quarta-feira, outubro 17, 2012

Guia para ler o Orçamento do Estado de 2013

"O documento central de planeamento financeiro do Estado tem centenas de páginas. O Negócios concentra o essencial em cinco quadros e um glossário. O documento central de planeamento financeiro do Estado tem centenas de páginas e 21 mapas de receitas e despesas. Eis os cinco quadros essenciais que deverá ver para ter uma ideia das contas públicas. E o glossário para que não haja dúvidas. Consulte o glossário e as tabelas, que seguem em baixo.
Glossário
Saldo Orçamental global - Diferença entre receitas e despesas das Administrações Públicas. Se for negativo, é um défice. Se por positivo é um superavit. Surge muitas vezes medido em percentagem do PIB. O mais relevante é o saldo calculado na óptica da contabilidade nacional.
Saldo orçamental primário - Mede a diferença entre receitas e despesas, excluindo os juros. É usado para medir a condução da política orçamental sem o efeito da factura da dívida, a qual depende de decisões passadas e das taxas de juro (variáveis que o Governo não controla).
Saldo Orçamental estrutural - Mede o desequilíbrio entre receitas e despesas, mas exclui o impacto de receitas extraordinárias (como concessões, transferências de fundos de pensões, etc.) e o impacto do ciclo económico (isto é, tenta expurgar o efeito das recessões ou das expansões económicas nas receitas e despesas do Estado). É um indicador mais subjectivo, mas muito usado para medir o esforço efectivo de consolidação orçamental.
Contabilidade pública e nacional - A contabilidade pública mede a realidade financeira numa lógica de caixa, isto é, dinheiro que entra e sai dos cofres públicas. A contabilidade nacional analisa as contas públicas numa lógica de compromissos: se um serviço assumir uma despesa e ficar em divida, essa responsabilidade é contabilizada no défice do ano.
Programa de assistência económica e financeira - Também conhecido como PAEF, este é o conjunto de regras e metas estabelecidas no memorando de entendimento assinado com a troika em troco de financiamento. O programa dura até 2014 e inclui um pacote total de financiamento de 78 mil milhões de euros.
Administrações Públicas - As "AP" são a máquina pública considerada para cálculo do défice orçamental: a Administração Central, que inclui Estado e Serviços e Fundos Autónomos (organismos com autonomia administrativa e financeira - essencialmente institutos públicos), as administrações Local e Regional e a Segurança Social. De fora fica apenas a parte do Sector Empresarial do Estado (SEE) que apresenta resultados financeiros sustentáveis e obtém pelo menos metade das suas receitas através da venda de bens e serviços.
Sector Empresarial do Estado - O SEE inclui a totalidade das empresas públicas. Algumas contam para o cálculo do défice orçamental e, desde a intervenção da troika, até se regem pelas mesmas regras que o Serviços e Fundos Autónomos (chamam-se empresas públicas reclassificadas). Outras empresas permanecem fora do perímetro das Administrações Públicas: são as que conseguem gerar por si metade das suas receitas e apresentam uma situação financeira sustentável.
Dotações de capital - Transferências do Orçamento do Estado para as empresas públicas.
Transferências entre subsectores - Transferências entre os vários subsectores das AP. As mais relevantes são as do Estado para a Segurança Social e para o SNS (juridicamente o SNS, assim como a ADSE ou a CGA, são Serviços e Fundos Autónomos)
Dotação provisional - Despesa inscrita no Orçamento sem fim definido. Trata-se de uma almofada.
Cativações - Parte da despesa aprovada pelo Parlamento para os serviços fica a depender da aprovação explícita do ministro das Finanças durante ano. Chamam-se cativações e servem de margem de segurança ao OE.
A previsão que mais tem chamado a atenção no cenário macroeconómico é a de que a economia portuguesa contraia apenas 1% em 2013. Isto apesar do forte choque recessivo a que vai estar sujeita com o objectivo de reduzir o défice orçamental em 2013, com especial enfoque num aumento significativo do IRS. Segundo o Governo, a procura interna – consumos privado e público e investimento – reduzir-se-á entre 2,2% e 4,2%: menos que este ano, mas completando vários anos no vermelho. A evitar uma queda maior do PIB está, na expectativa do Executivo, um abrandamento moderado das exportações, que deverão crescer 3,6%, e uma queda de 1,4% nas importações. É neste contexto de mais exportações e menos importações (deprimidas pela procura interna) que o Orçamento do Estado aponta para que, pela primeira vez pelo menos desde 1995, o país registe um “superavit” externo de 1% do PIB. A queda da actividade económica tornará inevitável uma subida da taxa de desemprego, que o Executivo e a troika esperam que fique pelos 16,4%, como resultado da destruição de 1,7% dos postos de trabalho existentes em Portugal este ano.

Para reduzir o défice orçamental de cerca de 6% do PIB (sem receitas extraordinárias) em 2012 para 4,5% do PIB em 2013 o Governo necessita de recorrer a um aumento inédito da receita de IRS: 30,7% num só ano, o que resulta do aumento da taxa média efectiva deste imposto de 9,8% para 13,2% através de várias alterações neste impostos – essencialmente a redução do número de escalões, menos deduções e a aplicação de uma sobretaxa de 4% sobre todas os rendimentos, mas também de um aumento da taxa que tributa rendimentos de rendas e mais mais-valias. Só o IRS renderá mais 2,8 mil milhões de euros nas contas do Ministério das Finanças. O aumento total da receita fiscal do Estado (que não inclui IMI e IMT) será de 3,3 mil milhões de euros, lê-se na proposta da Orçamento, para o que contribuem ainda o IRC, o IVA e o Impostos de Selo.
O evolução da despesa este ano está condicionada pela devolução de um salário aos funcionários públicos e de 1,1 salários aos pensionistas (que ainda assim, mantém a perda da restante parte dos dois salários sacrificados em 2012). Mesmo com este efeito, o Governo espera cortar em 1,5% a despesa total do subsector Estado para um total de 48.199 milhões de euros. Esta é uma parte significativa da despesa pública, mas não é o seu todo, visto não estarem consideradas aqui as despesas dos Serviços e Fundos Autónomos, da Segurança Social e das Administrações Local e Regional (o financiamento que recebem do Estado está incluído na rubrica transferências entre administrações que caem 3,7% ou 165 milhões para os 4.236 milhões de euros). A queda de 1,5% da despesa do Subsector Estado é explicada por um recuo de 6% e 12% nas funções sociais e nas funções económicas económicas, respectivamente. As despesas com funções de soberania e a destinada a outras funções (onde se inclui a gestão da dívida pública) aumentam.
Feitas as contas às despesas e receitas, quanto dinheiro mais é que Portugal precisará em 2013? Segundo as contas do Executivo a resposta são 11,5 mil milhões de euros em termos líquidos. Estas necessidades líquidas de financiamento (NLF) resultam de três parcelas: 6,9 mil milhões de défice público do subsector Estado, 5,5 mil milhões da aquisição de activos financeiros, onde se incluíram em 2012 despesas como empréstimos a empresas públicas e a recapitalização da CGD. O encaixe com privatizações em 2013 aliviará esta factura em mil milhões de euros. Mas as necessidade de financiamento do Estado não se esgotam aqui. Para o ano, além das NLF, será preciso financiar e pagar a dívida pública que vence em 2013: são 28,7 mil milhões de euros, dos quais 22 mil milhões correspondem a bilhetes do Tesouro, o que faz subir as necessidades brutas de financiamento para 40,3 mil milhões. O financiamento total as necessidades será feito com 40,8 mil milhões de euros de nova dívida, e 7,5 mil milhões emprestados pela troika que já estão em Portugal, mas que se mantêm cativos para a eventualidade de ser necessário recapitalizar entidades financeiras privadas.
O défice global das Administrações Públicas (APs) em 2013 será de 7,5 mil milhões de euros, um valor que corresponde a 4,5% do PIB esperado pelo Executivo para 2013. Este défice resulta da soma um défice de 8,2 mil milhões de euros na Administração Central (que inclui o sub-sector Estado e os Serviços e Fundos Autónomos) e de superavits de 674 milhões nas Administrações local e regional e de 41 milhões na Segurança Social. A despesa total das Administrações Públicas (APs) ascenderá 78 mil milhões de euros, o que compara com uma receita total de 70,6 mil milhões (sendo a diferença, naturalmente, o défice orçamental). Do lado da receita, os impostos indirectos são a principal rubrica, garantindo às APs um encaixe de 22,8 mil milhões de euros. Na despesa, destacam-se os gastos com pessoal (17 mil milhões) e com prestações sociais (37,6 mil milhões). Na mesma página do Orçamento (257) encontram-se as estimativas para 2012, o que permite fazer comparações entre anos” (texto de Rui Peres Jorge, Jornal de Negócios, com a devida vénia)