quinta-feira, março 27, 2014

Os dois mais poderosos do mundo foram traduzidos por um monsenhor

Li no Expresso que "Barack Obama entrou sorridente, esta quinta-feira de manhã, no gabinete do Papa Francisco. Saiu sério e com ar pensativo, ao fim de 50 minutos de um encontro realizado nos palácios apostólicos, onde o pontífice não vive. As audiências habituais com os chefes de Estado costumam durar 30 minutos. Terminada a reunião, também o Papa mostrava uma cara séria, como raramente costuma acontecer. Pela primeira vez, os líderes mais poderosos do mundo, embora em âmbitos diferentes, são dois "americanos": um do Norte, outro do Sul. "Vim a Roma para ouvi-lo", dissera o presidente dos Estados Unidos, de manhã, antes da sua primeira visita a Jorge Bergoglio. É a segunda vez que se reúne com um Papa, depois de ter visitado Bento XVI em 2009. Obama quer "ouvir" o Papa, mas também procura consenso no seu país, para as eleições de "meio mandato" de novembro. O presidente precisa de conquistar o eleitorado católico. Francisco é a única referência mundial para "as periferias do mundo" e contra "a economia que cria pobreza", que Obama, por inerência do seu cargo, acaba por simbolizar de alguma forma.
O líder dos Estados Unidos conta com a aprovação de 44% da população, o valor mais baixo da sua carreira. Já Francisco é aplaudido por 88% dos norte-americanos, que lhe dedicaram as primeiras páginas dos maiores jornais do país. Está nomeado para o prémio Nobel da Paz. Parte destes mesmos católicos opõe-se à reforma da saúde de Obama, que tenta ampliar a assistência aos menos favorecidos. A oposição deve-se ao facto de essa reforma incluir os contracetivos, o aborto e formas de apoio aos casais homossexuais. "Quem sou eu para julgar um homossexual?", perguntou o Papa quando regressava de uma visita ao Brasil, causando surpresa e perplexidade dentro e fora da igreja católica.
"Longe do povo, a classe dirigente corrompe-se", disse o Papa de manhã, durante a missa privada que celebra diariamente na capela da residência de Santa Marta, onde vive, aos muitos deputados que assistiam à celebração. A seu ver, "os pecadores serão perdoados, mas os corruptos não". "O Papa desafia-nos, implora-nos que nos lembremos das pessoas, das famílias, dos pobres" e "convida-nos a refletir sobre a dignidade do homem", sublinhara Obama numa entrevista ao jornal italiano "Corriere della Sera", a única que concedeu antes de chegar ao Vaticano. O encontro entre os dois dirigentes realizou-se com a presença de dois intérpretes, um monsenhor e uma mulher. Não foi por Bergoglio não falar inglês, mas possivelmente pelo facto de a conversa entre ambos dever ser muito concreta e pormenorizada. Francisco aguardava Obama no gabinete papal com um grande caderno aberto sobre a mesa. Falaram da Ucrânia, da Rússia e da Síria, mas também da Palestina, do Irão, de África e, provavelmente, da China. O diálogo centrou-se igualmente nas desigualdades e na pobreza que assolam o mundo e as causas que as produzem.
Pouco depois de visitar o Papa, Obama e o secretário de Estado americano (equivalente a ministro dos Negócios Estrangeiros) reuniram-se com Pietro Parolin, secretário de Estado do Vaticano (uma espécie de primeiro-ministro do Papa). Este encontro foi mais concreto e os dossiês sobre a situação mundial foram revistos um a um, com maior profundidade. No final do encontro com Obama, Francisco recebeu toda a delegação que acompanhava o presidente - onze pessoas a quem o Papa apertou a mão, à vez. De seguida, os dois líderes trocaram os presentes habituais previstos pelo protocolo. Houve um momento de suspense quando umas medalhas que Obama entregava ao Papa caíram no chão, com um sonoro ruído. No final saudaram-se com um inédito aperto de mão. Inédito dada a sua duração. A visita de 36 horas de Obama a Roma prosseguiu com um almoço com o Presidente da República, Giorgio Napolitano, com quem Obama já se encontrou quatro vezes. "É um velho amigo, uma rocha de integridade e estabilidade, um sábio", disse Obama em várias ocasiões sobre Napolitano, a quem os Estados Unidos negaram, nos anos 1970, o primeiro visto que pediu para viajar para aquele país, porque era comunista. Obama reúne depois com Matteo Renzi, de 39 anos, o mais jovem primeiro-ministro de Itália. Há três dias, em Haia, o presidente americano disse-lhe: "Já começo a ter cabelo grisalho, o teu ainda é preto". Ao cair da tarde, Obama visita o Coliseu de Roma e, depois, janta num restaurante. "Gosto de comida italiana", afirmou antes da chegada a Roma".