terça-feira, agosto 11, 2015

Madeira: início de mandato aos solavancos

Em pouco mais de 100 dias como presidente do governo da Madeira, Miguel Albuquerque perdeu um secretário regional, faltou à tomada de posse de outro e viu-se na necessidade de explicar as dívidas das sociedades que gerem o seu famoso roseiral. É certo que conseguiu alargar em sete anos o prazo da amortização da dívida e garantiu mais 43 milhões de euros nas transferências do Estado, além de passagens aéreas a 86 euros. A caminho está uma descida no IRS em 2016, mas, com o histórico de promessas e tropeções, não se sabe ainda o que significará esse alívio fiscal.
O assunto é para tratar depois das férias e das eleições, lá para novembro ou dezembro, altura em que se discute o orçamento regional no Parlamento. De momento, a demissão do secretário da Saúde e a ausência do presidente na tomada de posse do novo membro do Governo dominam o debate político e até a oposição ficou surpreendida. Apresentado como independente e sem ligações a interesses privados, Manuel Brito, médico, esteve 104 dias à frente da Secretaria e até se saber que tinha quotas residuais em duas clínicas privadas.
Antes que os 0,008% que detinha nas clínicas fossem usados como argumento político, o secretário pediu a demissão e Albuquerque aceitou, sem demorar muito a escolher o sucessor. Depois, arrumou as malas para as férias no Algarve e não ficou para a tomada de posse do novo titular da pasta. Ao que parece, por sugestão do médico que, por acaso, é também o novo secretário da Saúde. A mudança fez-se sem ressentimentos, muito no estilo sem complicações do novo poder regional.
Mais ou menos como quando o deputado do PTP denunciou as dívidas das duas sociedades que gerem o famoso roseiral. Miguel Albuquerque assumiu que era verdade, que devia 117 mil euros à Empresa de Eletricidade e 45 mil à Segurança Social. O problema, explicou, é que as suas empresas atravessaram as mesmas dificuldades da grande maioria das sociedades comerciais na Madeira nos últimos anos. E também garantiu que existia já uma administradora nomeada para regularizar as dívidas.
QUERER MUDAR TUDO E NÃO MUDAR NADA
As atribulações começaram antes da tomada de posse a 20 de abril. Primeiro anunciou um governo ao estilo americano, em que todos os membros entravam com ele e saíam quando deixasse a Quinta Vigia. As direções regionais seriam trocadas por subsecretarias, mas depressa a ideia esbarrou na máquina da administração pública. Não seria assim tão simples extinguir as direções e o assunto morreu. O novo governo fez-se com secretários e diretores regionais, seguindo o modelo deixado por Jardim.
Depois da orgânica, vieram as escolhas e, conhecidos os oito secretários, foi gritante a ausência de Pedro Calado, antigo vice-presidente da Câmara do Funchal, o homem que todos davam como certo na pasta das Finanças e como número dois do governo regional. O desentendimento entre ambos nunca foi esclarecido, não se percebeu o que se passou na véspera do anúncio do governo, mas apenas que Calado saiu e as Finanças passaram para Rui Gonçalves, o único elemento a transitar do anterior Governo.
O rumor de que tinha sido cedência a Lisboa não caiu bem, mas Miguel Albuquerque tinha acabado de chegar e, no discurso da tomada de posse, prometeu firmeza perante os interesses instalados. Na primeira reunião do conselho de governo, ficou decidido vender em hasta pública as casas de Porto Santo, aquelas onde Jardim passava as férias de agosto. Novo tropeção. Três meses depois não só não há interessados na compra, como já não se sabe se é possível vender. As duas casas, que ficam junto à praia, nunca foram registadas como propriedade regional. O melhor que se poderá fazer é uma concessão a privados.
Em maio foi apresentado o programa de Governo e o documento, aprovado na Assembleia Legislativa, era vago sobretudo para questões concretas como o “Jornal da Madeira”, jornal público e da Diocese do Funchal, de distribuição gratuita e com um passivo de 52 milhões, dos quais nove são dívida financeira. A oposição esperava uma solução drástica, mas o Executivo não quis assumir a responsabilidade de encerrar uma empresa e mandar para o desemprego 50 pessoas. O jornal vai continuar a funcionar com financiamento público e a ideia é privatizar no fim de 2016, após um saneamento às contas e um novo projeto editorial.
Não muda muito, pelo menos por enquanto, mas essa é quase uma marca. Foi mais ou menos assim no caso do aval de 10 milhões de euros ao Marítimo para a construção do estádio dos Barreiros. Primeiro, soube-se que este aval, dado nos últimos dias de governação de Alberto João Jardim, fora suspenso para depois se perceber que, afinal, as obras não podiam parar outra vez. Já não há aval de 10 milhões, mas contratos de 2,5 milhões de euros em quatro anos. O que, somado, dá... 10 milhões.
Por fim, Albuquerque decidiu renovar toda a lista de candidatos à Assembleia da República. Nem Guilherme Silva ficou. O plano era candidatar Miguel Sousa, pai da proposta da criação do regime fiscal regional, mas o histórico do PSD não aceitou e deixou o presidente em maus lençóis. Em recurso, foi buscar a nova geração do partido e colocou à frente duas mulheres: Sara Madruga e Rubina Berardo. A 4 de outubro se saberá os reais impactos das hesitações, recuos, cedências e atrapalhações do novo presidente como a que levou ao cancelamento de uma reunião do Conselho de Governo em junho por falta de quórum. Só estavam na Madeira quatro secretários, os outros estavam fora, em viagens de trabalho (Expresso, texto da jornalista Marta Caires, com a devida vénia)

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