As portas completamente abertas são defendidas por muito poucos e as totalmente fechadas por apenas 15%. No meio, a grande maioria dos portugueses divide-se sobre imigração extra-europeia, vinda de países mais pobres. No último ano alguma coisa mudou. A pergunta é feita nas sondagens ICS-ISCTE para o Expresso e SIC desde março de 2023, há quase dois anos: “Em que medida Portugal deve deixar que pessoas dos países mais pobres fora da Europa venham e fiquem a viver cá?" A resposta pouco ou nada se alterou no último ano: 40% dos inquiridos responderam que se “deve deixar vir algumas pessoas” e 38% “poucas pessoas”.
As duas posições que refletem uma imigração regulada (vinda de fora do contexto europeu e de países mais pobres) é largamente superior aos que defendem que Portugal não deveria deixar vir “ninguém” destes países, 15%. Sendo que apenas 4% dos portugueses defendem, agora, uma política de ‘portas totalmente abertas’, dizendo que o país deve permitir a entrada de “muitas pessoas”. Comparando com resultados de janeiro de 2024, anota a equipa do ICS-ICSTE, “não houve uma alteração significativa”: naquela altura 42% responderam que se devia deixar entrar “muitas” ou “algumas” (agora são 44%); e 55% “poucas” ou “nenhumas” pessoas dos países mais pobres de fora da Europa (agora são 53%). Olhando para os números com detalhe, percebe-se que os que defendiam que “poucas” pessoas deviam poder entrar quebram 5 pontos, mas três desviam-se para o “nunca” e dois para o “algumas”.
Há, porém, mudanças que podem — se confirmadas em futuros inquéritos — ter leituras interessantes: ao contrário do que acontecia há um ano, o grau de instrução dos inquiridos deixou de ser significativo: é certo que quem tem instrução mais baixa (até ao 3º ciclo) ainda é mais negativo sobre a imigração, mas a diferença para quem tem ensino superior é agora muito curta, de apenas três pontos. Traduzindo: ter um curso superior já não parece determinante para ser mais favorável à entrada de imigrantes.
O que ainda faz alguma diferença no que respeita a atitudes face à imigração é a percepção do rendimento do inquirido (maior aceitação nos que se sentem “confortáveis” financeiramente), mas sobretudo o posicionamento político: os simpatizantes do Chega têm muito mais propensão para uma resposta negativa. E os do PS são os mais propensos a aceitar mais imigração, muito mais favoráveis do que há um ano: em 2024 defendiam maioritariamente que “poucas” pessoas deviam entrar (42%), agora são apenas 31%; há um ano 36% defendiam a entrada de “algumas pessoas”, agora são 49%.
Tal como os que se localizam à esquerda face aos de direita. Quanto aos simpatizantes da AD, estão muito mais próximos dos socialistas do que dos que votaram Chega. E continuam mais propensos à vinda de “algumas” pessoas do que de “poucas”.
Olhando para a série de perguntas realizada em dois anos, percebe-se que houve uma inversão na opinião dos portugueses sobre a imigração, mas ela recua a maio de 2023: foi aí que as curvas das opiniões mais favoráveis e menos favoráveis se inverteu, passando as negativas (“poucas pessoas” ou “ninguém”) a tornar-se maioritárias. Em outubro desse ano registou-se um pico desta tendência, com 61% de opiniões no sentido restritivo contra 37% mais favoráveis. Por coincidência, ou não, foi o pico do problema da incapacidade de regularização de imigrantes junto da AIMA.
Os 44% de opiniões positivas de agora — subida de dois pontos face há um ano — acaba por ficar em linha com o que acontecia de maio a setembro de 2023. Recorde-se que, em maio deste ano, o novo Governo de Luís Montenegro acabou com a figura jurídica da ‘manifestação de interesse’ que permitia aos imigrantes uma regularização, desde que estivessem a trabalhar em Portugal há 12 meses, reforçando os meios da AIMA para acelerar os processos e regularização em curso. A entrada (legal) em Portugal de imigrantes está travada quase em absoluto desde então.
FICHA TÉCNICA
Sondagem cujo trabalho de campo decorreu entre os dias 9 e 20 de janeiro de 2025. Foi coordenada por uma equipa do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS-ULisboa) e do Iscte - Instituto Universitário de Lisboa (Iscte-IUL), tendo o trabalho de campo sido realizado pela GfK Metris. O universo da sondagem é constituído pelos indivíduos de ambos os sexos com idade igual ou superior a 18 anos e capacidade eleitoral ativa, residentes em Portugal Continental. Os respondentes foram selecionados através do método de quotas, com base numa matriz que cruza as variáveis Sexo, Idade (4 grupos), Instrução (3 grupos), Região (7 Regiões NUTS II) e Habitat/Dimensão dos agregados populacionais (5 grupos). A partir de uma matriz inicial de Região e Habitat, foram selecionados aleatoriamente 89 pontos de amostragem onde foram realizadas as entrevistas, de acordo com as quotas acima referidas. A informação foi recolhida através de entrevista direta e pessoal na residência dos inquiridos, em sistema CAPI, e a intenção de voto em eleições legislativas recolhida através de simulação de voto em urna. Foram contactados 3039 lares elegíveis (com membros do agregado pertencentes ao universo) e obtidas 805 entrevistas válidas (taxa de resposta de 26%, taxa de cooperação de 36%). O trabalho de campo foi realizado por 38 entrevistadores, que receberam formação adequada às especificidades do estudo. Todos os resultados foram sujeitos a ponderação por pós-estratificação de acordo com a frequência de prática religiosa e a pertença a sindicatos ou associações profissionais dos cidadãos portugueses com 18 ou mais anos residentes no Continente, a partir dos dados da vaga mais recente do European Social Survey (Ronda 11). A margem de erro máxima associada a uma amostra aleatória simples de 805 inquiridos é de +/- 3,5%, com um nível de confiança de 95%. Todas as percentagens são arredondadas à unidade, podendo a sua soma ser diferente de 100% (Expresso, texto dos jornalistas David Dinis e Sofia Miguel Rosa)
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