O militar dos
Comandos acusado de matar outro com uma G-3, no Quartel da Carregueira, no
concelho de Sintra, em setembro de 2018, guardava em casa munições reais do
mesmo lote da munição usada para matar o jovem. Segundo o despacho de
acusação do Ministério Público (MP), a que a agência Lusa teve acesso, o
arguido Deisom Camará, atualmente com 22 anos e em prisão preventiva desde 30
de novembro de 2018, conhecia a vítima Luís Teles Lima (pertencente ao 126º.
Curso de Comandos), desde que terminou o 127.º Curso de Comandos, em novembro
de 2016. Arguido e vítima,
ambos com o posto de soldado, estiveram depois em missão na República Centro
Africana (RCA) para integrar a segunda Força Nacional Destacada inserida na
MINUSCA – Missão Multidimensional Integrada das Nações Unidas para a
Estabilização na República Centro-Africana — em Bangui, entre 04 de setembro de
2017 e 05 de março de 2018.
Após regressar da
missão, a vítima ingressou na 2.ª Companhia de Comandos, na qual esteve até
setembro de 2018, mês em que passou para a Companhia de Formação, com a função
de auxiliar na formação, em concreto na parte de tiro de combate. Em 28 de novembro de
2018, dia em que o arguido foi detido, as autoridades encontraram no interior
de uma caixa que estava dentro de um armário, no seu quarto, em Agualva, Cacém,
no concelho de Sintra, “quatro munições reais de calibre 7.62 mm (milímetros),
do mesmo lote da munição que vitimou o soldado Teles“, 10 munições de salva,
uma munição real de outro calibre, uma granada de instrução ativa e não
deflagrada e um invólucro de um morteiro de 60mm.
Por configurar a
prática de um eventual crime de furto de material de guerra, o MP extraiu
certidão e remeteu-a para a secção especializada em crimes estritamente
militares do Departamento de Investigação e Ação Penal de Lisboa.
A acusação conta que,
pelas 18h23 de 21 de setembro de 2018, o soldado Luís Lima “dirigiu-se de uma
forma descontraída à casa da guarda de apoio ao paiol, onde estava de serviço
Deisom Camará, onde ambos mantiveram conversa de teor não concretamente
apurado”.
Considerando as
funções que estava desempenhar, o arguido tinha uma espingarda automática G-3,
com um carregador municiado com 16 munições reais e uma de salva, de calibre de
7.62 milímetros (mm).
Entre as 18h16 e as
18h48, a vítima e o seu melhor amigo, também militar, trocaram mensagens
escritas através da aplicação whatsApp, “sempre de teor descontraído e
bem-disposto sobre o futuro, e exibindo em várias mensagens ‘emojis’ de
‘riso/gargalhada'”.
“Entre as 18h48 e as 18h56, por motivos não
apurados, o arguido Deisom Camará empunhou a espingarda automática G-3 que lhe
estava adstrita em função do serviço de sentinela à casa do paiol que estava a
executar, encostando-a ao peito da vítima, encontrando-se o soldado Teles Lima
já no exterior da casa do paiol. Em ato contínuo, o arguido disparou a arma que
empunhava, tendo atingido a vítima na região peitoral esquerda, que redundou na
sua morte”, descreve a acusação.
Cerca das 18h56, o
arguido ligou para o telemóvel de serviço do Oficial de Dia ao Regimento de
Comandos a informar que havia um “homem ferido” e que precisava que ligassem
para o 112. Dois minutos depois, o Oficial de Dia ligou ao arguido, dizendo-lhe
que teria de ser ele a ligar para conseguir dar as instruções ao INEM, mas que
se encontrava a caminho do local na companhia do Condutor de Dia.
“Pelas 18h59 é efetuada a chamada para o INEM
pelo arguido, apesar de Deisom Camará não ter pronunciado qualquer palavra
durante os 25 segundos iniciais da chamada”, conta o MP.
Só quando o Oficial
de Dia e o Condutor de Dia chegam ao local é que este último “agarrou no
telemóvel do arguido e iniciou a conversa com o INEM: “militar ferido, com
gravidade por disparo de arma de fogo acidental, com perfuração do pulmão, ou
seja, o projétil entrou e saiu, têm de vir com urgência para o local”, disse o
Condutor de Dia ao INEM.
Cerca das 19h11, uma
viatura dos Bombeiros de Belas, no concelho de Sintra, entrou no Regimento de
Comandos, onde foram realizadas manobras de suporte básico de vida à vítima,
“não lhes tendo sido comunicado no local qualquer detalhe dos factos ocorridos
que levaram àquele ferimento”.
Oito minutos depois
chegou uma Viatura Médica de Emergência e Reanimação, chefiada por uma médica
que “questionou diversas pessoas sobre os factos ocorridos, quer nesse momento,
quer já no momento em que procedia às manobras de suporte avançado de vida, não
obtendo qualquer resposta, mas apenas silêncio, por parte de todos aqueles que
se encontravam no local”.
“Pelas 19h22, o Coronel Eduardo Pombo —
Comandante do Regimento de Comandos — dirigiu-se à casa da guarda de apoio ao
paiol, tendo poucos minutos depois falado a sós com o arguido. Imediatamente
após tal conversa, o soldado Deisom Camará recebeu indicações do Coronel
Eduardo Pombo para que este fosse tomar banho e comer qualquer coisa”, relata a
acusação. O soldado Luís Lima
morreu às 19h42. O arguido está acusado dos crimes de homicídio qualificado e
de detenção de arma proibida (Observador)
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