"As autárquicas de 1997
marcaram a entrada de Pedro Passos Coelho na idade adulta da política. Passou
de eterno líder da JSD, deputado em nome da juventude, a candidato do partido à
Câmara Municipal da Amadora. Perdeu. Mas o desafio estava longe de poder ser
considerado uma derrota. Tornou-se vereador sem pelouro e, dois anos depois,
deixou o Parlamento. Ainda disputou, com os grandes, a distrital de Lisboa, mas
também não ganhou. Nos anos que se seguiram,
Passos Coelho esteve discretamente na política. Manteve-se como vereador; pôs
fim ao primeiro casamento; acabou a licenciatura de Economia com média final de
15 valores, na Universidade Lusíada. E ganhou um prémio de mérito, por estar
entre os melhores alunos, patrocinado pelo Grupo Espírito Santo. A VISÃO questionou a
universidade sobre a natureza, as regras e o valor do prémio, mas a Lusíada
nada respondeu até à hora de fecho desta edição. Mas nesse mesmo ano de 2004, o
relatório e contas do GES relatava como o grupo empresarial continuava a privilegiar
a área do ensino, em especial o universitário. "Estabeleceu protocolos com
algumas das mais prestigiadas universidades portuguesas, traduzido, em 2004,
num INVESTIMENTO de 349 300 euros", lê-se no documento. Não há nada de ilegal ou
imoral neste episódio - nem sequer diz respeito a um rendimento tributável.
Serve para lhe abrir o apetite para os petiscos que se seguem.
AMADORA: A birra do derrotado
A Câmara da Amadora esteve 18
anos em mãos comunistas até que Joaquim Raposo, do PS, venceu as eleições
autárquicas de 1997. Pedro Passos Coelho foi um feroz adversário, impedindo a
maioria absoluta. Com 33,8% dos votos, Raposo foi obrigado a distribuir
pelouros pela oposição e fez a primeira oferta a Passos Coelho. "Ele
disse-me que queria o pelouro do planeamento estratégico, que incluía o
urbanismo e a captação de INVESTIMENTOS. Isso era igual a dizer que tudo, do
ponto de vista estratégico, passaria por ele", conta Raposo à VISÃO.
"Tive de lhe perguntar: Mas afinal, quem ganhou as eleições?". Passos
fez birra e não aceitou nenhum outro pelouro. Mas dois dos vereadores do PSD
aceitaram.
DEFESA: Subsídios ilegais
Uma das votações em que Passos
Coelho participou foi auditada pelo Tribunal de Contas e considerada ilegal: o
pagamento do subsídio de insalubridade a funcionários da limpeza urbana e dos
cemitérios, aprovada por sete vereadores, além do presidente, no ano 2000.
Passos também aprovou, mas defendeu-se à parte e sozinho, perante o tribunal,
enquanto os outros vereadores se defenderam em conjunto. Escreveu, como um
político, sobre a "dificuldade de angariação de profissionais para aquele
setor" e sobre o "quase estado de necessidade" de atribuir o
apoio, sob pena de os funcionários "se absterem de cumprir a sua
função", pondo em risco "a saúde pública".
CPPC: Pago em despesas ?de
representação
Uma denúncia anónima sobre
pagamentos que Passos Coelho teria recebido enquanto consultor do Centro
Português para a Cooperação, obrigaram-no a explicar-se no Parlamento, em
setembro de 2014. Não recordando pormenores, Passos disse que "durante
todo esse período [1997/99]" pode "ter apresentado despesas de
representação, de almoços, de deslocações", como os casos referentes a
viagens a Bruxelas, a Cabo Verde ou ao Porto, mas que isso não é, nem nunca
foi, incompatível com as funções de deputado em exclusividade. Acrescentou que
nunca declarou nada em sede de IRS porque não era suposto.
RIBTEJO: Depósitos impossíveis
Dois anos depois de acabar o
curso de Economia, Passos Coelho presidia à empresa RibTejo, do universo
Fomentinvest. Na prática, a RibTejo era gestora do aterro de resíduos não
perigosos da Chamusca, onde uma ação inspetiva detetou, em 2008, ilegalidades
ao nível das descargas de águas residuais - não cumpriam as normas de qualidade
impostas pela legislação em vigor. O caso foi apreciado pelo Tribunal da Golegã
e pelo Tribunal da Relação de Évora que confirmou a pena aplicada à RibTejo:
uma multa de 60 mil euros. A justiça considerou ainda que a empresa, presidida
por Passos Coelho até 2009, "teria retirado algum benefício económico da
sua conduta".
EMPRESAS: Casos atrás de casos
Entre os anos de 2002 e 2008,
além da RibTejo, outras empresas do universo Fomentinvest acabaram por perder
processos ou pagar multas relacionadas com atividades irregulares, muitas delas
agressivas para o ambiente. Nessa fase, o primeiro-ministro chegou a integrar o
conselho de administração da holding ou a presidir/administrar algumas delas,
como a HLCTejo ou a EcoAmbiente. Exemplos de ações que originaram coimas:
deposição de resíduos líquidos em aterro; ausência de autorização prévia para
gestão de resíduos; utilização de equipamento não aprovado; ou inobservância
das condições impostas na licença ambiental.
BLOGUE: Gestão exposta
Há um blogue que se dedicou,
em 2011, a fazer uma lista das manchas negras no currículo do gestor Pedro
Passos Coelho. Entre as informações disponibilizadas (incluindo relatórios e
contas ou apresentações elaboradas por consultoras de assessoria financeira) há
documentos internos, do BANIF, revelando que em 2010 o banco recebeu uma
denúncia de gestão danosa no New Energy Fund, um fundo de 100 milhões de euros
que tinha a Fomentinvest como principal promotora. Na altura em que o fundo foi
lançado, Passos era vogal da Fomentinvest - única ligação sua ao caso. A VISÃO
tentou contactar, sem sucesso, um dos remetentes das cartas do BANIF.
SEGURANÇA SOCIAL: Falha de
pagamentos
A notícia foi dada pelo jornal
Público e confirmada pelo gabinete do primeiro-ministro. Entre 1999 e 2004,
Pedro Passos Coelho não pagou as contribuições obrigatórias à Segurança Social
por achar que eram opção e por nunca ter sido notificado da dívida, prescrita
desde 2009. Apesar de ter sabido da falha em 2012, Passos só a pagou agora, em
2015, após pressão da imprensa. "O primeiro-ministro julgava, enquanto foi
trabalhador independente, que aquelas contribuições não eram devidas, razão
pela qual também não as declarou em sede de IRS", esclareceu o seu
gabinete.
IMPOSTOS: Execuções fiscais
Antes de ser
primeiro-ministro, Passos tinha uma relação difícil com a máquina fiscal, como
confirmou ao Expresso. Entre 2003 e 2007 colecionou, pelo menos, cinco
processos de execução fiscal, no total de quase seis mil euros. Assumiu falhas
de memória para precisar as informações, mas reconheceu ter havido ocasiões, em
anos anteriores ao exercício das atuais funções, em que entregou declarações e
procedeu a pagamentos fora de prazo, sujeitando-se ao pagamento de coimas e
juros. "Uma ou outra vez por distração, outras vezes por insuficiência de
meios financeiros, tive falhas no relacionamento com a autoridade tributária,
que sempre corrigi", afirmou.
FORAL: O programa amigo
Quando Miguel Relvas era
secretário de Estado da Administração Local, de 2002 a 2004, a Tecnoforma, uma
empresa de que Passos foi consultor e administrador, dominou o programa de
formação profissional Foral. Foi o Público que fez as contas, em 2012: "Só
em 2003, 82% do valor das candidaturas aprovadas a empresas privadas na região
Centro, no quadro do programa Foral, coube à Tecnoforma. E entre 2002 e 2004,
63% do número de projetos aprovados a privados pelos responsáveis desse
programa pertenciam à mesma empresa". Ao nível do País, a percentagem
situava-se, de acordo com o jornal, nos 26 por cento.
TECNOFORMA: Começam os
problemas
Entre 2005 e 2009, a
Tecnoforma (de que Passos foi administrador) teve vários processos de execução
fiscal, que chegaram a atingir a quantia de 500 mil euros. Também houve
formadores que ficaram sem receber salários, o que originou processos
judiciais. Os problemas terão começado, ao que tudo indica, com o fim do já
referido programa Foral, que otimizava verbas de fundos comunitários para a
formação de funcionários autárquicos" (texto da jornalista da Visão Sónia
Sapage, publicado na edição de 12 de março)