quarta-feira, janeiro 30, 2013

Opinião: "Falhanços e espertalhões"

"Foi há dias noticiado que o governo de coligação (e Gaspar) falhou na previsão dos impostos em mais de 3000 milhões, com o IVA à cabeça. Segundo o Publico, “quase dois terços do erro da previsão do Governo de mais de 3000 milhões de euros para a receita fiscal durante o ano passado deveu-se à quebra do consumo e do investimento e o efeito que esta teve na cobrança do IVA” De facto a cobrança de impostos em Portugal em 2012 ascendeu a 32.025 milhões de euros, “resultado que representa um falhanço em praticamente toda a linha da projeção que tinha sido feita pelo Governo em Outubro de 2011, quando, com a troika já a fiscalizar as finanças públicas portuguesas, apontou para uma receita fiscal de 35.159 milhões de euros, ou seja, mais 3.133 milhões de euros do que aquilo que acabou por se verificar. São quase 2% do PIB, um valor capaz de fazer derrapar qualquer projeção para o défice público”.
Quer isto dizer que o Governo “falhou em quase todos os impostos, pois dos nove cuja receita é discriminada pelas Finanças no seu boletim mensal de execução, em apenas um a previsão feita no orçamento acabou por ser cumprida, d do Imposto Único de Circulação, cuja receita ficou 10,8% acima da projeção. Nos outros impostos, o erro de previsão é, em alguns casos, difícil de compreender”.
A perda mais grave ocorreu com o IVA, cuja receita ficou 13,3% abaixo do orçamentado, ou seja, entraram menos 1.967 milhões de euros nos cofres do Estado, prelo que “o erro de projeção no IVA representou 63% do falhanço registado”. Segundo o Público, “erros grandes de previsão nos impostos não são inéditos em Portugal. Em Outubro de 2008, um mês depois da falência do Lehman Brothers, o governo liderado por José Sócrates, com Teixeira dos Santos nas Finanças, foi também incapaz de realizar uma previsão minimamente acertada para as receitas fiscais do ano seguinte. Em 2009, as receitas fiscais ficaram 6.471,5 milhões de euros abaixo da verba inscrita no OE inicial”. Percebe-se as causas da nossa falência…
Independentemente de acharmos que não vale a pena perder muito tempo com as banalizadas alusões aos sucessivos falhanços do ministro das finanças Gaspar - um banal tecnocrata cinzentão, armado em espertalhão, que não consegue disfarçar que é sobretudo mais um funcionário da banca do que ministro - sem mais comentários, recupero um artigo da jornalista Vanessa Cruz, da Agência Financeira, intitulado “Os fracassos de Gaspar nas previsões não começaram agora” que em meu entender fala por si e dispensa comentários adicionais:
“Não é de agora que Vítor Gaspar falha nas previsões para a economia portuguesa. O filme de 2012 já tinha acontecido em 1993. O único ano de recessão na década de 90 teve o dedo do atual ministro das Finanças. Na altura, quem mandava nessa pasta era Braga de Macedo, o ministro otimista, de tal forma que as suas estimativas até ficaram conhecidas como a "teoria do oásis".
No ano anterior, em 1992, Gaspar era diretor do departamento de estudos económicos do Ministério das Finanças. Portanto, esteve por detrás das previsões feitas para 1993. O "oásis" acabou por se traduzir numa recessão, menor do que a vivemos hoje, mas uma recessão. Previa-se um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2% em 1993, mas a economia acabou por recuar 0,7%. Uma grande diferença face ao ano anterior, em que a riqueza criada tinha aumentado 3,1%.
No Orçamento do Estado para 2012, o cenário era outro: as estimativas já estavam marcadas pelo pessimismo – uma recessão de 2,8%, a maior dos últimos 30 anos. Afinal será de 3%. Ainda pior. O balanço final só será feito em 2013. A ilação que se pode tirar até agora é que não acertou à primeira. Parece que o pessimismo, afinal, até tinha sido otimista.
Porém, é mesmo na receita fiscal que se verifica o maior desfasamento em relação ao projetado inicialmente e ao que a execução orçamental vem apurando. O Orçamento do Estado para 2012 previa que aumentasse 2,9%. Mas, este ano, as derrapagens foram sucessivas. Passou-se do sinal (+) para o sinal (-) num instante, logo em janeiro, mês em que a receita fiscal afundou 7,9%. De lá para cá, o encaixe com impostos foi de mal a pior. Segundo a execução orçamental de outubro – últimos dados conhecidos – a derrapagem já ia em 4,6%. Os dados de novembro serão divulgados no final desta semana.
As previsões foram "excessivamente" otimistas. O Conselho de Finanças Públicas por diversas vezes o repetiu. O Governo lá acabou por rever os números, mas o relatório do OE2013 ainda aponta para uma receita de 1.400 milhões de euros em 2012, para a qual a Unidade Técnica de Apoio Orçamental diz que (UTAO) "não se encontra justificação". A UTAO vaticina: as receitas fiscais vão deixar um buraco de 0,4% no PIB este ano.
Recuemos, pois, vinte anos. Em 1993, o Orçamento do Estado aprovado previa um encaixe à volta de 3.340 milhões de contos (16.660 milhões de euros) com as receitas correntes. Mas o Orçamento final, corrigido de alterações orçamentais, já estimava menos 364,7 milhões de contos (1,8 milhões de euros). E isso aconteceu porque a receita fiscal teve um desempenho bem pior do que se estava à espera: verificaram-se "decréscimos nos impostos diretos, de que fazem parte o IRS e o IRC (-163 milhões de contos) [ou 813 mil euros] e nos impostos indiretos (-210,3 milhões) ou [1 milhão de euros]", como o IVA, lê-se na Conta Geral do Estado desse ano.
Embora depois, na execução orçamental, estas rubricas tivessem sido melhores do que no Orçamento final, a revisão de previsões já lá estava. E, no final de contas, o que é facto é que as receitas correntes efetivamente cobradas caíram 5,3% em relação a 1992 (-4,8% no caso dos impostos diretos, -0,2% no caso dos indiretos). Portanto, o otimismo em relação à evolução da receita fiscal de um ano para o outro não tinha razão de ser. As contas, preto no branco, revelaram outra realidade. Do "oásis", 1993 ficou isolado na década de 90 com o carimbo da recessão. Ela voltou depois em 2003 (-0,9%), 2009 (-2,9%), 2011 (-1,6%) e, claro, agora em 2012. Sabe-se que 2013 também não escapará, prevendo-se que a economia contraia 1%. Na última revisão de estimativas feitas pelo Governo, o dedo de Gaspar deixou esta intacta”.
Ora sabendo que se trata de um ministro que também é conhecido por falhar todas as suas previsões não deixa de ser estranhamente curioso que tenha sido incluído no 10º da lista dos melhores ministros das finanças da União Europeia, elaborada em função da conjugação de vários fatores e dos resultados financeiros, económicos, orçamentais e sociais dos respetivos países. Mas estas “coisas” funcionam assim. Tal, como interessava no passado colocar Teixeira dos Santos no “rabo da lança” (estávamos em vésperas do pedido de ajuda externa…), agora importa meter o ministro português a meio da tabela. Talvez porque há milhões de euros para receber…" (JM)