domingo, outubro 02, 2011

Empresas públicas: se o buraco é gigante, as regalias também

Segundo o Jornal I num texto do jornalista Filipe Paiva Cardoso, “a empresa [Carris] manterá uma barbearia devidamente apetrechada, para uso privativo de todo o seu pessoal, inclusive reformados.” Este é um pequeno exemplo dos fardos históricos que alguns Acordos de Empresa do sector empresarial do Estado carregam consigo e que têm impedido reestruturações mais aprofundadas que as que têm vindo a ser feitas – especialmente na Carris. As empresas do Estado, tal como o i noticiou quinta-feira, apresentam um risco potencial para o Orçamento do Estado – vulgo contribuintes – superior a oito mil milhões de euros. Ainda assim, estas empresas mantêm regalias aos trabalhadores dignas de um Bill Gates. Segundo os acordos de empresa em vigor, tanto na CP, Metro, Carris ou Transtejo, são pagos prémios por cada dia de trabalho concluído – além do salário –, ou mesmo subsídios de 230 euros mensais caso o trabalhador não falte nenhum dia num mês. Valores que acrescem ao salário e acabam a contar para subsídios de Natal e férias. Por falar em férias: os trabalhadores da Carris têm direito a 30 dias de descanso anual - além do direito a tirar um dia por mês para assuntos pessoais -, assim como os do Metro de Lisboa. Nesta última, porém, é preciso cumprir requisitos: se faltar só uma vez no ano anterior e gozar férias fora da época alta, tem então 30 dias. Ainda nestas transportadoras, há outras regalias que chegam aos reformados, isto além da barbearia da Carris. Tanto a Carris como o Metro pagam complementos de reforma aos seus ex-trabalhadores, de forma a que a pensão seja igual à do último salário recebido no activo – algo que também ocorre nos STCP. Se acha que há um limite a este complemento, desengane-se: há reformados que apesar de terem pensões acima de quatro e cinco mil euros mensais, continuam a receber complementos de reforma pagos pelas empresas, segundo apurou o i - tal situação, contudo, não ocorre nos STCP, cujos complementos estão limitados.
Baixas a 100%
Segundo os AE, o absentismo de longa duração parece compensar nas empresas de transporte. Quando um trabalhador fica de baixa, tem direito a receber não só o subsídio de doença como o empregado comum, mas também um complemento de baixa pago pela empresa, de forma a que mesmo de baixa o vencimento mensal seja 100% do que recebia no activo. Ou seja, a empresa compensa o que o Estado penaliza – nos primeiros 90 dias de baixa um trabalhador comum recebe apenas 65% do vencimento. Mas além do salário normal que recebem por trabalhar, há também vários subsídios pagos por estas empresas para premiar quem aparece ao trabalho (ver ao lado com mais detalhe). É maquinista? Então tem direito a um subsídio por cada quilómetro percorrido, isto além do salário. E caso não falte mais de cinco horas no mês, também tem direito a um prémio de 68 euros no mês seguinte. Não faltou no mês todo? Então tome lá um prémio de 223 euros este mês – tudo exemplos retirados dos AE das empresas.
Irmã solteira? Ela que venha
A complementar tudo isto, surgem as regalias mais comuns neste tipo de empresas, ainda que alargadas. Na generalidade das empresas de transporte os empregados e reformados, além das respectivas famílias podem viajar gratuitamente. Por famílias entende-se não só cônjuges, como os pais, filhos, enteados e mesmo eventuais irmãs solteiras que os trabalhadores tenham, como no caso da CP. Só a Refer, onde os trabalhadores que transitaram da CP têm direito a este benefício, gasta perto de 4 milhões de euros por ano em viagens que os seus colaboradores usufruem gratuitamente.
Até ao buraco
A diferença entre as regalias concedidas aos trabalhadores e os prejuízos que vão provocando aos contribuintes, são abissais nestas empresas. Só no ano passado, a CP, Metro de Lisboa e a Carris registaram perdas totais de quase 390 milhões de euros, tendo visto os capitais próprios afundar ainda mais: estas mesmas três empresas estão em falência técnica e com um buraco latente de mais de 3,5 mil milhões de euros”.

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