“Marcelo Rebelo de Sousa diz que o primeiro-ministro tem um discurso de
fim de ciclo, como se não tivesse mais nada para fazer. Passos Coelho
demonstra, explica o comentador, um espírito de "missão cumprida"
para com o País, uma espécie de "recuperei Portugal financeiramente, fiz o
que tinha a fazer, fui um ciclo". Mas o chefe de Governo não concorda.
"Estamos ainda a meio do que precisamos de fazer. Tenho uma noção
clara que o caminho que percorremos até hoje foi o indispensável para lançar as
bases de um País novo", admitiu Pedro Passos Coelho na Festa do Pontal.
"Mas ainda temos muito que fazer para poder dizer aos portugueses
que temos uma economia a crescer sustentadamente e um país que pode viver sem
problemas no seio da zona euro entre aqueles que, como nós, lutam por uma
Europa com mais progresso, menos desemprego e mais justiça social".
Afinal, que planos ainda tem o Governo para 2015?
1. Reforma do Estado
Este dossiê é umas das prioridades do Executivo, mas o primeiro-ministro
não garante que o consiga encerrar antes das legislativas. O objetivo é acabar
com as "estruturas anacrónicas", que impediram o País de crescer, e
fazer renascer um Estado mais eficiente, moderno e magro. Parece fácil, mas,
diz Passos Coelho, "andamos quase há dois anos e não o conseguimos
encerrar, porque há sempre expedientes administrativos e jurisdicionais que o
impedem". Se a reforma não for concluída, "o próximo Governo não pode
deixar de atribuir uma prioridade muito grande a essa área", disse Passos
Coelho, recentemente. "Nós sabemos que o Estado ainda precisa de muita atenção.
Há muitas matérias ainda hoje que não fazem perder cabelo só a mim". A
execução orçamental está aí para o comprovar, com a despesa pública sempre a
crescer.
2. Programa Aproximar e descentralização
A reorganização dos serviços da Administração Pública (AP), cujo pilar
mais importante é o da descentralização, dá pelo nome de Programa Aproximar.
Essa é uma das áreas a que o primeiro-ministro fez referência nos últimos
discursos. "Há matérias que não se justifica que estejam à mercê dos
ministros ou secretários de estado" e que "precisam - rapidamente -
de passar para as autarquias locais ou para as Comunidades Intermunicipais ou
Urbanas", explicou Passos Coelho, na Festa do Pontal. O Aproximar é
tutelado por Miguel Poiares Maduro e vai avançar, sob a forma de
projeto-piloto, nas comunidades intermunicipais de Leiria, Viseu Dão Lafões,
Oeste e Alto Tâmega. O programa destina-se, entre outras coisas, a reorganizar
os serviços atendimento da AP, juntando-os, sempre que possível, em lojas do
cidadão.
3. Contrato de Concessão da RTP
Em abril deste ano, o ministro Miguel Poiares Maduro dizia: "Tudo
aquilo que defini como fundamental para o futuro do serviço público de rádio e
televisão está a avançar". Mas o processo, que começou por ter no
horizonte a privatização da RTP e afins e acabou por definir um contrato de
concessão para os próximos 16 anos, não está concluído. As mudanças continuarão
em 2015, entre elas a criação de um ecossistema de indústrias criativas e de
inovação tecnológica no setor audiovisual e a definição do futuro dos centros
regionais dos Açores e da Madeira. O essencial, que é a assinatura do novo
contrato de concessão, também ainda não se concretizou.
4. Concessão dos transportes públicos
Revolucionar as empresas públicas de transporte, deixando de
"investir" tanto dinheiro e recursos do Estado nessa área, através
das indemnizações compensatórias, era um dos objetivos do Governo. Nos últimos
três anos foram ensaiadas várias soluções, mas só recentemente o secretário de
Estado dos Transportes, Sérgio Monteiro, anunciou a concessão a privados da
Metropolitano de Lisboa, da Carris, da Linha de Cascais da CP, da Transtejo, do
Metro do Porto e da Sociedade de Transportes Colectivos do Porto. Este foi o
primeiro passo na reforma acordada com a troika e pressupõe que o Estado
mantenha a posse dos equipamentos, permitindo a exploração do serviço por parte
de entidades privadas (a Câmara do Porto também se mostrou disponível para
entrar na corrida), durante oito anos.
5. Redução da taxa de desemprego
É uma das marcas que este Executivo deixa no mercado de trabalho: a taxa
de desemprego, que rondava os 12,1% no segundo trimestre de 2011, quando Passos
Coelho tomou posse, chegou aos 17,7% dois anos depois. Hoje, situa-se nos 13,9%,
o que tem sido encarado como um sinal positivo para a economia portuguesa. O
ministro da Economia, Pires de Lima, reagiu aos números dizendo que o Governo
tem "perfeita consciência e sensibilidade social para perceber que, apesar
da enorme melhoria que existiu ao longo do último ano, há muitas pessoas em
Portugal que querem trabalhar e continuam sem encontrar emprego", ficando
diminuídas numa "parte muito importante da sua dignidade". Descer
esta taxa continua a ser um objetivo até às eleições.
6. Défice de 2,5%
Que não haja ilusões: com ou sem troika - e ela estará cá em outubro
para acompanhar o período pós-memorando - o Governo continua obcecado com o
défice. Em 2015, é preciso baixá-lo de 4 para 2,5%, o que implicará cortes
adicionais superiores a dois mil milhões de euros. Acresce que o Governo
precisa ainda de compensar "as decisões que o Tribunal Constitucional
adotou em matéria de sustentabilidade da Segurança Social", previstas para
o próximo ano. Assim sendo, o que podem esperar os portugueses para 2015?
"Era muito fácil dizer 'não há aumentos de quaisquer impostos'. Mas não
sei se é possível ou não é possível. O que sei é que o Governo não tem nenhuma
vontade de aumentar impostos. Se o fizermos, é porque não há outra
possibilidade de atingirmos as nossas metas", disse o primeiro-ministro,
em Valpaços. Novidades concretas só depois de 15 de outubro, data em que o novo
Orçamento do Estado (OE) estará concluído.
7. Mudanças fiscais
Em outubro de 2013, a ministra das Finanças disse: "Ainda não
tivemos condições em 2014 para baixar a carga fiscal, esperamos que no
orçamento de 2015 seja possível ter um pouco mais de folga." Maria Luís
Albuquerque adiou o alívio da carga fiscal para o ano das eleições
legislativas, o que muito agradou ao CDS. "Em 2014 começamos pelo IRC,
para atrair investimento. Em 2015 deveremos ser capazes de dar início a uma
moderação do IRS", assumiu Paulo Portas em Madrid, em fevereiro deste ano.
Sendo certo que em 2015 haverá mudanças fiscais, a verdade é que nada garante
que não haja impostos a subir. Depois de Marques Mendes ter dito que o Governo
quer aumentar o IVA máximo de 23 para 24%, Passos Coelho recusou mais aumentos
de impostos "para este ano", assumindo que a meta de 4% do défice é
"alcançável" através de "alguns ajustamentos" do lado da
despesa. Em 2015 logo veremos.
8. Reforço da natalidade
Considerada uma das questões críticas da sociedade portuguesa, a
natalidade está na agenda do Governo. Enquanto líder do PSD, Passos Coelho
encomendou um estudo para saber como pode pôr os portugueses a terem mais bebés
e agora tem muitas ideias para implementar, mas pouco tempo para o fazer. O
relatório produzido pelo grupo de estudos liderado por Joaquim Azevedo, a
convite do primeiro-ministro, fez sugestões como: redução de impostos,
consoante o número de filhos (IRS e IMI); deduções à coleta para avós (despesas
de saúde e educação); apoio à contratação de grávidas (isenção de TSU);
flexibilização dos horários e preços das creches; part-time de um ano após o
parto, pago na íntegra; tarifas familiares de água, resíduos e saneamento;
médico de família obrigatório para grávidas; criação do Portal Família, etc.
9. Pacto em matéria de Segurança Social
"Quero aqui garantir que, como primeiro-ministro, não farei mais
nenhuma proposta para reformar a Segurança Social até às eleições de
2015", anunciou Passos Coelho, na Quarteira. "Está na altura de dizer
ao PS que estamos disponíveis, antes das eleições, para firmar uma reforma da
Segurança Social que tenha o contributo do PS, dado que este é um problema
nacional", acrescentou. O primeiro-ministro assumiu que não conseguiu
resolver a questão da sustentabilidade da Segurança Social e que o problema
persiste. "Se o não resolvermos, o que está em causa num futuro próximo é
a capacidade do Estado assegurar as pensões daqueles que as precisam de
receber", concluiu. O apelo a um pacto de regime no sentido de levar a
cabo a reforma deste setor não teve eco em nenhum dos dois candidatos à
liderança do PS” (texto da jornalista da Visão, Sónia Sapage, com a devida vénia)