quinta-feira, março 06, 2014

PPP das águas garantem lucro excessivo a privados...



Segundo o DN de Lisboa, num texto do jornalista Luís Manuel Cabral, “o TdC detetou situações nos acordos de concessão das águas que lesam câmaras e munícipes. Recomenda revisão dos contratos com taxa de lucro superior a 10% O lucro dos privados está sempre garantido até mesmo se o negócio correr mal – leia- se menos clientes, menos faturação, aumento do custo da água comprada, perdas de água, dívidas incobráveis. As câmaras asseguram o risco e a rentabilidade do parceiro privado. E quando não é o município a garantir o lucro previsto pelas empresas, então quem paga é o cidadão, que vê o tarifário da água aumentar. Sim, falamos do negócio da água que chega à torneira dos portugueses e que foi alvo de uma auditoria do Tribunal de Contas ( TdC), a qual concluiu que a maioria das concessões a privados tem cláusulas que prejudicam o interesse público. Verdadeiros “contratos leoninos”, diz o TdC. Do universo de 27 parcerias público- privadas ( PPP) do sector das águas e saneamento, o Tribunal de Contas analisou detalhadamente contratos/ aditamentos/ protocolos relativos a 19 concessões municipais. E a auditoria desta entidade detetou situações preocupantes, que prejudicam as câmaras e os munícipes e permitem uma margem de lucro para os privados acima do recomendável neste tipo de parcerias ( 8% a 10%, no máximo). Há empresas, como a espanhola Aquália, que na concessão das águas de Campo Maior chega a ter uma taxa interna de rentabilidade ( TIR) de 15,50%. Ou seja, em cada cem euros investidos, a empresa tem sempre garantido um ganho de 15,5 euros. O Tribunal de Contas considera “inaceitáveis” alguns dos valores da TIR acionista que encontrou e exige que a entidade reguladora do sector ( ERSAR) promova a revisão dos contratos. A recomendação é que o lucro não seja superior a 10%.

“As expectativas de remuneração inicial dos acionistas da concessionária devem ser revistas em baixa, em face das alterações de circunstâncias e por razões fundamentadas de interesse público (...) Neste contexto, as TIR acionistas devem ser revistas em baixa, especialmente nos casos em que são superiores a 10%, no sentido de promover um maior equilíbrio entre os contraentes público e privado e respetivos utilizadores”, diz o Tribunal de Contas, presidido por Guilherme d’Oliveira Martins. No universo de 27 concessões municipais de águas, a taxa interna de rentabilidade oscila entre os 9,5% ( Cascais, concessionada à Aquapor e AGS, empresas detidas por construtoras) e os 15,5% ( Campo Maior). Entre os contratos que evidenciam o maior nível de expectativa de remuneração acionista estão ainda o do Fundão, 15,31%, de Elvas, 13,085% e do Cartaxo com 13,39%. Todas estas concessões integram o grupo económico Aquália. Também as concessões de Alenquer, Azambuja, Feira, Matosinhos e Vila do Conde apresentam TIR efetivas superiores a 10%. O Tribunal de Contas recomenda igualmente a eliminação progressiva de cláusulas contratuais que colocam demasiado peso sobre as câmaras. Por exemplo, quando não são atingidos os consumos previstos, seja porque razão for é a câmara que tem de pagar a diferença. Na opinião do organismo liderado por Oliveira Martins, o Governo terá de intervir rapida -mente no sentido de alterar a legislação. E nesse sentido propõe que se acabe com aquilo que considera “uma cláusula leonina, que prejudica claramente o interesse público”: o facto de os municípios apenas poderem exigir a revisão do contrato de concessão, caso este perspetive uma taxa interna de rentabilidade para o investimento acionista superior ao dobro daquela que consta no caso base inicial. Considera o TdC ser necessário a “adoção de pressupostos económicos, financeiros e técnicos prudentes”, em futuras concessões, no sentido de garantir a sustentabilidade económico--financeira das parcerias, “evitando potenciais reequilíbrios com repercussões negativas ao nível do tarifário”.

Contratos armadilhados

A análise às PPP das águas revelou contratos assentes em projeções irrealistas e nefastas para o interesse público. “De acordo com as boas práticas e os princípios de partilha de risco de uma PPP/ concessão, o risco de insustentabilidade financeira de uma PPP resultante de riscos de mercado, riscos de procura, riscos financeiros, riscos de construção e de exploração deve ser, tanto quanto possível, transferido para o parceiro privado, o que, de facto, não se verificou em quase todos contratos analisados”. E o TdC cita como exemplo as concessões de Barcelos, Fundão, de Valongo, Paços de Ferreira e Santo Tirso/ Trofa. Cerca de 74% dos contratos garantem o pagamento de consumos mínimos que, se não forem atingidos pelos munícipes, as autarquias pagam. É o caso das concessões de Barcelos, de Paços de Ferreira, de Paredes, de Carrazeda e de Marco de Canaveses nas quais os consumos efetivos estão abaixo do previsto em mais de 20% e são as câmaras a suportar a faturação em falta.

“As projeções adotadas quanto ao crescimento populacional, bem como as capitações estimadas, apresentam, em muitas destas concessões, um desfasamento substancial da realidade de muitos municípios. Estas estimativas foram fornecidas e aprovadas pelas entidades concedentes, sem que fossem previamente auditadas”, co - mo acontece em Barcelos e Carrazeda de Ansiães. OTdC constatou também que o “investimento da responsabilidade das entidades gestoras foi concretizado e dimensionado para dar cobertura a uma expetativa de crescimento populacional e de consumos que, na prática, também não existiram.” Nesta situação está Barcelos. Em 99% dos processos de reequilíbrio económico- financeiro dos contratos analisados, as reposições foram realizadas através de alteração do prazo das concessões, da eliminação ou redução das retribuições a pagar aos municípios e da alteração dos tarifários. Como consequência dos processos de reequilíbrio das concessões, cerca de 26% dos municípios tiveram redução, ou mesmo eliminação da retribuição da concessão, como foi o caso das concessões de Fafe, Santo Tirso/ Trofa, Ourém, Trancoso e Valongo. Já na concessão de Campo Maior, sempre que ocorreram alterações contratuais registou- se o aumento das tarifas de água”