domingo, agosto 06, 2017

Alberto João Jardim: “Cafôfo vai ganhar e Albuquerque deve fazer o que a consciência mandar”

Alberto João critica o executivo por apostar no “assistencionalismo” e não no investimento. E não tem dúvidas: Cafôfo vai ser reeleito no Funchal e Albuquerque deve fazer “o que a consciência mandar”.
Acredita que o atual presidente da Câmara do Funchal, Paulo Cafôfo, vai ser reeleito com grande maioria?
Penso que sim. Sabe, a lista dele é muito fraca e penso que cometeu um erro. Podia ter feito uma lista só com base no PS e tem para lá gente que é execrável, da JPP e do Bloco de Esquerda e tal. Penso que aí vai perder votos. Se terá maioria absoluta, não sei. O erro do Cafôfo é ter gente na lista que não vale a pena. Não precisava dessas pessoas para ganhar.
Se o resultado da candidata do PSD, Rubina Leal, for fraco, Miguel Albuquerque deve retirar consequências? Deve fazer o quê?
O que a consciência dele mandar. Como Passos Coelho deve fazer o mesmo. Agora, também as outras pessoas vão ter o direito de avaliar o que está na consciência deles.
O seu filho [Pedro] está na lista da candidata Rubina Leal, do PSD, num lugar que à partida será não elegível. Como vê a participação do seu filho na lista de uma candidata apoiada por Miguel Albuquerque, seu adversário e sucessor na liderança do Governo Regional?
Os meus filhos nunca assumiram cargos políticos enquanto fui chefe do Governo Regional. Só uma das filhas foi chefe de gabinete de um vice-presidente, e agora é chefe de gabinete do secretário regional das Finanças. Mas é o próprio presidente do Governo, meu adversário, que reconhece que está lá por qualidade pessoal. Agora, eu disse ao meu filho que em políticas tomam-se decisões com a nossa consciência. O que ele decidir em consciência, o pai está com ele, pois há uma ligação entre pai e filho. E ele colocou-me a questão de uma maneira que eu não contesto: “o partido, neste momento, está na mó de baixo e é nesta altura que eu devo avançar e dar a cara. Porque se o partido estivesse na mó de cima havia muita gente a querer aparecer. Em segundo lugar, sou amigo pessoal da candidata e a amizade honra-se. Em terceiro lugar, exigi uma posição não-elegível, para demonstrar que não quero tacho”. Eu respondi-lhe, em brincadeira: és o último romântico da política! Mas eu penso que, do ponto de vista dos princípios, tem razão. Foi uma decisão tomada em consciência e com os pressupostos bem pensados. Fica com um capital de razão para amanhã poder dizer, ‘atenção, eu fiz assim’. Aqui está quem deu a cara. Ele tem uma certa aversão à política, mas costumo dizer que fez um bom investimento com esta opção.

Gostava que o seu filho se dedicasse à política?
Gostava, porque eu gostei da política e quero para os meus filhos aquilo que me fez feliz a mim. Mas não os forço. Os meus filhos almoçam comigo todos os dias, na minha casa. E nós falamos, obviamente, mas mais em tom de brincadeira.
Que balanço faz do trabalho do seu sucessor?
Não é bonito. Mas só posso fazer esse balanço no final dos quatro anos. Agora, a política é diferente da minha. Eu apostava no investimento, eles apostam no assistencionalismo e no subsidiarismo. Eu jogava no longo prazo e levava porrada, porque as pessoas queriam dinheiro e benesses, mas ia-se fazendo investimento. Eles jogam no imediatismo e prometem umas loucuras, uns ferries… nem chegam a 100 pessoas por ano as que levam o carro ao Continente e a Região vai pagar três milhões de euros pelo ferry, quando é uma obrigação do Estado central assumir esses custos. Não, não se provoca Lisboa, é-se politicamente correto. Hoje, o Governo Regional da Madeira não tem força em Lisboa e vai pagando tudo. E todo o investimento está parado. Depois disfarça-se o desemprego criando um curso de formação aqui, outro acolá… está no curso de formação e já não está desempregado, paga-se mais um curso… tudo loucuras. Obviamente, a unica coisa que posso dizer é que, neste momento, a política do atual governo regional nunca seria a minha. A minha política seria apostar no investimento. E, sobretudo, num forte desprezo pela opinião publicada. Ia fazer o que me desse na cabeça.
Acredita que os eleitores não ligam à opinião publicada?
Sabe porquê? Porque os eleitores não se reveem na opinião publicada. E eu sempre estive com a maioria e não com a minoria. Isto é o ovo de colombo (risos).
Diz que o atual executivo regional não tem força em Lisboa. O seu estilo combativo era mais eficaz, apesar dos anticorpos que provocava?
Quando me dizem que esse estilo não deu resultado, respondo: não deu? Então a Madeira não está muito diferente do que era há 40 anos? O que se conquistou institucionalmente, o que se conquistou na Europa… tinha de ser através da dialética. A política é dialética. Aí eu sou marxista. A política é dialética e eu tenho de ter uma tese o mais arrojada possível, para que mesmo com antítese forte, a síntese produza o mais próximo possível da minha tese. Isto não é Marx, no fundo é Platão, que no Banquete utiliza o método de dialética.
Já leu Sun Tzu? Aprecia?
Sim, fui oficial de ação psicológica de informação e contra-informação (risos). E acredito também no Clausewitz e que a política é a guerra sem armas. Ah sim, por isso é que não sou pelo consenso.
Mas reconhece que esse estilo combativo que alimentou teve os seus exageros?
Sim, mas muitas vezes fiz cenas que eram táticas, no sentido de provocar, de que o assunto fosse agitado na opinião pública. E assim chegava cá qualquer coisinha.
E não pagou um preço por isso?
Paguei um preço pessoal, mas como também sempre gozei o dia a dia…
Nunca quis ter uma carreira política ao nível da República?
Nas vezes em que pensei nisso foi o próprio PSD a cortar-me as asas. No fundo, o PSD pensava assim: ‘o Jardim é porreiro para ganhar eleições na Madeira e ser uma voz que a gente junta às de cá quando é preciso fazer guerra aos outros partidos, mas tem que ficar lá quieto porque aqui tornava-se incómodo. Ainda por cima, não gosta de dinheiro. Isto é assim complicado’.
O que o movia?
Duas coisas. Primeiro, os ideais: sempre fui uma pessoa de ideais, talvez demasiado ferranha desses ideais. Depois, o gosto pelo desafio, pelo risco.
Como analisa a situação na Venezuela e o posicionamento de Portugal?
Portugal tem que alinhar pela União Europeia. Não pode armar-se em Dom Quixote e fazer a figura triste de querer ser mais consensual do que… A Venezuela é um caso perdido para a democracia e não vale a pena andar com paninhos quentes. O que é preciso é ajudar a derrubar o regime venezuelano.
Isso não pode pôr em risco a segurança dos portugueses?
Os portugueses não têm mais nada a perder. Aos portugueses, este regime não vai interessar porque é um regime de miséria.
Acha que Portugal deve alinhar no discurso da União Europeia, de sanções…
Sim. Neste momento, a estratégia de Portugal está a ser afetada pelo facto de o PCP ser um partido apoiante do governo. O PCP – que é um caso museológico – arranjou maneira de encontrar um sócio para acompanhá-lo.
Voltando atrás e no que respeita ao futuro do PSD, fala-se no nome de Rui Rio…
Não me falem de ninguém. Arranjem alguém que apareça e que acabe com aquilo.
Um Macron?
Não me fale em nomes… Macron, não! Não me tragam outro neoliberal. O partido é social-democrata.
Há pouco disse que o PSD não era nada neste momento…
Sim, mas tem de voltar a ser um partido social-democrata.
Neste momento, a maior parte das pessoas que militam no PSD são social-democratas?
A maior parte dos que estão inscritos não são social-democratas. Tiveram foi o cuidado de acautelar o seu futuro na direção do partido. Agora, os social-democratas do país não se reveem no senhor Passos Coelho e nos ilustres desconhecidos que estão à sua volta.
Nestes 37 anos à frente do Governo, quais foram as duas personalidades que se destacaram, na sua relação com a Madeira, pela negativa e pela positiva.
O Sá Carneiro foi o homem que arrancou com o processo da regionalização, embora os primeiros-ministros Cavaco e Durão Barroso tenham ajudado muito a Madeira. Pela negativa, sem dúvida o Guterres e o Sócrates. O Guterres com a história do défice democrático. É um homem que tem uma ambição enorme de protagonismo. Diria que ele peca pela soberba e estamos a ver isso nas Nações Unidas. Neste momento, o que ele está a fazer é um fracasso total. Embora tenha tido um aspeto positivo, que foi resolver as finanças das RAM’s. O Sócrates foi um desastre para com a Madeira. É curioso que, depois de me entender pessoalmente com ele, achei que era um tipo interessantíssimo. Penso que a política é conhecimento pessoal. Na fase em que não nos conhecíamos bem, correu mal. Depois passou a correr bem. O mesmo para o Sócrates.
O que acha da questão dos prazos da Operação Marquês? Sócrates tem razões de queixa?
Há pouco, dizia que a Constituição de 1976 foi um acordo para evitar a guerra civil e uma das cedências que se fez aos comunistas foi a estrutura da Justiça em Portugal. Acho que o comportamento da Justiça com Sócrates não está correto. Em termos de direitos humanos, não se expõe assim uma pessoa.
Olhando para trás, com a distância que o tempo permite, o que faria de forma diferente? Reconhece que algumas das críticas que lhe fizeram, a si e às pessoas que o rodeavam, na política e nas empresas presentes na região, têm alguma valia?
No tocante a empresários, nunca recebi nada deles e procurei ajudar até os adversários. Por exemplo, o grupo Blandy, assinei um papel para que pudessem vender o hotel Ritz porque era importante para o grupo sobreviver. Procurei que não se fizesse um campo militar, onde hoje o grupo tem um campo de golfe. Nunca prejudiquei os empresários e também nunca recebi nada deles. Na questão do défice democrático, penso na estrutura que dei ao governo… o ilhéu é muito virado para dentro, nós não temos grandes espaços para levar a nossa agressividade para fora, estamos muito virados para dentro. Sempre tive por princípio fazer e depois se as pessoas não gostassem votavam contra.
Teria feito alguma coisa de outra forma?
Fiz 4879 inaugurações. Não me diga que em nenhuma destas não houve alguma coisa que não tivesse corrido menos bem. Mas não me arrependo. A linha seguida, de não andar atrás da opinião de minorias e da opinião publicada – para mim só havia uma opinião, a da maioria – , de grupos de pressão, isso eu voltava a fazer. O problema deste Governo [regional] é precisamente esse. Agora, depois de sair do Governo e ao notar o comportamento de certas pessoas, penso que cometi um erro ao acreditar nessas pessoas.
Sentiu-se traído?
Não, eles não têm categoria para ser traidores. É dar-lhes importância a mais (entrevista concedida ao Jornal Económico, com a devida vénia)

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