quarta-feira, outubro 01, 2014

Justiça social em Portugal tem vindo a descer desde 2011

Segundo a jornalista do Expresso, Raquel Albuquerque, "ocupamos uma das piores posições na União Europeia quando se fala em justiça social. E como é que isso se mede? Pela pobreza, acesso ao mercado de trabalho ou a cuidados de saúde, por exemplo. Portugal está entre os dez países da União Europeia (UE) com menos justiça social, ocupando a 20ª posição no ranking dos 28 Estados-membros, no qual a Suécia aparece em primeiro lugar e a Grécia em último. O ranking foi publicado num estudo da fundação alemã Bertelsmann, que comparou vários indicadores estatísticos de cada país da UE, concluindo que, nos últimos anos, a injustiça social tem vindo a aumentar em geral. O que os dados mostram em relação a Portugal é que a nossa posição no índice de justiça social subiu entre 2008 e 2011 (de 5,11 para 5,15). Só que desde 2011 o nível tem vindo a descer, registando em 2014 um valor mais baixo (5,03) do que em 2008 - ano em que a fundação alemã foi criada e calculou pela primeira vez este índice. Pior do que Portugal estão Roménia, Bulgária, Hungria, Letónia ou Itália, além da Grécia. No extremo oposto, o estudo coloca Suécia, Finlândia, Dinamarca e Holanda. "Esta deterioração foi certamente intensificada pelas políticas rígidas de austeridade implementadas no decurso da crise, assim como as reformas estruturais aplicadas no sentido da estabilização económica e orçamental", conclui o estudo em relação à perda de justiça social na UE. Apesar de ser sublinhada a existência de alguns sinais de recuperação económica, os autores lembram que a austeridade teve um impacto negativo nos sistemas de segurança social e em áreas como a educação ou a investigação, devido aos cortes. Mas como é que se mede a justiça social de um país? A análise feita neste estudo usou vários indicadores de cada país relativos a seis grandes áreas - prevenção da pobreza, educação equitativa, acesso ao mercado de trabalho, coesão social, saúde e justiça entre as gerações mais novas e mais velhas. É precisamente na justiça entre gerações que Portugal fica pior posicionado. O que está em causa é haver ou não uma distribuição justa de recursos entre as gerações atuais e futuras. Analisam-se os sistemas de pensões, as políticas ambientais e indicadores como a dívida pública ou o investimento em investigação. Portugal surge com a terceira maior dívida pública da UE e o 5º maior rácio de dependência em 2014 (ou seja, relação entre a população idosa e a população em idade ativa). O rácio é mais elevado do que era em 2008
Mais crianças em risco de pobreza
Uma das conclusões do estudo é que a injustiça social na UE tem tido efeitos mais graves sobre as crianças e jovens. Em Portugal, os números confirmam-no. A proporção de crianças e adolescentes (até aos 17 anos) em risco de pobreza aumentou de 26,9% em 2008 para 27,8% em 2014, ocupando agora o 15º pior lugar do ranking dos 28 países. O risco de pobreza em geral também aumentou, assim como a proporção de pessoas a viver em privação material severa (de 9,6% em 2008 para 10,9% em 2014). Quando se fala em mercado de trabalho, a seguir à Grécia foi em Portugal que a situação mais se agravou entre 2011 e 2014, embora haja seis países a ocuparem posições mais graves. Portugal é o quinto país com maior taxa de desemprego a longo prazo e sexto com mais desemprego jovem - indicadores onde a Espanha e a Grécia ocupam os dois piores lugares.
No que toca a educação, foi analisada a influência do contexto social de um estudante no seu desempenho educacional. Enquanto na Suécia e Dinamarca as origens sociais de um estudante têm menos peso nos seus resultados, Portugal é o quarto país onde esse contexto tem mais peso. Já quanto à coesão social, é hoje mais baixa do que era em 2008, mas foi aumentando nos últimos três anos. Foi na saúde que Portugal registou melhorias, ainda que ocupe o 20.º lugar do ranking. Suécia, Luxemburgo, Holanda e Bélgica ocupam as melhores posições, mas em indicadores como a mortalidade infantil ou a resposta dada pelos serviços de cuidados de saúde, Portugal subiu lugares entre 2008 e 2014. Em geral, o estudo conclui que "aumentou significativamente" a diferença entre os países mais ricos do norte da Europa e os países do sul que foram mais atingidos pela crise. "Se estas divisões sociais persistirem durante mais tempo, ou se se agravarem, poderão pôr em perigo a viabilidade futura de todo o projeto de integração europeia." É nesse sentido que o estudo defende que "a futura estratégia socioeconómica da União Europeia deve não só ter como preocupação a consolidação orçamental e a resolução da crise da dívida, mas também o combate à injustiça social dentro da União Europeia".