Participando há dias num programa de opinião
política na Antena-1 da Madeira, afirmei - e mantenho - que uma das principais
carências que se têm notado nos últimos anos tem a ver com a falta de
"pontes" entre a RAM e a República, "pontes" passíveis de
se antecipar às decisões, evitando que a Madeira vá a reboque do que já está
decidido, em princípio.
Continuo a pensar que apesar dos avanços
autonómicos, continuam a ser muitas as matérias que directa ou indirectamente,
passam pela República, dependendo sempre dos bons ou maus bofes dos ministros
das finanças e da capacidade de solidariedade dos primeiros-ministros,
incapazes, regra geral, de se colocarem acima de questiúnculas partidárias e
de decidirem em conformidade com as suas responsabilidades institucionais.
A ausência dessas pontes e de diálogo, sempre
úteis, sobretudo nos bastidores da política e da governação, acaba por gerar
conflitualidades desnecessárias, choques institucionais, desavenças políticas,
etc
Durante anos, Guilherme Silva - que se
movimentou sempre muito bem nos corredores do poder em Lisboa - assumiu esse
papel em relação a João Jardim, tendo sido capaz de resolver,com maior ou menor
dificuldade e eficácia, muitos problemas que poderiam penalizar a Madeira e
antecipando-se se inclusivamente a muitas decisões que apontavam numa direcção
mas acabaram por divergir para outra. Um dia se Guilherme Silva escrever as suas
memórias de tudo o que se passou nos bastidores da política nacional
"versus" Madeira, acho que seriam extraordinariamente interessadas para
percebermos o outro lado da política regional, o outro lado dos calafrios da
autonomia madeirense, e muito do que se passou nas relações entre o Estado e a
Região, independentemente da natureza partidária dos governos.
Lembro-me dois momentos em que esse papel se
deparou com enormes dificuldades e muita hostilidade: o caso da imposição das
alterações à Lei de Finanças Regionais de 2007, que culminou com eleições
regionais antecipadas e ameaçou muito severamente o governo de Sócrates-Teixeira
dos Santos, com recurso ao Conselho de Estado e à intermediação de Cavaco Silva.
O segundo caso mais agoniante aconteceu com o célebre "buraco"
financeiro de 2011 e tudo o que aconteceu desde então, em pleno ano eleitoral
regional, culminando com a imposição à Madeira, pela dupla Passos-Gaspar do
PAEF. Aliás terá sido Passos o líder político nacional que mais deliberadamente
hostilizou a Madeira e manteve Guilherme Silva à margem, tudo por causa das
relações inexistentes entre Jardim e o ex-primeiro-ministro que acabou por ser
a desgraça do PSD e do país por causa do seu absurdo fundamentalismo ultra-liberal
e bandalho que esmagou as pessoas, culpabilizando-as, sem coragem nem dignidade
para dizer abertamente, pela falência do país e pelos falhanços e erros dos
políticos, deputados e governantes.
Para além do agora Presidente da Comissão dos
600 anos da descoberta da Madeira, também Pereira de Gouveia, antigo secretário
regional da economia e da cooperação, ficou conhecido - aliás mesmo antes das
suas funções governativas - por ser uma personalidade que entrava facilmente em
vários corredores do poder em Lisboa, nos seus diferentes patamares de decisão,
quer em termos empresariais, quer em termos políticos. Pereira de Gouveia foi
também um protagonista importante nessa lógica das "pontes" entre a
Região e o Estado, que eu considero serem cada vez mais recomendáveis, entre o
Funchal e Lisboa - e quem o desvalorizar
está a cometer um erro politico gravíssimo porque as perdas são
substancialmente superiores aos ganhos.
O segredo reside na antecipação dos factos,
impedindo que a Madeira vá a reboque de decisões anunciadas ou tomadas, o que
aumenta a dificuldade de reversão das mesmas ou de alteração para que fiquem
mais em conformidade com os desejos da Região. Ir atrás das decisões, a reboque
dos factos é sempre difícil e desaconselhável porque a mediatização de
processos de decisão - que devem pautar-se pela discrição e pela justiça -
impede muitas vezes cedências, quase sempre entendidas como uma espécie de “vitória”
de alguém a que corresponderá a “derrota” de outro alguém. Ninguém aceita passar
por isso. Por isso o sucesso quando vamos a reboque dos factos é sempre
diminuto.
Nesta perspectiva considero que a construção de pontes é essencial para o sucesso e consolidação da autonomia regional e para a defesa dos seus interesses num
diálogo nem sempre fácil e pragmático e sério, como todos desejamos, com o poder
central. Isso explica, por exemplo, e reconhecidamente, recuos nas autonomias regionais
espanholas e um certo marcar passo nas regiões italianas (LFM)
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