segunda-feira, fevereiro 25, 2013

Opinião: “Caminho perigoso”

“O espaço mediático tem tendência para fazer parecer geral aquilo que é claramente particular. As "grandoladas" são uma operação de marketing político de estilo bloquista e apenas isso. São o reflexo do combate entre uma certa elite e o Governo.
Sou um fervoroso adepto da Democracia, da que permite o protesto livre e da que garante a liberdade de expressão. Quero viver num país em que se pode cantar a Grândola como forma de protesto, mas em que até um ministro pouco popular tem direito de se expressar. O ministro Miguel Relvas só pode estar satisfeito com as consequências do silêncio a que foi forçado. Encontrou defesa em muita boa gente que até agora só o tinha criticado.
Adiante. Não, as "grandoladas" não são manifestações de revolta do povo a quem a crise colocou para lá do que pensávamos serem os limites. Revejam lá as imagens da tv (para quem todos os números são construídos). Não estão lá os operários de construção civil, sem estudos e sem emprego, nem os casais em que ambos perderam o emprego e têm filhos para criar, nem a gente dos bairros sociais que recebem cada vez menos ajudas do Estado, nem aqueles que nunca tiveram uma oportunidade e agora não têm ajuda nenhuma.
A larga maioria dos deserdados que esta crise provocou, com especial destaque para milhares de idosos e crianças com fome, não tem tempo para ensaiar cantorias. Essa maioria silenciosa não merece que a votemos ao esquecimento, acreditando que ela está representada neste teatro que serve interesses políticos de gente que, tendo todo o direito de protestar contra as opções do Governo, está a fazer isso mesmo. A lutar pelos seus interesses.
Era bom que não nos deixássemos iludir. Em sociedades com distribuição de rendimentos desiguais, essa desigualdade tende a crescer com crises profundas como a que estamos a viver. Olhando para o destaque que demos esta semana aos números ensaiados e a pouca importância que damos ao debate sobre a sociedade em que queremos viver, torna-se claro que, na melhor das hipóteses, sairemos desta crise como entrámos. O Estado que temos é pago por todos para servir preferencialmente os que, de alguma forma, dominam o espaço mediático.
Uma parte significativa dos portugueses já não vota e, acreditando que com isso está a defender os seus interesses, deixa que alguns decidam por todos. Caminhamos para um momento em que haverá menos portugueses a votar do que a abster-se e isso reforçará o poder dos lóbis. Este caminho é perigoso, porque se houver sectores da sociedade que sentem que ninguém defende os seus interesses tenderão a achar que o Estado não serve para nada e que a Democracia só serve para legitimar que alguns se apropriem dos bens que são de todos” (texto de Paulo Baldaia, DN de Lisboa, com a devida vénia)