Análise dos Limites à Dívida nas Propostas
de Lei de Finanças Regionais e Locais
Publicação Ocasional n.º1/2013
Abril de 2013
Manuela Paixão
Rui Nuno Baleiras
Outubro 2012 e Abril de 2013
Enquadramento
O Memorando de Entendimento sobre as Condicionalidades
de Política Económica, assinado em maio de 2011 previa que, até ao final do
último trimestre de 2011, fosse «submetida à Assembleia da República uma
proposta de revisão da Lei das Finanças Locais e da Lei das Finanças Regionais,
com vista a adaptar as mesmas aos princípios e normas adoptadas pela
recentemente revista Lei do Enquadramento Orçamental, nomeadamente no que se
refere:
(i)à inclusão de todas as entidades públicas
relevantes no perímetro das administrações local e regional;
(ii)ao enquadramento plurianual das regras de
despesa, saldos orçamentais e regras de endividamento, e de orçamentação de
programas;
(iii)à interacção com as funções do Conselho das
Finanças Públicas»
No âmbito da 2.ª revisão do memorando foi
reconhecido que as entidades nacionais necessitavam de mais tempo e de
assistência técnica para a finalização dessa tarefa, tendo a data para a
apresentação dessas propostas sido revista, até ao final de março de 2012, para
a apresentação da proposta de lei das finanças regionais e, até ao final de
junho de 2012, para a submissão da proposta de lei das finanças locais. No âmbito da 3.ª revisão do
memorando, a data para a apresentação, ao Parlamento, dessas duas propostas de
lei foi novamente adiada, agora para o final de dezembro de 2012. Em cumprimento
desse prazo, a 27 de dezembro de 2012 o Governo português apresentou ao
Parlamento a Proposta de Lei n.º 121/XII relativa à Lei das Finanças das
Regiões Autónomas (doravante, PPL 121) e a Proposta de Lei n.º 122/XII/2.ª
relativa à Lei das Finanças Locais (PPL 122).
O Conselho das Finanças Públicas divulgou
em setembro de 2012 um relatório com evidência empírica e onde sugeria um conjunto
de princípios a serem tidos em conta na preparação da revisão legislativa. CFP
(2012),
(Princípios para a Revisão das Leis de
Finanças Públicas Subnacionais, Relatório n.º 2/2012,Setembro, Lisboa: Conselho
das Finanças Públicas).
Em abril de 2013, tenciona publicar um
segundo relatório onde analisa economicamente as propostas de lei em discussão
no Parlamento.
(CFP (2013), Análise das Propostas de Lei de
Finanças Públicas Subnacionais, Relatório n.º 1/2013, abril, Lisboa: Conselho
das Finanças Públicas (no prelo)
O presente documento é um contributo analítico
adicional. Concentra-se na regra de dívida constante da PPL 121 e da PPL 122.
Reúne e compatibiliza informação dispersa por várias fontes sobre a magnitude
do endividamento subnacional atual e constrói uma série de exercícios de
simulação numérica. Com a sua divulgação, o CFP oferece ao público uma análise que
visa aferir o impacto dos limites de dívidas em discussão no Parlamento sobre a
dívida bruta das Administrações Públicas. A Secção 1 apresenta o indicador de
dívida estabelecido na PPL 121 para as Regiões Autónomas e reúne a informação
disponível para calcular o seu valor nos anos 2009 a 2011. Com as limitações
próprias de um exercício de aplicação retroativa, sinaliza a posição que cada
território teria naqueles anos perante a meta numérica fixada na proposta de
lei. A Secção 2 replica esta estrutura para a PPL 122 e o subsector local.
Finalmente, a Secção 3 compara a posição de cada região e do conjunto dos
municípios e serviços municipalizados entre o indicador de dívida fixado pelas
propostas de lei e o indicador de dívida que Portugal reporta ao Eurostat no
âmbito do Procedimento dos Défices Excessivos. Avalia, de modo retroactivo,
como é que o cumprimento das metas fixadas nas PPL teria impactado sobre o
nível de dívida reportada nos anos mais recentes. Inclui ainda um exercício que
avalia o espaço que teria ficado disponível para os restantes subsectores públicos
no limite de 60% do PIB estabelecido na legislação europeia no caso de as
regiões e os municípios terem esgotado a capacidade legal de endividamento
fixado nas PPL 121 e 122.
Proposta de revisão da Lei das Finanças das Regiões Autónomas
A PPL 121 estabelece, no número 1 do artigo
39.º, que o total do passivo exigível das regiões autónomas não pode ultrapassar,
em 31 de dezembro de cada ano, 1,5 vezes a média da receita corrente líquida
cobrada nos últimos três exercícios.Segundo os dados da conta consolidada do sector
público administrativo regional, constantes nas Contas apresentadas pelas duas
regiões autónomas, a receita corrente evoluiu entre 2006 e 2011 de acordo com o
que o Quadro 1 mostra.
Essa informação é, grosso modo, coincidente
com os dados divulgados pela Direção-Geral do Orçamento (DGO), que disponibiliza
um conjunto de informação relativa à execução orçamental das Regiões Autónomas
para períodos mais recentes, permitindo, esta segunda fonte, estender a série
até ao ano de 2012.
O Quadro 3 calcula a receita corrente média
mais recente que entra no indicador da regra de dívida.
Uma vez que não se encontram disponíveis
dados patrimoniais relativamente às regiões autónomas, o valor do passivo
exigível pode ser obtido através da informação da dívida financeira das regiões,
tal como reportada no Procedimento dos Défices Excessivos (PDE), adicionada do
montante da dívida não financeira. Relativamente à dívida financeira, e de acordo
com os dados da última notificação do Instituto Nacional de Estatística (INE, março
de 2013), o valor dessa dívida evoluiu entre 2008 e 2012 como o Quadro 4
mostra.
Relativamente
à dívida não financeira, apenas se conseguiu obter informação para o ano de
2011 e através da variável “encargos assumidos e não pagos” apurada em
Ministério das Finanças (2012) (Ministério das
Finanças (2012),20 de abril, Lisboa). Juntando
essa informação à informação anterior, obtém-se a série no Quadro 5.
De acordo com os cálculos efectuados, verifica-se
que em 2011 a Região Autónoma dos Açores estaria em situação de alerta pelo
facto do valor do seu passivo exigível exceder, em cerca de 30 milhões de euros,
o valor médio da receita corrente líquida cobrada nos três anos anteriores. Já
a Região Autónoma da Madeira estaria, desde 2009, em situação de excesso de
dívida, visto nesses três anos ter um passivo exigível sempre superior a 1,5
vezes o valor médio da receita corrente líquida cobrada. A diferença
substancial entre os anos de 2010 e 2011 no caso desta região não deve ser
valorizada por causa da quebra na série da dívida não financeira acima
referida.
Denote-se
que a PPL 121 refere, no número 2 do Artigo 39.º, que o limite fixado poderá
ser ultrapassado quando esteja em causa a contração de empréstimos para o
financiamento de investimentos de recuperação de infraestruturas afetadas por
situações de catástrofe, calamidade pública ou outras situações excecionais,
não tendo esta exceção sido considerada na presente secção por apenas se ter
tido conhecimento de valores para a RAM (Concretamente,
75 M€ em 2010 e 2011 e 25 M€ em 2012 e 2013, conforme UTAO (2013), Análise ao
Impacto Orçamental da Proposta de Lei n.º 121/XII/2.ª, Parecer Técnico n.º
2/2013, 8 de abril, Lisboa: Unidade Técnica de Apoio Orçamental)
Com
todas as reservas que um exercício de simulação de aplicação retroativa
da (proposta de) lei comporta, a principal ilação a retirar do Quadro 6 é a de
que muito dificilmente uma região cuja dívida relevante ultrapassa em 2011 o seu
teto em mais de quatro vezes será capaz de o cumprir em 2014, primeiro ano previsto
para a aplicação da lei.
Não se pode comparar a evolução do passivo
exigível entre 2010 e 2011 porque há uma quebra de série na componente “dívida
não financeira”: só existe informação sobre ela no ano de 2011, embora isso não
significa que, na realidade, não existisse antes. Com esta ressalva, tomando
por base este conjunto de informação, calculou-se, retroactivamente, os montantes
relativos ao limite da dívida, bem como os respectivos desvios face aos indicadores
de alerta precoce e de excesso de dívida, caso a regra enunciada na proposta de
lei em análise se encontrasse em vigor. Refira-se que não foi possível calcular
esses indicadores para 2012, dado que não se encontra disponível informação
relativa à dívida não financeira para esse ano