresso, texto da jornalista JOANA NUNES MATEUS)

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