quarta-feira, abril 24, 2013

Análise dos limites à dívida na proposta de Lei de Finanças Regionais



Análise dos Limites à Dívida nas Propostas de Lei de Finanças Regionais e Locais
Publicação Ocasional n.º1/2013
Abril de 2013
Manuela Paixão
Rui Nuno Baleiras
Outubro 2012 e Abril de 2013
  

Enquadramento

O Memorando de Entendimento sobre as Condicionalidades de Política Económica, assinado em maio de 2011 previa que, até ao final do último trimestre de 2011, fosse «submetida à Assembleia da República uma proposta de revisão da Lei das Finanças Locais e da Lei das Finanças Regionais, com vista a adaptar as mesmas aos princípios e normas adoptadas pela recentemente revista Lei do Enquadramento Orçamental, nomeadamente no que se refere:
(i)à inclusão de todas as entidades públicas relevantes no perímetro das administrações local e regional;
(ii)ao enquadramento plurianual das regras de despesa, saldos orçamentais e regras de endividamento, e de orçamentação de programas;
(iii)à interacção com as funções do Conselho das Finanças Públicas»
No âmbito da 2.ª revisão do memorando foi reconhecido que as entidades nacionais necessitavam de mais tempo e de assistência técnica para a finalização dessa tarefa, tendo a data para a apresentação dessas propostas sido revista, até ao final de março de 2012, para a apresentação da proposta de lei das finanças regionais e, até ao final de junho de 2012, para a submissão da proposta de lei das  finanças locais. No âmbito da 3.ª revisão do memorando, a data para a apresentação, ao Parlamento, dessas duas propostas de lei foi novamente adiada, agora para o final de dezembro de 2012. Em cumprimento desse prazo, a 27 de dezembro de 2012 o Governo português apresentou ao Parlamento a Proposta de Lei n.º 121/XII relativa à Lei das Finanças das Regiões Autónomas (doravante, PPL 121) e a Proposta de Lei n.º 122/XII/2.ª relativa à Lei das Finanças Locais (PPL 122).
O Conselho das Finanças Públicas divulgou em setembro de 2012 um relatório com evidência empírica e onde sugeria um conjunto de princípios a serem tidos em conta na preparação da revisão legislativa. CFP (2012), (Princípios para a Revisão das Leis de Finanças Públicas Subnacionais, Relatório n.º 2/2012,Setembro, Lisboa: Conselho das Finanças Públicas). Em abril de 2013, tenciona publicar um segundo relatório onde analisa economicamente as propostas de lei em discussão no Parlamento. (CFP (2013), Análise das Propostas de Lei de Finanças Públicas Subnacionais, Relatório n.º 1/2013, abril, Lisboa: Conselho das Finanças Públicas (no prelo)
O presente documento é um contributo analítico adicional. Concentra-se na regra de dívida constante da PPL 121 e da PPL 122. Reúne e compatibiliza informação dispersa por várias fontes sobre a magnitude do endividamento subnacional atual e constrói uma série de exercícios de simulação numérica. Com a sua divulgação, o CFP oferece ao público uma análise que visa aferir o impacto dos limites de dívidas em discussão no Parlamento sobre a dívida bruta das Administrações Públicas. A Secção 1 apresenta o indicador de dívida estabelecido na PPL 121 para as Regiões Autónomas e reúne a informação disponível para calcular o seu valor nos anos 2009 a 2011. Com as limitações próprias de um exercício de aplicação retroativa, sinaliza a posição que cada território teria naqueles anos perante a meta numérica fixada na proposta de lei. A Secção 2 replica esta estrutura para a PPL 122 e o subsector local. Finalmente, a Secção 3 compara a posição de cada região e do conjunto dos municípios e serviços municipalizados entre o indicador de dívida fixado pelas propostas de lei e o indicador de dívida que Portugal reporta ao Eurostat no âmbito do Procedimento dos Défices Excessivos. Avalia, de modo retroactivo, como é que o cumprimento das metas fixadas nas PPL teria impactado sobre o nível de dívida reportada nos anos mais recentes. Inclui ainda um exercício que avalia o espaço que teria ficado disponível para os restantes subsectores públicos no limite de 60% do PIB estabelecido na legislação europeia no caso de as regiões e os municípios terem esgotado a capacidade legal de endividamento fixado nas PPL 121 e 122.
 
Proposta de revisão da Lei das Finanças das Regiões Autónomas

A PPL 121 estabelece, no número 1 do artigo 39.º, que o total do passivo exigível das regiões autónomas não pode ultrapassar, em 31 de dezembro de cada ano, 1,5 vezes a média da receita corrente líquida cobrada nos últimos três exercícios.Segundo os dados da conta consolidada do sector público administrativo regional, constantes nas Contas apresentadas pelas duas regiões autónomas, a receita corrente evoluiu entre 2006 e 2011 de acordo com o que o Quadro 1 mostra.


Essa informação é, grosso modo, coincidente com os dados divulgados pela Direção-Geral do Orçamento (DGO), que disponibiliza um conjunto de informação relativa à execução orçamental das Regiões Autónomas para períodos mais recentes, permitindo, esta segunda fonte, estender a série até ao ano de 2012.
O Quadro 3 calcula a receita corrente média mais recente que entra no indicador da regra de dívida.

Uma vez que não se encontram disponíveis dados patrimoniais relativamente às regiões autónomas, o valor do passivo exigível pode ser obtido através da informação da dívida financeira das regiões, tal como reportada no Procedimento dos Défices Excessivos (PDE), adicionada do montante da dívida não financeira. Relativamente à dívida financeira, e de acordo com os dados da última notificação do Instituto Nacional de Estatística (INE, março de 2013), o valor dessa dívida evoluiu entre 2008 e 2012 como o Quadro 4 mostra.
Relativamente à dívida não financeira, apenas se conseguiu obter informação para o ano de 2011 e através da variável “encargos assumidos e não pagos” apurada em Ministério das Finanças (2012) (Ministério das Finanças (2012),20 de abril, Lisboa). Juntando essa informação à informação anterior, obtém-se a série no Quadro 5.
 De acordo com os cálculos efectuados, verifica-se que em 2011 a Região Autónoma dos Açores estaria em situação de alerta pelo facto do valor do seu passivo exigível exceder, em cerca de 30 milhões de euros, o valor médio da receita corrente líquida cobrada nos três anos anteriores. Já a Região Autónoma da Madeira estaria, desde 2009, em situação de excesso de dívida, visto nesses três anos ter um passivo exigível sempre superior a 1,5 vezes o valor médio da receita corrente líquida cobrada. A diferença substancial entre os anos de 2010 e 2011 no caso desta região não deve ser valorizada por causa da quebra na série da dívida não financeira acima referida.
Denote-se que a PPL 121 refere, no número 2 do Artigo 39.º, que o limite fixado poderá ser ultrapassado quando esteja em causa a contração de empréstimos para o financiamento de investimentos de recuperação de infraestruturas afetadas por situações de catástrofe, calamidade pública ou outras situações excecionais, não tendo esta exceção sido considerada na presente secção por apenas se ter tido conhecimento de valores para a RAM (Concretamente, 75 M€ em 2010 e 2011 e 25 M€ em 2012 e 2013, conforme UTAO (2013), Análise ao Impacto Orçamental da Proposta de Lei n.º 121/XII/2.ª, Parecer Técnico n.º 2/2013, 8 de abril, Lisboa: Unidade Técnica de Apoio Orçamental)
Com todas as reservas que um exercício de simulação de aplicação retroativa da (proposta de) lei comporta, a principal ilação a retirar do Quadro 6 é a de que muito dificilmente uma região cuja dívida relevante ultrapassa em 2011 o seu teto em mais de quatro vezes será capaz de o cumprir em 2014, primeiro ano previsto para a aplicação da lei.


Não se pode comparar a evolução do passivo exigível entre 2010 e 2011 porque há uma quebra de série na componente “dívida não financeira”: só existe informação sobre ela no ano de 2011, embora isso não significa que, na realidade, não existisse antes. Com esta ressalva, tomando por base este conjunto de informação, calculou-se, retroactivamente, os montantes relativos ao limite da dívida, bem como os respectivos desvios face aos indicadores de alerta precoce e de excesso de dívida, caso a regra enunciada na proposta de lei em análise se encontrasse em vigor. Refira-se que não foi possível calcular esses indicadores para 2012, dado que não se encontra disponível informação relativa à dívida não financeira para esse ano