Teve
de ser auditoria do Tribunal de Contas a divulgar valor de rede de retaguarda
negociada em 2017 com Bruxelas, que nem Governo, nem Banco de Portugal alguma
vez assumiram. Já se sabia que havia uma rede de segurança de retaguarda
através da qual Portugal garantiu à Comissão Europeia que, mesmo após todas as
ajudas do Fundo de Resolução, poderia vir a injetar dinheiro no Novo Banco. Era
o “pior dos piores” dos cenários, como classificou Mário Centeno ainda como
ministro das Finanças. Nunca se soube qual o montante que poderia ser colocado
nessa eventualidade – só o Tribunal de Contas agora o revelou: 1,6 mil milhões
de euros.
A injeção de capital de retaguarda pelo Estado português no Novo Banco é “até ao montante máximo necessário para garantir a sua viabilidade a longo prazo (1,6 mil milhões de euros) no cenário adverso da Comissão Europeia, com base no plano de reestruturação preparado pela Lone Star para demonstrar a viabilidade do Novo Banco no final dessa reestruturação, em 31 de dezembro de 2021”, segundo as informações que constam do relatório de auditoria feita pelo Tribunal de Contas ao financiamento público recebido pelo banco, publicado esta segunda-feira, 3 de maio. O Tribunal de Contas chega a esse valor "com base" nos valores reportados pela Comissão Europeia.
É no
fim deste ano que acaba o plano de reestruturação do Novo Banco, negociado
entre o Estado português e a Comissão Europeia em 2017, aquando da venda de 75%
do capital aos americanos da Lone Star. Nessa data, foi acordado o mecanismo
que obrigava o Fundo de Resolução a colocar até 3,89 mil milhões de euros no
banco, para cobrir perdas com ativos tóxicos – num regime agora criticado
duramente pelo Tribunal de Contas – mas que acabou por garantir a estabilidade
do sistema financeiro.
Além desse mecanismo, ficou criada a tal rede de segurança, backstop na versão original do documento, a ser acionada no caso de os rácios de capital do Novo Banco ficarem aquém do exigido pelo Banco Central Europeu no fim deste ano. Essa rede foi apenas tornada pública quando, em 2018, a Comissão Europeia divulgou a versão não confidencial da decisão que autorizou as ajudas estatais concedidas ao banco na venda. E estava escrito que “Portugal vai providenciar capital adicional” ao Novo Banco se falharem outros caminhos: se não conseguir cobrir necessidades de capital por medidas de rotina (como venda de ativos) no espaço de nove meses após a descoberta das necessidades; se o Novo Banco não encontrar privados interessados em satisfazer aquela necessidade; se um aumento de capital for mal-sucedido; então, Portugal pode ajudar ainda mais o banco.
Esta
injeção seria concedida diretamente através do Tesouro português e não do Fundo
de Resolução. O Governo e o Banco de Portugal têm dito que esta ajuda não será
necessária, por ser muito improvável, e a sua utilização obrigaria a um novo
plano de reestruturação, a mais cortes de postos de trabalho (em torno de mil
profissionais) e de sucursais (cerca de 100 unidades).
O
objetivo máximo seria impedir a liquidação do banco, e o seu impacto na
economia, dando garantias de viabilidade à Comissão Europeia - que sempre dela
duvidou. O antigo governador Carlos Costa, em funções quando a venda se
concretizou, defendeu que este cenário é “absolutamente improvável”. Ainda como
ministro que acompanhou a alienação, Mário Centeno, hoje governador, considerou
improvável a utilização desse recurso, já que é o “pior dos piores dos
cenários”.
Aquando da sua constituição, em agosto de 2014, o Novo Banco absorveu 4,9 mil milhões de euros do Fundo de Resolução (3,9 mil milhões emprestados pelo Estado). Com a venda, três anos depois, ficou acordada a tal possibilidade de pedir até 3,89 mil milhões de euros pelo mecanismo de capital contingente que desresponsabilizava a Lone Star de parte das perdas com ativos tóxicos (dos quais 3 mil milhões já foram usados, com ajuda de 2,1 mil milhões de empréstimos estatais). Está para breve (devia ser esta semana) a injeção de mais 430 milhões de euros deste “seguro”, ficando disponíveis ainda outros 400 milhões até 2026. A falta de transparência sobre os encargos assumidos com o Novo Banco é uma das conclusões da auditoria feita pelo Tribunal de Contas (Expresso, texto dos jornalistas Diogo Cavaleiro e Isabel Vicente)
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