
"O estranho ao caso português.
O constitucionalista Costa Andrade apresenta-o como uma das dificuldades do sistema: “Os programas do Governo não valem nada, ninguém é julgado pelo cumprimento ou não das promessas. A maioria dos portugueses não vota nos partidos por causa dos programas de Governo, porque simplesmente os desconhece”. Por isso, uma das soluções para o futuro da política pode passar por contornar o obstáculo dos partidos. “A única coisa boa desta crise dos partidos é a forte mobilização que vemos na sociedade”, explica o politólogo Manuel Villaverde Cabral, acrescentando que esta mobilização é um sinal de que as pessoas não desistiram da política, mas apenas dos partidos. Assim, a emergência de movimentos cívicos ou de candidaturas independentes ver texto da página 22) parece ser uma tendência inevitável. O presidente da Câmara do Porto, Rui Rio, não tem dúvidas de que “as duas maiores tarefas de que a nossa democracia necessita são precisamente as reformas ao nível da vida interna dos partidos e ao nível do seu financiamento”. Mas são muitos os que não acreditam nesta capacidade de revitalização do sistema. O cientista político Adelino Maltez diz que os partidos são o espelho da nação: “Não são causa dos problemas, são sintoma e consequência e já demonstraram que não conseguem auto-regenerar-se, nomeadamente pela institucionalização do conflito interno, como se demonstra pelos recentes saneamentos de Manuel Alegre e de Passos Coelho, no PS e no PSD”. Os futuros políticos desta aldeia global em que vivemos terão de ser capazes de mobilizar os cidadãos envolvendo-os nas decisões. Os exemplos de países como a Suíça, onde há vários referendos anuais, começam a proliferar e surgem sucessivas experiências de democracia deliberativa, muito mais agregadoras de iniciativas individuais. Barack Obama usou as redes sociais da Internet para recolher milhões de dólares para a sua campanha presidencial, mas para isso teve de ceder competências de organização a grupos de cidadãos que o ajudaram na sua eleição. Para combater a abstenção e o divórcio dos eleitores com a política, 25 países estão a ensaiar métodos de votação electrónica (em Portugal têm-se feito algumas experiências desde as eleições autárquicas de 1997). Mas apenas quatro — Brasil, Índia, Estónia e Venezuela — usam este método em todos os locais. E só na Estónia é possível votar através da Internet. Os especialistas estão certos de que o aumento na mobilidade do voto será uma solução eficaz para diminuir alguma abstenção. Mas as questões de segurança e privacidade são ainda muitas. O historiador Michael Schudson diz que “se os novos media digitais vão ser integrados numa nova democracia política, eles devem ser ligados a uma séria compreensão da cidadania, e isso não acontecerá se simplesmente reciclarmos a velha noção de cidadãos informados”. Isto é, as mudanças previsíveis vão implicar rupturas profundas, no perfil do político mas também do eleitor, por via das ferramentas com que ambos se vão relacionar. Em Portugal, a transformação poderá ser particularmente difícil. “O regime envelheceu, aproximando-se, em quantidade de tempo, do período de vigência do Governo de Salazar. Inevitavelmente, começam a notar-se infuncionalidades no sistema representativo, marcado por uma partidocracia que não tem sabido olear as relações daquilo a que se dá o nome de sociedade civil com o aparelho de Estado”, diz Adelino Maltez.
O constitucionalista Costa Andrade apresenta-o como uma das dificuldades do sistema: “Os programas do Governo não valem nada, ninguém é julgado pelo cumprimento ou não das promessas. A maioria dos portugueses não vota nos partidos por causa dos programas de Governo, porque simplesmente os desconhece”. Por isso, uma das soluções para o futuro da política pode passar por contornar o obstáculo dos partidos. “A única coisa boa desta crise dos partidos é a forte mobilização que vemos na sociedade”, explica o politólogo Manuel Villaverde Cabral, acrescentando que esta mobilização é um sinal de que as pessoas não desistiram da política, mas apenas dos partidos. Assim, a emergência de movimentos cívicos ou de candidaturas independentes ver texto da página 22) parece ser uma tendência inevitável. O presidente da Câmara do Porto, Rui Rio, não tem dúvidas de que “as duas maiores tarefas de que a nossa democracia necessita são precisamente as reformas ao nível da vida interna dos partidos e ao nível do seu financiamento”. Mas são muitos os que não acreditam nesta capacidade de revitalização do sistema. O cientista político Adelino Maltez diz que os partidos são o espelho da nação: “Não são causa dos problemas, são sintoma e consequência e já demonstraram que não conseguem auto-regenerar-se, nomeadamente pela institucionalização do conflito interno, como se demonstra pelos recentes saneamentos de Manuel Alegre e de Passos Coelho, no PS e no PSD”. Os futuros políticos desta aldeia global em que vivemos terão de ser capazes de mobilizar os cidadãos envolvendo-os nas decisões. Os exemplos de países como a Suíça, onde há vários referendos anuais, começam a proliferar e surgem sucessivas experiências de democracia deliberativa, muito mais agregadoras de iniciativas individuais. Barack Obama usou as redes sociais da Internet para recolher milhões de dólares para a sua campanha presidencial, mas para isso teve de ceder competências de organização a grupos de cidadãos que o ajudaram na sua eleição. Para combater a abstenção e o divórcio dos eleitores com a política, 25 países estão a ensaiar métodos de votação electrónica (em Portugal têm-se feito algumas experiências desde as eleições autárquicas de 1997). Mas apenas quatro — Brasil, Índia, Estónia e Venezuela — usam este método em todos os locais. E só na Estónia é possível votar através da Internet. Os especialistas estão certos de que o aumento na mobilidade do voto será uma solução eficaz para diminuir alguma abstenção. Mas as questões de segurança e privacidade são ainda muitas. O historiador Michael Schudson diz que “se os novos media digitais vão ser integrados numa nova democracia política, eles devem ser ligados a uma séria compreensão da cidadania, e isso não acontecerá se simplesmente reciclarmos a velha noção de cidadãos informados”. Isto é, as mudanças previsíveis vão implicar rupturas profundas, no perfil do político mas também do eleitor, por via das ferramentas com que ambos se vão relacionar. Em Portugal, a transformação poderá ser particularmente difícil. “O regime envelheceu, aproximando-se, em quantidade de tempo, do período de vigência do Governo de Salazar. Inevitavelmente, começam a notar-se infuncionalidades no sistema representativo, marcado por uma partidocracia que não tem sabido olear as relações daquilo a que se dá o nome de sociedade civil com o aparelho de Estado”, diz Adelino Maltez.
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O governador Arnold Schwarzenegger deslocou-se à sede do Twitter para lançar www.myidea4ca.com. Vai usar o Twitter para recolher ideias sobre o futuro da Califórnia. O funcionamento não podia ser mais simples: as ideias são submetidas através das contas de cada um no Twitter usando o ‘hashtag’ #myidea4ca. O site MyIdea4CA faz a indexação de todos os contributos para que possam ser pesquisados, discutidos, comentados e votados. O site foi inundado com milhares de propostas — ou não estivéssemos nós a falar da América, onde nada é impossível. A web permite a emergência de líderes novos, que por sua vez aproveitam a força da rede para reunir apoios, financiar campanhas, mobilizar a sociedade. No mundo pré-YouTube, Obama teria sido eleito? Claramente não. Nem Ségolène Royal teria vencido as primárias do seu partido sem o seu blogue “Désir d’Avenir”, onde criou uma rede descentralizada de apoio. Na próximo Verão, o britânico David Cameron levará o Partido Conservador a uma vitória histórica. Além do cansaço de 12 anos de Labour, o mérito é seu: renovou o partido, usou a web como ninguém e promete um estado pós-burocrático, uma espécie de open source aplicado à política. E está a passar da palavra aos actos, abrindo o velho aparelho local a caras novas. E por isso no dia 3 de Agosto decorreram as primeiras primárias abertas na história do Reino Unido. Uma médica de família, Sarah Wollaston, foi eleita pela população de Totnes in Devon como o candidato do Partido Conservador às próximas eleições gerais. Em vez de dar o monopólio da escolha aos seus 700 filiados locais, o partido enviou cartas com boletim de voto para todos os 69 mil habitantes da cidade. Votaram 16.497 habitantes, ou seja 24,6%, muito além das expectativas do Partido. A campanha de Sarah, online e offline, foi focada em temas como a saúde, os hospitais locais e soluções para o crime e a violência. Derrotou dois veteranos conservadores, um presidente de câmara e uma presidente de junta. No dia seguinte, David Miliband faz um apelo público para que o seu Partido Trabalhista fizesse mudanças. Na Grécia, o velho Pasok tenta ir mais longe: numa população de 11 milhões, usou a web para abrir o partido a mais de 900 mil gregos, que passaram a ter direitos iguais como ‘amigos’ do partido. A web não é a democracia directa, mas sim uma melhor democracia representativa; com mais responsabilidade e exposição em tempo real. Cria novos mediadores e reforça o papel dos agentes políticos que forem capazes de orquestrar a inteligência colectiva — o futuro pertence-lhes. Põe enorme pressão sobre estruturas ‘comando e controlo’, típicas do mundo pré-web. O seu cariz distribuído faz da web a mais poderosa força de mudança — por mais que o poder tradicional a tente controlar. Cria uma nova legitimidade, baseada na transparência, na colaboração e na participação".
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