"Há remunerações 500% acima do ordenado-base. Há médicos a receber para estar de prevenção a partir das 4 da tarde. E há custos de 7,4 milhões de euros gastos em horas extraordinárias que podiam baixar para os 4,6 milhões. Assim concluiu a Inspeção Regional de Saúde sobre o Hospital de Santo Espírito da ilha Terceira, num documento de dezembro de 2013. Os valores são maioritariamente explicados pelas regras que permitem aos médicos estar em casa de prevenção a receber ordenado. Têm direito a apenas metade do valor, mas, embora não estejam no hospital, o montante é calculado como hora extra. O resultado prático é, segundo o documento, a transformação de um salário de 1200 euros na gestão de sistemas e tecnologias de informação, por exemplo, em cinco mil euros mensais. Embora tenha analisado o pagamento de várias áreas profissionais do hospital, é entre os clínicos que os valores são mais inesperados.
"Há casos de remuneração acima da base em mais de 500%, 290%, 160 por cento", apesar de a lei determinar um terço da remuneração principal como teto máximo. Mais do que isso, lembram os inspetores, ultrapassar estes limites "obriga a prévia autorização da Secretaria Regional da Saúde". Os inspetores fizeram as contas e concluíram que o custo com pessoal por cama é de 360 euros na Terceira e de 256 euros no continente. "Os custos são superiores em 35% aos hospitais similares do Continente." Mesmo admitindo as desvantagens da insularidade os encargos com prevenções e horas extra atingiu 26% dos encargos com pessoal, enquanto nos hospitais do SNS essa despesa representa 10% os responsáveis pelo documento defendem que é possível diminuir gastos sem piorar os serviços prestados à população. "O número de profissionais do hospital permite reorganizar os horários com redução dos custos estimados", lê-se nesta análise ao hospital açoriano. O facto de haver falta de médicos na ilha contribui fortemente para o problema, já que as especialidades com apenas um clínico obrigam à figura da prevenção quase 24 horas por dia. Mas, mesmo tendo em conta essas especificidades, os inspetores consideram que há irregularidades: "Se o médico que faz prevenção sair às 12h30, esta é paga a partir dessa hora, mesmo que haja outro colega a cumprir as 12h de urgência até às 20h30, e ainda que estejam outros a TRABALHAR em horário normal no serviço." Tanto ou mais do que a despesa, o relatório critica o facto de esta não se traduzir em melhores serviços de saúde. "Entre 2001 e 2010, os custos com pessoal cresceram 38%", o número de doentes saídos do internamento aumentou 2%, enquanto o de dias de internamento baixou 11 por cento. Ou seja: "O Hospital da Terceira apresenta elevados encargos com suplementos remuneratórios, em comparação com os hospitais do SNS, sem se verificar contraprestação efetiva por parte do pessoal que aufere os suplementos. O aumento de encargos com pessoal entre 2001 e 2010 não teve origem num correspondente aumento da produção hospitalar." Aliás, a inspeção terá surgido, segundo fonte contactada pela VISÃO, devido a suspeitas de trabalho irregular. Sobretudo na obstetrícia, com 3 escalas de urgência para uma média de 2 partos por dia. Houve até anos em que o regime de prevenções chegou à estomatologia.
A oferta, a procura e a conta
As especialidades mais onerosas são as de cuidados intensivos e obstetrícia. Mas oncologia, que não é uma área de emergência, vem em quarto na lista. Uma situação já alterada, garantiu à VISÃO o secretário regional da Saúde, Luís Cabral. Nos restantes casos, as explicações vão todas dar à insularidade: "Como há poucos especialistas, a maior parte está de serviço 24 sobre 24 horas. Há especialistas únicos que temos grande dificuldade em substituir. É a lei da oferta e da procura." De tal forma que, admite Luís Cabral, "uma das formas de aliciar osmédicos são as prevenções". Embora o relatório dos inspetores tenha levado à criação de uma nova portaria (ainda não publicada) sobre os pagamentos, e apesar de o conselho de administração do Hospital da Terceira ter mudado no início do ano, Luís Cabral não acredita em alterações "substanciais" enquanto não forem contratados mais médicos, o que só deverá acontecer nos próximos três a quatro anos. Além do Hospital da Terceira, a Inspeção Regional de Saúde vai também analisar a situação na Horta e em Ponta Delgada. Embora os relatórios não estejam ainda concluídos, Paulo Jorge Gomes, inspetor regional de Saúde, garantiu à VISÃO que não são esperadas tantas irregularidades. "A equipa de auditoria que se deslocou ao Hospital da Horta não efetuou quaisquer estimativas de poupanças em trabalho extraordinário/ prevenções. Dos dados analisados, não se vislumbraram incumprimentos significativos face à legislação em vigor, nem situações de desperdício relevantes."
Sempre de serviço
As prevenções e horas extra permitem aos médicos da Terceira receber, em média, mais 130% a 140% do salário-base por mês. Há quem consiga remunerações mensais superiores a 500 por cento. Os cuidados intensivos são o caso mais gritante. Mas há outros:
20 000€
(Cuidados Intensivos)
19 000€
(Ginecologia/Obstetrícia)
17 000€
(Cardiologia)
16 500€
(Oncologia)
15 000€
(Imuno-Hemoterapia)
14 000€
(Anestesiologia)
13 500€
(Ortopedia)
13 000€
(Psiquiatria) (texto da jornalista da Visão, Isabel Nery, publicado na edição de 5 de março)
"Há casos de remuneração acima da base em mais de 500%, 290%, 160 por cento", apesar de a lei determinar um terço da remuneração principal como teto máximo. Mais do que isso, lembram os inspetores, ultrapassar estes limites "obriga a prévia autorização da Secretaria Regional da Saúde". Os inspetores fizeram as contas e concluíram que o custo com pessoal por cama é de 360 euros na Terceira e de 256 euros no continente. "Os custos são superiores em 35% aos hospitais similares do Continente." Mesmo admitindo as desvantagens da insularidade os encargos com prevenções e horas extra atingiu 26% dos encargos com pessoal, enquanto nos hospitais do SNS essa despesa representa 10% os responsáveis pelo documento defendem que é possível diminuir gastos sem piorar os serviços prestados à população. "O número de profissionais do hospital permite reorganizar os horários com redução dos custos estimados", lê-se nesta análise ao hospital açoriano. O facto de haver falta de médicos na ilha contribui fortemente para o problema, já que as especialidades com apenas um clínico obrigam à figura da prevenção quase 24 horas por dia. Mas, mesmo tendo em conta essas especificidades, os inspetores consideram que há irregularidades: "Se o médico que faz prevenção sair às 12h30, esta é paga a partir dessa hora, mesmo que haja outro colega a cumprir as 12h de urgência até às 20h30, e ainda que estejam outros a TRABALHAR em horário normal no serviço." Tanto ou mais do que a despesa, o relatório critica o facto de esta não se traduzir em melhores serviços de saúde. "Entre 2001 e 2010, os custos com pessoal cresceram 38%", o número de doentes saídos do internamento aumentou 2%, enquanto o de dias de internamento baixou 11 por cento. Ou seja: "O Hospital da Terceira apresenta elevados encargos com suplementos remuneratórios, em comparação com os hospitais do SNS, sem se verificar contraprestação efetiva por parte do pessoal que aufere os suplementos. O aumento de encargos com pessoal entre 2001 e 2010 não teve origem num correspondente aumento da produção hospitalar." Aliás, a inspeção terá surgido, segundo fonte contactada pela VISÃO, devido a suspeitas de trabalho irregular. Sobretudo na obstetrícia, com 3 escalas de urgência para uma média de 2 partos por dia. Houve até anos em que o regime de prevenções chegou à estomatologia.
A oferta, a procura e a conta
As especialidades mais onerosas são as de cuidados intensivos e obstetrícia. Mas oncologia, que não é uma área de emergência, vem em quarto na lista. Uma situação já alterada, garantiu à VISÃO o secretário regional da Saúde, Luís Cabral. Nos restantes casos, as explicações vão todas dar à insularidade: "Como há poucos especialistas, a maior parte está de serviço 24 sobre 24 horas. Há especialistas únicos que temos grande dificuldade em substituir. É a lei da oferta e da procura." De tal forma que, admite Luís Cabral, "uma das formas de aliciar osmédicos são as prevenções". Embora o relatório dos inspetores tenha levado à criação de uma nova portaria (ainda não publicada) sobre os pagamentos, e apesar de o conselho de administração do Hospital da Terceira ter mudado no início do ano, Luís Cabral não acredita em alterações "substanciais" enquanto não forem contratados mais médicos, o que só deverá acontecer nos próximos três a quatro anos. Além do Hospital da Terceira, a Inspeção Regional de Saúde vai também analisar a situação na Horta e em Ponta Delgada. Embora os relatórios não estejam ainda concluídos, Paulo Jorge Gomes, inspetor regional de Saúde, garantiu à VISÃO que não são esperadas tantas irregularidades. "A equipa de auditoria que se deslocou ao Hospital da Horta não efetuou quaisquer estimativas de poupanças em trabalho extraordinário/ prevenções. Dos dados analisados, não se vislumbraram incumprimentos significativos face à legislação em vigor, nem situações de desperdício relevantes."
Sempre de serviço
As prevenções e horas extra permitem aos médicos da Terceira receber, em média, mais 130% a 140% do salário-base por mês. Há quem consiga remunerações mensais superiores a 500 por cento. Os cuidados intensivos são o caso mais gritante. Mas há outros:
20 000€
(Cuidados Intensivos)
19 000€
(Ginecologia/Obstetrícia)
17 000€
(Cardiologia)
16 500€
(Oncologia)
15 000€
(Imuno-Hemoterapia)
14 000€
(Anestesiologia)
13 500€
(Ortopedia)
13 000€
(Psiquiatria) (texto da jornalista da Visão, Isabel Nery, publicado na edição de 5 de março)