segunda-feira, abril 15, 2013

Opinião pessoal: "Os erros desastrosos"



"O governo de coligação está desesperado e quer, a todo o custo, envolver o PS nas próximas decisões que tomará, até final deste mês no âmbito da anunciada (e polémica) contenção da despesa pública, tentando deste modo partilhar com o maior partido da oposição e negociador do memorando de entendimento com a tróica de Maio de 2011, o ónus político (e eleitoral) que a implementação de um pacote de medidas de forte redução da despesa pública acarreta, a que se junta o impacto de uma criminosa austeridade que durante muitos anos (e gerações) pagaremos.
Penso que o governo de coligação, hoje claramente desacreditado, desprezado e hostilizado, atrasou o processo, com a cumplicidade da tróica, para ganhar tempo para que tudo fizesse no sentido de trazer o PS de Seguro ao "comboio" da austeridade que os socialistas foram os primeiros responsáveis.
O problema é que, neste contexto, o governo de coligação, numa demonstração, mais uma, da sua inexperiência, incompetência e fragilidade, cometeu dois erros, um deles essencial, o outro consequência do primeiro.
O primeiro erro teve a ver com o discurso político e com a hostilidade face ao PS, expressa quer no discurso oficialista quer implementada pela incompetente propaganda do governo de coligação. Compreende-se que a coligação ainda no poder tenha sentido grandes dificuldades em encontrar justificações aos portugueses para as decisões que foi tomado ao longo dos últimos dois anos, que nada tem a ver com o que foi prometido na campanha eleitoral - o que coloca em evidência a falta de carácter deste gangue que nos governa e faz ressurgir o embuste e a mentira em que assentou a chegada ao poder desta gente, à custa da mentira, da demagogia e da aldrabice.
A necessidade de apontar responsabilidades a terceiros, a urgência de repetidamente culpabilizar, em concreto, o PS e a desgovernação socialista de Sócrates, levou o governo de coligação a reforçar a agressividade do discurso político contra os socialistas. Mas à medida que percebeu que a sua estratégia não estava a resultar e que a contestação social estava (está) a crescer. O problema é que quando pretendeu recuar, optando por uma outra estratégia (a de envolver o PS), já era tarde.
Por um lado, porque se ficou a saber, provavelmente em mais uma daquelas fugas de informação "controladas" e tontas da propaganda deste governo de coligação, dos cortes de cerca de 4 mil milhões de euros na despesa pública, sem se conhecerem critérios nem prioridades sociais. Era o esboço inicial de um claro ataque ao chamado estado social, relativamente ao qual tenho muitas dúvidas, quer sobre a legitimidade deste governo para o fazer, quer sobre a constitucionalidade das medidas que porventura pretenderá impor.
Por outro lado, segundo aspecto negativo, era mais do que evidente que passados dois anos de ataque político quase permanente, por parte da coligação os socialistas sentiam-se ostracizados, ofendidos, humilhados. O entendimento, salvo se surgir uma ponte credível entre as duas partes, dificilmente será possível, até porque o PS não quer correr o risco, num cenário para-eleitoral, de ser atacado e pressionado não só na rua mas ser também pressionado pela esquerda, que apesar de contar pouco ou nada neste quadro, alimenta dúvidas quanto a um inevitável crescimento eleitoral do PCP e do Bloco à custa da crise e da insatisfação popular e não por qualquer mérito próprio que não têm, dado que terão atingido a dimensão eleitoral real.
Ou seja, quando o governo de coligação, pressionado, desesperado e com medo de cair pela força da rua, porventura por uma violência crescente relativamente à qual a própria Presidente do FMI manifestou preocupação recente, pretendeu estender a mão ao PS - e fê-lo inúmeras vezes, através de ministros, deputados, dirigentes, comentadores, etc. - os socialistas já estavam distantes. Distantes, desde logo, devido aos problemas internos, às disputas pela liderança do partido, à pressão das autárquicas, à pressão política mais recente resultante do regresso de Sócrates aos écrans da RTP na qualidade de comentador político. Mas pressionados sobretudo pela frustração das sondagens, já que nenhuma delas dá ao PS, apesar de o colocar sempre como partido mais votado, uma diferença eleitoral suficientemente tranquila para poder impor-se no contexto político nacional como solução governativa liderante.
O PS não quer acordos governativos com o PCP e o Bloco. Eventualmente ensaiaria a solução de um governo minoritário, o que politicamente seria desastroso porque o colocaria à mercê de amuos de políticos na oposição. A solução mais plausível, em meu entender, embora dependente dos resultados eleitorais e da amplitude do desgaste que o CDS possa sofrer, seria a tentativa de um entendimento com os populares - aliás já foram parceiros no governo de Lisboa e em coligação eleitorais em todo o país, Madeira incluída - e, caso necessário, com grupos de deputados específicos (por exemplo, os deputados das regiões autónomas), tal como acontece noutros países europeus.
O segundo erro do governo, associado ao primeiro, tem a ver com o facto da coligação PSD/CDS ter perdido espaço de manobra negocial com os socialistas no parlamento, levando-os à apresentação de uma moção de censura embora neste caso - até porque a iniciativa política do PS de Seguro acabou por revelar-se desastrada, sem consistência, sem fulgor, sem um discurso político contundente, sem a apresentação de alternativas credíveis à governação que se exigia naquele momento – esteja convencido que Seguro foi pressionado a fazê-lo sob pena de poder ser questionada a sua liderança em vésperas de um novo congressos e consumado o regresso de Sócrates, reconhecidamente um animal político com uma grande capacidade comunicacional e de manipulação discursiva. O problema é que os socialistas se convenceram que o governo de coligação – que tutela a RTP – foi conhecedor atempado da proposta da estação pública e incentivou-a provavelmente a pensar no impacto da presença semanal de Sócrates, descreditado aos olhos dos cidadãos é certo, mas eventualmente perdoado e recuperado pelas bases do PS - facto que colocaria problemas complexos de afirmação a Seguro obrigando-o a uma mudança política. Maquiavelismo puro, com algum sentido e muita lógica.
Neste momento o que temos e em que situação nos encontramos? Pressionado pelo recente acórdão do TC, o governo de coligação resolveu acelerar o processo de imposição da redução da despesa pública, pressionado pela tróica mas sobretudo pela urgente necessidade de encontrar, segundo o discurso oficial, uma alternativa ao impacto orçamental decorrente da decisão do Constitucional. Basicamente o governo de coligação serviu-se da decisão do TC para implementar algo que estava adormecido, por falta de coragem política e à procura do tempo certo. O governo de coligação disse sempre que não tinha um "plano B" caso a decisão do TC fosse desfavorável, como todos suspeitavam que seria. Não precisava de "plano B". Tinha uma alternativa que agora quer aprovar. Daí a dramatização em torno do acórdão do TC, instrumento fundamental para avançar com o corte da despesa pública pensado e negociado com a tróica no ano passado. O governo tem um plano de cortes da despesa pública, concluído em Outubro do ano passado, que aponta para cortes de 4,5 mil milhões de euros na despesa pública, contendo muitas opções que resultam de exigências da tróica. E que vão agravar a instabilidade social, algo que o governo de coligação tentou travar coma palhaçada da dramatização em torno do acórdão do TC.
Percebe-se por isso que, neste quadro, o PS não esteja interessado em acordos com um governo desacreditado, algo moribundo e que teme ser alvo de crescente e mais acentuada contestação social, proporcional ao anúncio dos cortes da despesa pública que na realidade mais não são do que tentar passar encargos do Estado para as famílias e as empresas já sem margem de manobra e sem rendimentos disponíveis para mais despesas. Penso que caminhamos para a implosão social da responsabilidade exclusiva deste governo desprezível e dos partidos que o suportam" (JM)