Segundo a jornalista do Jornal I, Marta F. Reis, "Paulo Macedo
anunciou ontem que está a negociar terceiro acordo com os laboratórios para
controlar despesa e garantir acesso a inovação. O que mudou desde 2011? O
ministro da Saúde anunciou ontem que o governo está a negociar com a indústria
farmacêutica um novo acordo com vista a controlar a despesa com medicamentos
durante este ano e garantir acesso à inovação. Dados publicados esta semana
pela Apifarma revelam que o cenário de partida reflecte a ginástica de ambas as
partes, mas a relação entre o SNS e estes fornecedores não parece estar muito
mais saudável do que quando a troika aterrou em Portugal em Abril de 2011.
Apesar de o SNS ter liquidado entretanto quase dois mil milhões de euros em
dívidas contraídas até Dezembro de 2011 junto de diferentes fornecedores e de a
despesa pública com remédios ter reduzido 31% face a 2010, segundo dados da
Apifarma, os hospitais deviam em Dezembro 989 milhões aos laboratórios, menos
68 milhões do que em Abril de 2011 (1058 milhões). Já o prazo médio de
pagamento das unidades aumentou em três meses em relação ao que se verificava
nessa altura, de 394 dias para 489. Garantir que o SNS não continuaria
capturado pelos credores e sujeito a ameaças de cortes no fornecimento sempre
foi uma prioridade assumida pelo ministro, que no final de 2013 disse que o sistema
estava "menos refém", anunciando o nível "historicamente
baixo" de dívida vencida com que se chegaria ao fim do ano. A última
publicação da Direcção-Geral do Orçamento, na semana passada, corroborou isso
mesmo, com os hospitais a terem 656 milhões em facturas vencidas há mais de 90
dias face ao prazo acordado com os fornecedores (o limite que viola a lei dos
compromissos) contra 2 055 milhões em 2011. Para este ano, contudo, a incógnita
é qual vai ser o ritmo da entrada da dívida em incumprimento (no ano passado,
avisou a troika, rondou os 30 milhões/mês) e se haverá novas dotações
extraordinárias para saldar dívidas antigas, já que foi com essa batalha ganha
no orçamento do Estado que a tutela resolveu o problema dos dois mil milhões em
atraso. Pelo lado dos hospitais, o cenário não augura melhor desempenho: o
orçamento encolheu este ano 146 milhões, sendo que em Novembro, com mais
dinheiro, havia 12 unidades a violar a lei dos compromissos de acordo com a
DGO. Se o compromisso de regularização de dívidas, que tem sido a moeda de
troca da tutela nos últimos acordos com os laboratórios, estará em cima da mesa
na negociação, é pergunta que ontem ficou sem resposta. O ministro não prestou
declarações à saída da conferência sobre o sector onde também estava o
presidente da Apifarma, que confirmou estarem em curso negociações. João
Almeida Lopes disse só poder dizer o que estará no acordo quando ele
"existir". Questionado sobre o valor da dívida e prazo de pagamento
atingido no final de 2013, publicitado esta semana no site da Apifarma, o
dirigente considerou que a situação de captura do SNS se mantém, mas por causa
do "subfinanciamento crónico do SNS". Questionada pelo i, a Apifarma
não esclareceu, dos 989 milhões em dívida, qual o montante em atraso. A soma global,
sem discriminar o que está dentro do prazo e o que poderá estar a violar a lei
dos compromissos, equivale a um ano de despesa de remédios nos hospitais.
Embora Almeida Lopes tenha confirmado disponibilidade da indústria para
garantir um patamar de despesa pública em linha com o dos últimos anos, houve
troca de recados. Na conferência promovida pelo "Diário Económico" e
a farmacêutica MSD, Macedo sublinhou o esforço de alguma indústria em chegar a
acordos adaptados aos "anos de crise". Mas considerou uma
"afronta" um extremo em que ainda são propostos ao SNS preços
superiores aos da entrada das mesmas moléculas inovadoras em países como o
Reino Unido e reiterou ser necessário separar inovação de novidade. Almeida
Lopes disse na sua intervenção que por vezes a avaliação é usada como
"desculpa" para as dificuldades financeiras de curto prazo. Aos
jornalistas, disse não conhecer o caso concreto de que falou Macedo mas
rejeitou margens indevidas e que seja possível reduzir mais. "As afirmações
ficam com quem as faz", rematou".