segunda-feira, abril 27, 2020

Nota: a lenta, complexa (e ainda uma incógnita) retoma do turismo

Eu acho que estão todos a cometer um erro primário grave quando falam na recuperação do turismo: e as pessoas? Não contam? Não são elas que decidem? Não elas os clientes do turismo? Quem as convence a viajar de novo? Quem as convence a ficar em alojamentos turísticos ou unidades hoteleiras? Quem lhes transmite confiança e como? Quem as obriga a consumirem refeições em restaurantes? Quem as obriga a utilizarem os serviços que existem no âmbito do turismo? E qual a rentabilidade dos negócios depois do impacto das novas medidas de prevenção que terão de ser adoptadas, para as empresas? Que investimentos terão de ser feitos para garantir o cumprimento dessas regras sociais que perdurarão até que o acesso a uma vacina esteja garantido e seja generalizado? Quanto a isso não há programa que valha. Tudo depende de uma opção pessoal e da garantia de que não há perigo para a sua saúde e da sua família. O resto são conversas da treta. E o que é grave é que as pessoas sabem disso. E deliberadamente omitem essa realidade, esses constrangimentos, no fundo o busílis de tudo o que vai acontecer a partir de agora no turismo.

E os turistas vão chegar como? De avião? Com que regras, quer durante a viagem quer à chegada aos aeroportos dos destinos que dificilmente deixarão de manter rigorosas medidas de controlo de passageiros e bagagens? E pagando quanto pela viagem, já que parece ser inevitável que as companhias aéreas terão que tomar novas medidas de distanciamento, entre outras, no interior dos aparelhos diminuindo a oferta de lugares em cada ligação e aumentando inevitavelmente os custos das passagens aéreas. Estarão os turistas disponíveis para pagar esses novos valores, reduzindo substancialmente os seus orçamentos para férias? As denominadas companhias aéreas low-cost - que já se mostraram renitentes em adoptar algumas das medidas previsíveis - vão continuar, terão clientes e viabilidade, farão sentido se forem obrigadas a reduzir em 30 ou 40% a sua oferta de lugares em cada ligação?
Como se constata, são mais as perguntas e as dúvidas, do que certezas e as respostas. E isso não é positivo, nada mesmo.
Obviamente que queremos o turismo a retomar a normalidade rapidamente, é a nossa principal actividade económica, e tem um peso preponderante no emprego. Mas esse desejo do sector, esse nosso desejo pessoal, nada tem a ver com aspectos que a montante e a jusante, hoje se colocam de forma mais premente, mas que antes nunca se colocaram com esta pertinência.
Não sou especialista nesta matéria, nem quero ser. Acho que há pessoas e pensantes suficientes para considerarem todos estes itens, serem realistas, pragmáticos e positivos, e não apenas advogarem cenários que sabem não serem realistas, pelo menos nos tempos mais próximos. O horizonte será sempre 2021, nunca 2020. Tudo depende de cenários, que a indústria não controla, que podem demorar muito mais tempo a se normalizarem, mais do que se quer e deseja. Porque tudo tem a ver com uma questão importante, diria a mais importante e decisiva de todas, e relativamente à qual ninguém tem qualquer poder de manipulação: a vontade de cada um dos potenciais turistas em voltar a viajar como antes fazia, a recuperação da sua confiança, o interiorizar de que apesar de não haver agora uma vacina nem qualquer medicamento que combata o vírus - que vai continuar entre nós por muito mais tempo - não corre riscos e tem plena garantia de que nada lhe acontecerá. Tenho muitas dúvidas quanto a isso, assim como duvido que, quando essa recuperação der os primeiros passos, que os turistas arrisquem mais, como antes faziam, em procurar serviços, incluindo refeições, fora do conforto dos serviços propiciados pelos hotéis, que terão que passar por uma mudança muito grande, desde os preços ao conteúdo da oferta, passando pela funcionalidade a eles associadas. Ou seja, os restaurantes terão também um papel ingrato de ir ao encontro de clientes de uma forma que antes não faziam e de estarem pressionados pela concorrência inesperada dos hotéis que vão legitimamente fazer tudo para cativarem os clientes a permanecerem no seu interior e desfrutarem dos serviços propiciados aos hóspedes, incluindo nas refeições. O mesmo se passará com todas as empresas de serviços elencados ao turismo, incluindo passeios, actividades náuticas, os prestadores de serviços no quadro da animação nos hotéis, empresas essas, todas, sem excepção, que passarão a ter que cumprir regras que a seu tempo ficaremos a conhecer.
Ou seja, a minha pergunta – de um não especialista na temática mas de alguém que tem uma opinião pessoal que por isso mesmo vale o que vale - é apenas uma: como vai o turismo adaptar-se, com que sucesso e que celeridade, desde as companhias aéreas, aos hotéis, passando pelos restaurantes e empresas prestadoras de serviços, a uma nova realidade marcada pela presença do cpovid19 nas nossas vidas, no nosso quotidiano colectivo e pelo uso de rigorosas e novas medidas de prevenção social que vão implicar fiscalização reforçada? (LFM)

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