segunda-feira, fevereiro 05, 2018

Novo hospital: Madeira ‘passa a bola’ para o Governo da República

Até 30 de março, a Madeira vai estar em condições de avançar com toda a documentação necessária à abertura do Concurso Público Internacional (CPI) para construção do novo hospital.
“Estamos na fase final a resolver uma série de situações para permitir o lançamento do novo concurso para começar em 2019 e ter, em três ou quatro anos, o hospital pronto”, avançou, ao Económico da Madeira, o secretário regional da Saúde, Pedro Ramos.
É intenção do Executivo madeirense lançar o CPI em abril deste ano. Depois de entregue toda a documentação em desenvolvimento, ‘a bola’ passa para o lado do Governo de António Costa que prometeu publicamente um financiamento de 50% do novo hospital. Caso o governo central não cumpra, a Região, através do vice-presidente do Governo Regional, Pedro Calado, já fez saber que estão a ser estudadas alternativas.

O ‘dossiê hospital da Madeira’ é longo, data de 2004, foi suspenso em 2010 e retomado em 2016. Entre impasses, muito debate e uma candidatura a Projeto de Interesse (PIC) chumbada em 2016 pelo Conselho de Acompanhamento das Políticas Financeira (CAPF), o primeiro-ministro António Costa prometeu, em março de 2017, um financiamento de 50%, mas o facto é que não foi inscrita verba no Orçamento de 2018. Na Madeira, a maioria social-democrata fala “num veto político ao novo hospital”.
“Neste momento, temos a sensação que existe um veto político. O hospital é um desidrato da população não deveria ter cor política”, enfatiza Pedro Ramos.
Para a semana, o grupo de trabalho misto que acompanha o projeto do novo hospital reúne novamente em Lisboa. Até ao final de Março, espera-se que o governo nacional disponibilize os 50% prometidos.
Em cima da mesa, estão três cenários possíveis: um Concurso Público Internacional Clássico, um modelo que tem sido defendido pela Madeira, uma Parceria Público-Privada (PPP), a Região mostra-se flexível a esta solução desde que se trate de uma PPP infraestrutural e que Lisboa assuma os 50% prometidos , e o recurso a um empréstimo do Banco Europeu de Investimento (BEI).
Recentemente Pedro Calado admitiu estar em negociações com o BEI para obter financiamento para o projeto do novo hospital e assim ultrapassar “muita dificuldade” imposta pelo Governo da República. O BEI apresenta-se, segundo algumas fontes ligadas a este processo, como uma alternativa de último recurso à falta de verba de Lisboa. Pedro Ramos, secretário regional da Saúde, não comenta para já esta possibilidade, considerando que o que está em causa no momento e que o se espera é que “o Governo da República cumpra a sua palavra e disponibilize os 170 milhões prometidos”. A acontecer, teria de haver uma ratificação do Orçamento de Estado.
Um dossiê com 14 anos
O primeiro projeto de construção do Hospital da Madeira teve início em 2004. Em 2010, a resolução n.º 76/2010, de 2 de Julho da Assembleia da República recomendava ao Governo que considerasse a construção de um novo hospital na Madeira como PIC (Projeto de Interesse Comum). Nesse mesmo ano, o projeto foi revisto, mas acabou por ser suspenso pelo Governo anterior.

Passados seis anos, o Governo Regional decidiu avançar com a construção de um novo hospital. Na altura, João Faria Nunes, o então secretário Regional da Saúde, considerava que o envelhecimento, a diminuição da população e o aumento das doenças crónicas justificava a construção de uma nova infraestrutura hospitalar direcionada para o futuro no que respeitava às novas doenças, às novas patologias e à nova tecnologia”.
No mandato de Faria Nunes, foi constituído o Grupo de trabalho do Novo Hospital formado por Mário Rodrigues, Dirío Ramos, José Franco e Eduardo Freitas.
A candidatura a Projeto de Interesse Comum foi entregue no prazo legal, 29 de Junho de 2016, pelo Governo Regional. O documento continha a descrição do projeto, a programação financeira e a estimativa do custo total de 340,4 milhões de euros, repartidos pelo horizonte 2015 a 2024.
Em setembro de 2016, a Madeira ficou a saber que o Conselho de Acompanhamento das Políticas Financeira (CAPF) tinha dado parecer negativo à candidatura a Projeto de Interesse Comum, o que implicava que o Conselho de Ministros deixasse de estar obrigado a incluir no Orçamento de Estado para 2017 as verbas necessárias para o arranque do novo hospital.
Se o CAPF-Conselho de Acompanhamento das Políticas Financeiras não tivesse emitido este parecer negativo, o Primeiro-Ministro estaria forçado a assumir o compromisso político, até 30 de Setembro, sobre o apoio do Estado à construção do futuro hospital da Madeira.
Em Março de 2017, o primeiro-ministro António Costa promete financiamento para o novo hospital da Madeira em 50%.
Na sequência disto, o Governo Regional, e para suprir o parecer negativo à candidatura de 2016, sugeriu a criação de um grupo de trabalho em Janeiro de 2017 para acompanhar o projeto e esclarecer dúvidas. O grupo misto, integrado por representantes dos governos nacional e regional, só viria a ser nomeado em Setembro de 2017 e reuniu pela primeira vez em Dezembro, depois aprovado o Orçamento e de Pedro Calado – empossado vice-presidente do Governo da Madeira em outubro – ter pressionado o Governo da República e criticado duramente o facto de “a República ter levado um ano para definir um grupo de trabalho”.
Perante impasses e retrocessos, o mediatizado projeto para a construção do Novo Hospital da Madeira mantém-se ‘empatado’, com o Executivo madeirense a dar nota à opinião pública das dificuldades impostas pela governação socialista de António Costa e representantes da maioria social-democrata madeirense a considerarem que o atraso na nomeação do grupo misto de trabalho é estratégico, já que a candidatura PIC teria obrigatoriamente de ter sido entregue em junho.
O que diz o Governo Regional?
A 29 de Dezembro, o artigo 71º da  portaria n.º 249/2017 do Diário da República  determina que “o Governo assegura apoio financeiro à construção do Hospital Central da Madeira, de acordo com a programação prevista no quadro dos projetos plurianuais, em cooperação com os órgãos de governo próprio da Região Autónoma da Madeira, no respeito pelo princípio da solidariedade nacional”.

Na alínea dois, esclarece-se que “o apoio a prestar, nos termos do número anterior, corresponde a 50 % da despesa relativa à obra de construção do Hospital Central da Madeira, na sequência da decisão referente ao respetivo concurso público e é disponibilizado à medida que os trabalhos estejam em condições de serem pagos”.
O Governo da Madeira exige que  estejam inscritas verbas no mapa plurianual de investimentos para viabilizar com o concurso internacional para o novo hospital.
O que está a ser feito?
O projeto atual do Hospital da Madeira custou 1,4 milhões de euros, o que representa 35% de 4,1 milhões de euros do valor de custo global do projeto adjudicado à ARIPA – Arquitetos. Segundo os dados a que o Económico Madeira teve acesso, os outros 65% foram pagos na fase de estudo prévio que começou em 2004 e no projeto base que terminou em 2009 e 10% são destinados a assistência técnica ao projeto.

Recorde-se que o valor do custo global do hospital, incluindo o projeto, expropriações, obra, equipamentos, fiscalização da obra, assessoria e o IVA, é de 340 milhões de euros.  Foi tornado público por Pedro Calado que as expropriações de mais de 90 parcelas, correspondendo a 86% do total da área, “estão feitas, pagas” e outras em fase de negociação.
De acordo com Dírio Ramos, técnico que está a assessorar o Governo Regional neste processo, o projeto de arquitetura e todas as especificidades estão concluídos. Em curso, está a fase de análise e verificação do projeto que envolve 60 pessoas, entre arquitetos, engenheiros e outros especialistas. Um dos nomes mais conhecidos neste processo é o do engenheiro civil António José Luís dos Reis, responsável por obras como as Pontes dos Socorridos e João Gomes, no Funchal, e a Ponte do Freixo no Porto.
A assessoria do projeto entregue à ARIPA – Arquitetos está a cargo da Consulgal, SA. Em simultâneo com os procedimentos da verificação - as medições são fiscalizadas pelo Serviço de Utilização Comum dos Hospitais (SUCH)  -, está a ser elaborado um caderno de encargos, especificadas as condições jurídicas do concurso  e decorre um estudo de custo/benefício encomendado à Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP) . "Este estudo é inédito e nunca foi exigido em outros projetos", critica Dírio Ramos.
A estratégia do Governo é  munir-se de todos os instrumentos para fazer face às sucessivas exigências do Governo central, incluindo a eventualidade de uma parceria público-privada
Novo projeto prevê poupança de 30 milhões por ano
O projeto do novo Hospital da Madeira é uma evolução do plano base de 2010 que foi sujeito a uma revisão do programa funcional para acomodar as alterações necessárias decorrentes da evolução demográfica e das alterações da legislação posterior a 2009, data em que foi concluído o anteprojeto.
O executivo madeirense defende que a ampliação ou remodelação do novo hospital ficaria “praticamente” pelo mesmo valor da construção de raiz e não serve os interesses da população, não permite uma otimização infraestrutural nem perspetivas de crescimento futuro.
Em relação ao projeto pensado em 2004, os documentos a que o Económico teve acesso revelam que o novo projeto prevê, por exemplo, a construção de menos 20 camas de pediatria e menos 10 de obstetrícia, aumentando as camas destinadas à psiquiatria, cuidados paliativos, hemodiálise e oncologia.
O bloco operatório teria, em caso de avanço da obra, 11 salas de operações e 65 postos de atendimento no serviço de urgências. O projeto que foi suspenso em 2010 tinha uma área de 223 mil m2, o atual prevê a ocupação de 173 mil m2, está preparado para crescer vertical e horizontalmente.
Com a concentração das três unidades de saúde regionais, o SESARAM espera poupar à volta de 30 milhões. Só a concentração de serviços e o sistema de gestão integral de camas permitiria, segundo o técnico Dírio Ramos, 8,3 milhões de euros.
Com a obra, estima-se que seriam criados em cinco anos em média 500 postos de trabalho e mais cem decorrentes da nova centralidade despoletada pela criação da infraestrutura hospitalar.


Lisboa “empurra” Madeira para uma PPP 
Um dos mais recentes ‘temas quentes’ em torno da construção do novo hospital está ligado à hipótese de uma parceria público-privada (PPP). Recentemente, Pedro Calado, vice-presidente do Governo, acusou o Executivo nacional de “estar a empurrar” a Madeira para esta via, depois de Lisboa se ter comprometido a cofinanciar 50% dos 340 milhões necessários, mas não ter inscrito as verbas no OE para 2018.
“A Região nem tem capacidade para definir o modelo de financiamento”, declarou, na altura, considerando tratar-se de “uma autêntica vigarice”.
Este novo handicap é visto na Região como um “embuste” que contraria, segundo Dírio Ramos, o disposto na alínea dois do artigo 71º sobre o financiamento do Estado e implicaria uma solução similar ao Hospital Oriental de Lisboa.
Uma PPP, implicaria a realização de um estudo de impacto económico e financeiro e coincidiria com as candidaturas PIC que de acordo com a lei deve ter lugar em junho, pressupondo também a criação de um grupo de missão,  um despacho dos dois governos e publicadas as rendas a pagar durante o prazo acordado pelas duas partes.
Esta parece ter sido a ‘gota de água’ para o Governo Regional que, pela voz de Pedro Calado,  acusa a República de ter  no novo hospital da Madeira “um plano de intenções”. A Região aguarda pela posição de Lisboa. Espera-se que no final de Março, os madeirenses fiquem finalmente a saber quando avançará a construção do novo hospital e em que moldes (texto de Patrícia Gaspar no Económico-Madeira, com a devida vénia)

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