sábado, dezembro 22, 2007

Europa: mais um...

Miguel Monjardino, professor universitário, escreve no "Expresso" que hoje se publioa: "A União Europeia só terá hipótese de se transformar num actor de primeira grandeza na política mundial se o Tratado de Lisboa for referendado pela maioria dos eleitorados europeus. Ao longo dos últimos dez dias, os líderes e a maioria dos partidos políticos dos países europeus têm vindo a usar uma série de argumentos jurídicos e políticos para evitar submeter o tratado a um referendo. Como era de esperar, os argumentos estratégicos têm sido completamente ignorados. Escrevo como era de esperar por uma razão muito simples. Como já tive oportunidade de escrever aqui, a maioria das sociedades e governos europeus aboliu a estratégia. Paradoxalmente, a abolição da ameaça do uso ou do uso do poder militar para atingir fins políticos coincide com o aumento das ambições internas e externas da União Europeia e dos seus membros. Esta situação é surrealista. É também extremamente imprudente. Mais tarde ou mais cedo, este paradoxo dará quase de certeza origem a um desastre político. Evitar este desastre exige que as questões estratégicas sejam trazidas para a primeira linha do debate sobre o Tratado de Lisboa. O contexto político é decisivo para compreendermos o que está a acontecer. Do ponto de vista interno da União Europeia, vemos uma coisa muito curiosa. Sempre que falamos dos EUA, da China e de Moscovo falamos de coisas como “poder” e “influência.” Quando falamos de Bruxelas e das agendas e interesses dos países europeus, entramos numa espécie de nevoeiro conceptual onde estas palavras e tudo o que as rodeia desaparece misteriosamente. O problema é que palavras como “poder” e “influência” são decisivas para percebermos o que está a acontecer dentro e fora da União Europeia. Do ponto de vista interno, o acontecimento mais importante na Europa foi e é a reunificação da Alemanha. A reunificação foi conduzida de forma exemplar pela Alemanha mas não foi por isso que deixou de alterar profundamente todo o mapa geopolítico europeu. Do ponto de vista externo, coisas como a globalização, a ascensão de uma Ásia que vai do Irão ao Japão cada vez mais consciente das suas potencialidades, as enormes expectativas de Washington em relação ao papel das economias e forças armadas europeias na política internacional, as suspeitas de muitos eleitorados do Velho Continente em relação aos EUA, dúvidas em relação a Moscovo e as dificuldades em reconstruir e estabilizar estados como o Afeganistão mostram que temos pela frente vários cenários. Uns podem ser mais benignos do que os outros mas todos eles estão rodeados por desafios políticos exigentes. Os líderes e as elites europeias sabem isto muito bem e olham para o Tratado de Lisboa como um instrumento para transformar rapidamente a União Europeia numa instituição indispensável na política mundial. Durão Barroso foi, como é costume, particularmente claro sobre este ponto. O tratado assinala “o nascimento de uma nova Europa” pronta para “enfrentar os problemas globais”. O problema é que, na melhor tradição europeia, esta ambição é proclamada sem que os eleitorados e, suspeita-se, muitos políticos compreendam o verdadeiro alcance estratégico daquilo que está a ser proposto. A ambição das sociedades, governos e países europeus em manter o seu poder e influência internacional através da União Europeia é perfeitamente compreensível e desejável. O que não é nada compreensível é que toda esta conversa seja conduzida sem ter em conta coisas essenciais como meios e fins, custos e consequências, motivações políticas e apoios das opiniões públicas. Os últimos dias mostram que os governos europeus estão na fase da espargata estratégica. De um lado, enorme ambição política. Do outro, enorme relutância em discutir de uma forma honesta com os seus eleitorados o que é que esta ambição realmente implica. Manter esta espargata será muito difícil e doloroso. O referendo é a melhor maneira de pôr fim a esta situação (...)". Mais um...

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