Pouco
mais de um mês depois de o Novo Banco ter nascido, Vítor Bento e a sua equipa
viram-se perante uma situação ainda mais difícil do que imaginavam quando foram
convidados em julho para liderar o velho BES. Depois de alguns contactos
ligados ao processo, o Observador faz a síntese do problema, aos olhos de quem
agora sai – mas cruzando argumentos com outros envolvidos no processo. Aqui
fica uma síntese em pontos.
· Um mandato radicalmente diferente. Quando foi
convidado em julho para presidir ao novo Conselho de Administração do BES,
Vítor Bento tinha como objetivo recuperar um banco em crise, mas com rácios de
solvabilidade suficientes para se montar uma estratégia de recuperação.
Incluindo a entrada de novos parceiros, num aumento de capital necessário. As
contas fechadas do primeiro semestre deitaram por terra esta expetativa. O
Banco de Portugal viu-se obrigado a intervir e criou o Novo Banco, uma
instituição sem os ativos tóxicos, mas no limbo – com o objetivo final de uma
venda e financiada pela concorrência. Logo à partida, porém, Vítor Bento mostrou
resistências ao mandato que lhe foi imposto: queria cinco anos para pôr em
prática o seu projeto para o Novo Banco. Não o conseguiu. Ficou cedo claro que
havia entre a administração e o Banco de Portugal e Governo uma divergência de
modelo e de estratégia.
· De mãos atadas. Diz quem trabalhou no banco neste
tempo que, sendo um banco de transição, o Novo Banco não pode dar um passo sem
consultar (e sem ter a autorização escrita e formal) do Banco de Portugal. A
pressão dos clientes para que se desbloqueassem problemas, mas também dos media
– com notícias a cada dia sobre os mais variados ângulos e problemas, tornaram
a pressão altíssima, sem que a administração sentisse ter os instrumentos para
resolver em devido tempo. O Novo Banco acabou, em suma, paralisado pela
situação (e com um mandato muito indefinido). Mas há outro lado nesta história:
quem conte que em várias matérias, como a venda de ativos, a administração do
Novo Banco não quisesse dar um passo sem que o banco central o autorizasse.
Passando o ónus, a responsabilidade, para o regulador.
·
Pequenos grandes problemas, como o papel comercial.
Tornou-se um dos exemplos mais notórios da dificuldade do Novo Banco em
resolver problemas pendentes com a separação do BES. O papel comercial do Grupo
Espírito Santo vendido a clientes nos balcões do BES continua sem resolução. O
Banco de Portugal passou a bola para o banco, Vítor Bento apresentou algumas
soluções possíveis para o pagamento aos clientes (uma das quais a sua
transformação em depósitos), mas o regulador pediu os inventários, para evitar
riscos. Só na semana passada, soube o Observador, se chegou a um consenso —
sendo a solução mais provável precisamente a dos depósitos. Mas nada se faz sem
a assinatura do Banco de Portugal e essa ainda não está no papel. A outra
versão é esta: na deliberação de 14 de agosto o Banco de Portugal foi claro na
ordem: a solução a que o banco chegasse não podia ter impactos negativos nas
contas do banco, leia-se, nos rácios de capital. Sob pena de prejudicar toda a
estratégia montada para a venda (e a própria estabilidade do banco).
· Pressão para vender — e dois poderes a quem reportar.
Desde cedo que o Banco de Portugal deixou claro ter prioridade numa venda
rápida do banco. Mas, não sendo essa a sua missão natural, e tendo ainda que
coordenar os passos com o Governo (cujo empréstimo financiou toda a operação de
salvamento do banco), há quem no Novo Banco sinta que o processo tem sido menos
linear do que devia. Sobretudo quando Vítor Bento, José Honório e João Moreira
Rato tentavam preparar um plano de médio prazo, que procurasse dar outras
garantias aos potenciais interessados. Banco de Portugal e Governo têm outro
entendimento: o de que só vendendo rapidamente é possível preservar os ativos e
dar estabilidade à instituição.
·Contas incertas, calendário difícil. A resistência da
equipa de Vítor Bento numa venda rápida prendia-se com isso: a necessidade de
tempo para consolidar o Novo Banco, de forma a garantir um bom preço de venda
final (e a solidez do próprio banco). Foi pedido à McKinsey um plano
estratégico há 10 dias, que demorará mais de um mês a ser apresentado; Foi
pedido à PricewaterHouseCoopers que auditasse o balanço provisório (sem o qual
se crê que seja difícil avançar com a venda), um relatório que não chega antes
de outubro; e ainda ao Deutsche Bank para que fizesse a avaliação dos ativos, o
que só começou a ser feito a 12 de agosto, depois de o Banco de Portugal ter
fechado o perímetro do Novo Banco. Aqui se metem problemas como o do BES
Angola, cujas imparidades deixaram de estar garantidas pelo Governo de José
Eduardo do Santos. Tudo isto demorará tempo a ser entregue e esclarecido. Mas,
entretanto, o Banco de Portugal contratou o BNP Paribas para obter um plano de
venda do banco (que tanto pode ser em bloco, como não). A notícia desta semana,
do Diário Económico, de que o regulador pediu esse plano já para o final deste
mês surpreendeu uma vez mais a equipa de Vítor Bento.
Com
tudo isto, sobram muitas dúvidas e problemas para a próxima administração.
Começando por se saber se os restantes membros nomeados para a administração do
banco se mantêm em funções ou se Carlos Costa terá mais pessoas para substituir
(texto do Observador com a devida vénia)