quinta-feira, maio 07, 2020

Mais ou menos pessimistas, numa coisa as previsões convergem: teremos a pior crise desde o 25 de abril

A economia portuguesa deverá recuar quase 6,8% este ano, segundo a previsão da Comissão Europeia, o que confirma a pior recessão desde a queda da ditadura. Em contrapartida, a recuperação de quase 6% em 2021 será a mais rápida desde o 25 de abril de 1974. Que a economia portuguesa vai ter uma recessão séria este ano ninguém duvida. O que vai variando são as previsões. Mas uma coisa é certa: a quebra de 2020 vai ser a maior desde o 25 de abril, maior do que a crise de 1975. Esta quarta-feira, a Comissão Europeia foi a segunda entidade internacional a confirmá-lo, depois do Fundo Monetário Internacional. À medida que o tempo passa no ciclo da pandemia e nas medidas de combate sanitário e aos efeitos económicos e sociais da paragem imposta à actividade económica, as organizações internacionais vão avançando com as suas previsões. Em abril, o Fundo Monetário Internacional (FMI) previu uma quebra de 8% para o Produto Interno Bruto (PIB) português em 2020. Esta quarta-feira foi a vez da Comissão Europeia avançar com uma previsão menos pessimista, com uma recessão de 6,8% (o Banco de Portugal ainda não actualizou as suas de março, onde apontava para um intervalo entre 3,7% e 5,7%).

Num caso como no outro, contudo, uma coisa parece certa: a quebra é histórica, mais grave inclusive que a de 1975.
Numa perspetiva histórica mais longa, será a maior contração anual do PIB desde 1936, segundo a série de Dina Batista, Carlos Martins, Maximiano Pinheiro e Jaime Reis ("New Estimates for Portugal's GDP", Banco de Portugal, 1997, que cobre o período de 1910 a 1958), ou desde 1921, de acordo com a série de Nuno Valério ("The Concise Economic History of Portugal", Almedina, 2011) que se inicia em 1865. Em 1936, o PIB quebrou 7,6% e em 1921 afundou-se 20,6%.
A crise de 1975 levou a uma quebra de 5,1% no PIB, um recorde no pós 25 de abril que poderá ser agora batido. Mesmo a chamada grande recessão de 2009 à escala global não provocou uma quebra com a dimensão desta que está prevista, entre 6,8% e 8%, conforme se tomem em consideração as previsões da Comissão em Bruxelas ou do FMI em Washington. A queda no ano seguinte à crise financeira mundial foi de 3,1%. E os três "anos de chumbo" da crise das dívidas soberanas somaram uma quebra acumulada de 5,7% entre 2011 e 2013.
São números preocupantes, mas o gabinete de Mário Centeno apressou-se esta quarta-feira a sublinhar que a previsão de 6,8%, apesar de elevada, é "menos negativa do que a da média dos países do euro [previsão de quebra de 7,7%] ou da União Europeia [7,4%]". E até o 'tigre' irlandês vai quebrar mais, 7,9%. Aqui ao lado, na vizinha Espanha, o PIB vai cair 9,4%.
No entanto, a recuperação em 2021 vai ser mais fraca do que, no conjunto, da zona euro e da União Europeia (UE): 5,8% para Portugal face a médias de 6,3% e 6,1% respetivamente..
Portugal enfileira ao lado das sete economias do euro que vão ter uma recuperação inferior a 6% em 2021. A pior de todas vai ser a Finlândia, com um crescimento de apenas 3,7%, depois de um afundamento de 6,3% em 2020.
Na UE, duas das economias fora do euro muito citadas como de alto crescimento no quadro dos países emergentes europeus, a Polónia e a Roménia, vão crescer pouco mais de 4% em 2021, voltando, no entanto, à tendência dos últimos anos, que é incomparavelmente superior ao desempenho português na última década.
Apesar da recuperação em 2021 na economia portuguesa, a queda de 2020 não vai ser compensada. Quando se regressará ao nível de 2019 ainda não se pode projectar, pois nem o FMI nem a Comissão estendem as previsões para além do próximo ano. Não é. por isso, um ciclo em "V".
No entanto, para 'consolo', a retoma de 5,8% em 2021 vai ser a mais elevada de todas as registadas no ano seguinte à crise, desde o 25 de abril. Em 1976, o PIB cresceu 2,3%. Nos outros anos posteriores às crises de 1984, 1993, 2003, 2009 e 2011-2013, o crescimento foi muito inferior, variando num intervalo entre 0,8 (2014) e 1,8% (2004).
A recuperação em "V" só se verificou em 1985, 1994 e 2004, quando o PIB mais do que compensou a contração do ano anterior. Em 1976, 2010 e 2014 isso não se verificou. No último período longo de recessão, o PIB só ultrapassou o nível de 2008 sete anos depois, segundo a série da Pordata.
Em termos de quedas do PIB por habitante, a hierarquia sofre uma alteração no recordista, pois a quebra foi maior em 1975 (-8,6%) do que está estimada para 2020 pelo FMI (-7,9%). A redução mais elevada em 1975 deveu-se ao facto da população portuguesa ter aumentado significativamente nesse ano em virtude do regresso dos portugueses que viviam nas ex-colónias (Expresso, texto do jornalista JORGE NASCIMENTO RODRIGUES e corrigido nasdimensões das quedas do PIB nas crises de 1975 a 2013)

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