segunda-feira, setembro 22, 2014

Sabe se há mais empresas a fechar do que a abrir? E qual é o perfil das novas empresas?

"Nos primeiros 180 dias deste ano, entre o início de janeiro e o fim de junho, nasceram menos empresas que no mesmo período do ano passado. Foram cerca de 19 mil, menos 5,2% do que em 2013. Ainda assim, também fecharam menos que no primeiro semestre de 2013 e o número de novas empresas superou o número de encerramentos, de acordo com os dados do barómetro da Informa D&B.
Sobreviver mais do que cinco anos no mercado é uma tarefa árdua. Em Portugal, "as empresas têm uma mortalidade enorme, muitas nem chegam sequer aos cinco anos de vida", explica ao Expresso Daniel Bessa, diretor-geral da COTEC Portugal - Associação Empresarial para a Inovação.
Nesses mesmos 180 dias, comparando com o mesmo período do ano passado, a quebra nos encerramentos foi de 15,3%, com 6119 empresas a fecharem as portas, refletindo assim a tendência que já se fazia sentir desde 2013. O mesmo se verificou com as insolvências - registaram-se 2.534, menos 17,1% que no primeiro semestre do ano passado. O Processo Especial de Revitalização (PER), que é um plano de auxílio para as empresas que se encontrem em risco de insolvência ou em situação económica precária, foi requerido por 446 empresas, refletindo uma descida de 12,4% face às 509 empresas que recorreram a este mecanismo no mesmo semestre do ano passado.
Quando se analisa estes números, pode concluir-se que há então menos empresas a nascer e menos a fechar? "Estes números semestrais são erráticos e voláteis. Foram criadas menos empresas, o que tem essencialmente que ver com o primeiro trimestre do ano, não com o segundo", explica Daniel Bessa. "Apesar destes dados, neste período de crise - nos últimos dois ou três anos - têm nascido mais empresas do que as que encerraram."
Mais empresas, mais emprego?
No primeiro semestre do ano, nasceram em média, por dia, 106 empresas e 48 fecharam ou pediram insolvência. Se abriram mais empresas do que as que fecharam, pode dizer-se que há mais emprego a ser criado do que aquele que é destruído?
"Desde o início do ano, o número de empresas que tem aberto supera o número de empresas que tem fechado", defendeu recentemente o primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, acrescentando que Portugal tem, portanto, conseguido "criar mais postos de trabalho do que aqueles que são destruídos".
Mas será mesmo assim? Daniel Bessa lembra, no entanto, que o grande problema é que "normalmente as que encerram são maiores do que as que nascem". Segundo o economista, a grande maioria das novas constituições diz respeito a microempresas, ou seja, com menos de dez trabalhadores e um volume de negócios até dois milhões de euros. "É por isso que o emprego se comporta assim", uma vez que as empresas criadas não geram um grande número de postos de trabalho.
Há ainda outro motivo. A esperança de vida de muitas destas empresas não passa, normalmente, dos cinco anos, explica. "Em dez anos, dos poucos projetos que acompanhámos (120), estarão no mercado 12. O número de partos [a longo prazo] é muito reduzido."
Quando olhamos para a constituição das empresas em função da sua forma jurídica conclui-se que nasceram menos sociedades unipessoais (-11,7%), ao contrário das sociedades por quotas (+2,6%) e anónimas (+10,2%), tendencialmente maiores.
No entanto, não é seguro afirmar que foram criadas mais empresas com um maior volume de negócios e mais postos de trabalho, explica Daniel Bessa. As duas últimas não são necessariamente empresas de grande dimensão, uma vez que as sociedades por quotas são normalmente "muito pequenas", constituindo uma alternativa às unipessoais, que "caíram em desuso" pelos riscos que "podem trazer ao património pessoal e familiar". Ou seja, se a empresa fosse à falência, "seriam os ordenados das famílias responsáveis por colmatar as dívidas", o que não acontece nas empresas por quotas. Desta forma, o aumento de sociedades por quotas não reflete necessariamente a criação de um maior nível de emprego, conclui Daniel Bessa.
As novas empresas, por região e setor
Em todos os setores, os nascimentos superaram os encerramentos, exceto na indústria extrativa, onde os números são iguais. A principal razão está relacionada com o facto de este ser "um setor mais pesado, onde se torna mais difícil abrir uma empresa, uma vez que exige mais dinheiro e maior investimento".
Já no caso da agricultura ou do setor imobiliário, isso é mais fácil. No primeiro caso, "o acesso à terra é mais simples" e no segundo os custos de lançamento também são menores. "É preciso pouco mais do que um número de telefone", aponta Daniel Bessa. Este foi, aliás, o sector que mais cresceu (30% acima do primeiro semestre do ano anterior). O economista relativiza o peso dos "vistos gold" na criação de imobiliárias. "É um negócio de grandes números, mais em dinheiro do que em número de transações, ou seja, não ajuda a criar tantas empresas nem a empregar muitas pessoas".
Os serviços e o retalho foram as áreas em que mais empresas fecharam, ainda que em menor número que no ano anterior.
Olhando para o mapa de Portugal, descobre-se que foi nos maiores distritos que abriram mais empresas, tanto em número absoluto como em comparação com as que encerraram neste semestre. Os destaques vão para Lisboa, Porto e Braga. "Numa série de distritos do interior, como Beja ou Bragança, os nascimentos também foram superiores às perdas", realça o director-geral da COTEC. "A crise é menos sentida no interior do que no litoral. O primeiro já está tão mais deprimido que o litoral que a crise não se faz sentir tanto, resistindo melhor" aos encerramentos e insolvências.
Para encontrarmos a região com o maior crescimento do tecido empresarial, face ao ano anterior, é preciso viajar até à Horta, nos Açores. "O turismo da natureza é um nicho, de pequena escala, mas que pode contribuir para facilitar o crescimento da região", acrescenta Daniel Bessa, sublinhando que mesmo assim os Açores não criam muitas empresas, "o que surpreende".
A pedra-de-toque entre o sucesso e o insucesso das empresas pode ser encontrada no empreendedorismo. Mas a palavra, por si só, não explica o seu êxito, explica Daniel Bessa. "Alguns dos países mais empreendedores do mundo são os mais pobres", sublinha. "Pessoas nas ruas a vender sapatos, cervejas, apitos... São empreendedores num sentido de 'desenrasca' e de luta pela sobrevivência." Assim, a diferença entre o sucesso e o insucesso está, entre outros aspetos, "no grau de qualificação" e na "sofisticação desse empreendedorismo" (texto das jornalistas do Expresso, Raquel Albuquerque e Maria João Bourbon, com a devida vénia)