Quando, a 26 de Janeiro, Miguel Albuquerque
anunciou a sua demissão de presidente do Governo da Madeira, tudo se conjungava
para que o PSD apresentasse um novo líder nas expectáveis futuras eleições
regionais que o Presidente da República acabou por marcar para exactos quatro
meses volvidos daquele dia. Albuquerque, arguido por suspeitas de corrupção,
resistiu, mas não sem fracturar o partido que até então tinha na mão. No PS-M,
Paulo Cafôfo, que em 2019esteve perto de conquistar o poder, também enfrenta
divisões internas. A tendência da direita deverá embalar o PSD, que pode ser
salvo no contexto pós-eleitoral pela necessidade de evitar três eleições
regionais em menos de um ano.
"Tudo vai depender da força do PSD em
termos de mandatos", afirma ao PÚBLICO a politóloga Teresa Ruel, que
rejeita um cenário de ingovernabilidade a seguir às eleições sde 26 de Maio,
apesar do desgaste associado à imagem de Miguel Albuquerque e de o processo
judicial ter levado os partidos a aumentar o tom das críticas ao líder o PSD na
Madeira.
Nas últimas semanas, por exemplo, o presidente do Chega na Madeira, Miguel Castro, tem vindo a repetir que o partido não está disponível para viabilizar um governo do PSD, em sintonia com as críticas contundentes de André Ventura a Albuquerque. Contudo, entre a retórica e a prática pode existir uma “zona cinzenta”, alerta Teresa Ruel, exemplificando com o caso dos Açores.
No arquipélago açoriano, onde também
aconteceram eleições antecipadas, a abstenção o Chega foi decisiva na aprovação
do programa do governo regional, mesmo não existindo um acordo formal e apesar
de o partido ter exigido, sem sucesso, integrar o executivo. "Nos Açores,
apesar de em termos de governabilidade não existir formalmente uma coligação,
temos o Chega a validar uma governação", compara a docente do ISCSP.
O caso da viabilização do programa do
governo açoriano — que, se não tivesse sido aprovado, implicaria a demissão do
executivo — pode ser um balão de ensaio sobre o comportamento da direita na
Madeira. A IL, que nos Açores rasgou o acordo que suportava o executivo
regional e votou contra o Orçamento para 2024, também se absteve na votação do
programa do novo governo de Bolieiro. "A IL e o Chega têm sido críticos,
mas há sempre o argumento de que acima dos partidos está a Madeira e da importância
da estabilidade".
Da parte do PSD-Madeira, tem existido uma
mudança de posição quanto à política de alianças. Se há seis meses hesitava em
relação ao Chega, Miguel Albuquerque insiste agora que não existem “linhas
vermelhas” com nenhuma força política, classificando o partido de André Ventura
como um "actor imprescindível no quadro político".
O regresso de Cafôfo
Estas eleições apanharam o PS-Madeira num
processo de reorganização, depois da saída de Sérgio Gonçalves, que perdeu as
eleições de Setembro do ano passado, e do regresso de Paulo Cafôfo, que
conseguiu o melhor resultado de sempre dos socialistas em regionais. Em 2019,
nas eleições mais renhidas da autonomia madeirense, o PSD perdeu a maioria
absoluta pela primeira vez e o PS ficou a dois deputados dos
sociais-democratas.
Se, por um lado, a candidatura de Cafofo pode acalentar a esperança de uma alternância no poder devido ao historial, por outro, também é certo que cinco anos depois o "contexto politico e partidário é completamente distinto". "Não podemos cair na falácia de que em circunstâncias diferentes o resultado será o mesmo", avisa a docente, natural da Madeira. Para já, os resultados para a Assembleia da República permitiram ao PSD cantar vitória.
Na Madeira, os sociais-democratas elegeram
três deputados e aumentaram o número devotos face a 2019 e 2022, ficando em
primeiro lugar, com 35,38%, acima do resultado nacional do partido. O PS, que
apresentou como cabeça de lista Paulo Cafofo, ficou-se pelos 19,84%, perdeu dez
mil votos e um deputado para o Chega.
Se em 2019 Cafôfo se apresentou a eleições
embalado pela presidência da Câmara do Funchal, em 2024 aparece com danos na
imagem devido à estratégia de querer conciliara candidatura à República com a
da assembleia regional. Também não caiu bem junto do eleitorado a insistência
de Cafôfo em manter-se simultaneamente como secretário de estado das
Comunidades do Governo de António Costa e líder do PS-Madeira.
Além do socialista, também existem
novidades face há seis meses na presidência do CDS-PP na Madeira, que vai a
votos sozinho pela primeira vez desde 2019 numa altura em que ainda faz parte
do executivo regional. O actual presidente da Assembleia regional, José Manuel
Rodrigues, líder dos centristas madeirenses entre 1997 e 2015, é o único
candidato à presidência do partido que corre o risco de desaparecer do
parlamento.
Os outros partidos deverão manter os rostos
das últimas eleições. No Juntos Pelo Povo (terceira força política na região)
as fracturas internas que ficaram expostas no último acto eleitoral parecem
saradas com os irmãos Élvio e Filipe Sousa a encabeçar a lista. No PAN, também
marcado por divisões, a deputada Mónica Freitas, que assegurou a manutenção de
Albuquerque no poder, vai agora a votos enquanto líder da estrutura regional.
Divisões no PS e PSD
Numa sondagem publicada no Jornal da
Madeira a 13 de Março (quando Marcelo Rebelo de Sousa ainda não tinha convocado
as eleições), o PSD elegeria 21 deputados, o PS subiria para 14, o JPP manteria
cinco, o Chega baixaria para três, os mesmos da IL (que actualmente tem um), e
PCP elegeria um parlamentar. O resultado significaria a redução de nove para
seis partidos e as saídas de CDS, PAN e BE.
"Não sabemos se é a figura de
Albuquerque que acolhe essa validação junto do eleitorado ou se é o PSD. O
próprio PS não se constitui como alternativa e quando não há alternativa a
validação do eleitorado é pelo partido que está no poder", assinala Teresa
Ruel. A professora universitária avisa que pode existir a percepção de que o
caso envolvendo o presidente do governo regional ficou "resolvido"
devido à libertação dos arguidos detidos.
Ainda assim, as divisões internas nos
sociais-democratas ameaçam condicionar a liderança do homem que governa a
Madeira desde 2015. Albuquerque voltou a ganhar as internas, convocadas com
prazos apertados, mas a corrente interna liderada por Manuel António Correia (apoiado
por Alberto João Jardim) obteve 45%dos votos e promete fazer-se ouvir
publicamente no congresso de 20 e 21 de Abril.
As divisões chegaram ao governo regional,
com exonerações de cargos públicos na Secretaria da Agricultura de apoiantes de
Manuel António Correia, notícia que marca a actualidade regional por estes
dias. Antes das internas, um discurso de Albuquerque a criticar o carácter de
algumas pessoas no interior do executivo foi interpretado como um recado aos
apoiantes do seu opositor. "Há pessoas que não têm memória por excesso de ambição,
outras vezes porque não têm consideração com o passado, portanto têm um problema
de carácter", atirou então Albuquerque, que já se veio desresponsabilizar
das exonerações.
No PS, surgiu um movimento de reflexão
interno, crítico do rumo do partido, designado por Autonomia 24. A corrente é
liderada pelo anterior líder Carlos Pereira (uma espécie de eterno rival de
Cafôfo) e conta com o ex-presidente da Câmara do Funchal Miguel Silva Gouveia,
e Liliana Rodrigues, antiga eurodeputada. Paulo Cafôfo, eleito em Dezembro, já
veio criticar a falta de coragem dos opositores: "Estar a falar demasiado
de questões internas quando essas pessoas não têm coragem de se apresentar a
eleições, nem coragem de se apresentarem em campanhas eleitorais ou eventos do
partido, é fazer um jogo que só vai beneficiar o adversário". Partidos
divididos e candidatos repetidos: está dado o mote para as regionais da
Madeira.
Calendário eleitoral
De 28 Março a 26 Maio: suspensão do
recenseamento eleitoral
15 de Abril: data-limite para a entrega das
listas
16 de Abril: sorteio da ordem das listas no
boletim de voto
Até 10 de Maio: publicação definitiva das
listas
Até 6 de ;aio: requisição do voto
antecipado
17 de Maio: votação dos estudantes no
município do estabelecimento de ensino
De 14 a 16 de Maio: votação dos deslocados
no estrangeiro
De 12 a 24 de Maio: campanha eleitoral
25 de Maio: dia de reflexão (Publico, texto do jornalista Rui Pedro Paiva)
Sem comentários:
Enviar um comentário