Esta história dos congressos partidários
nacionais, sobretudo esses, porque são maiores - e perceberão que sei do que
falo - é muito simples de entender: mais do que preocupados com os militantes e
com os simpatizantes, os partidos querem é ganhar em três dias de reunião,
algum espaço mediático adicional na comunicação social que no caso de alguns
deles, não têm. Depois, porque há que distrair o "povedo" inventam umas tantas manigâncias no local. O PSD
escolheu este ano um video de propaganda sobre os 40 anos do partido (o CDS fez
o mesmo a par de umas cantorias, o PS de Sócrates, em 2011, foi uma encenação
de que não há memória, com jogos de luzes, contrastes cénicos, passadeiras
vermelhas, etc, até parecia uma peça musical da Broadway...) - imaginem que
esta corja bandalha que tomou o partido de assalto, até se atreveu a falar em
Sá Carneiro que se fosse vivo já os tinha expulsado a todos por postura
atentatória da ideologia e dos princípios e valores essenciais do partido e da
social-democracia. Ao vídeo dos 40 anos, juntou-se uma "time table"
com a história do partido desde 1969 (Sá Carneiro na ala liberal) e um jogo de
perguntas e respostas. Brincadeirinhas idiotas em tempos graves e que exigem
seriedade e elevação. Mas quanto mais para ali forem os delegados, quanto mais
se forem distraindo com estas palermices, menos querem eles discursar e menos
perigos haverá de porrada! Mas no PSD
eles sabem que os eleitores não comem social-democracia nem votam em função de conceitos
vagos.
A verdade é que as coisas funcionam assim.
Para a organização antes do congresso começar já estão a desejar que ele acabe.
Todos sabem que não será por causa aqueles 950 delegados - mesmo que eu não
tenha a certeza de que todos eles o façam - que o PSD, ou qualquer outro partido
na mesma posição, perderá eleições. Estamos a falar da "nomenclatura"
dirigente e eleitos, pelo que os perigos da derrota não se localizam a esse
nível. Obviamente que não o partido sabe que também não ganha qualquer eleição,
contando apenas com aquele universo de delegados.
O Congresso do PSD que decorre este fim-de-semana
em Lisboa tem 950 delegados, incluindo os eleitos das diferentes estruturas do
partido, e mais de 300 jornalistas registados. Está tudo dito! O PSD faz a
estatística - o mais velho com 86 anos e o mais novo com 20 anos, o que vem de
mais longe é originário de Macau e não sei que outras mais tretas. Mas não diz
as profissões dos delegados, nem confirma que, segundo as minhas estimativas, cerca
de 85% a 90% dos delegados são dirigentes partidários a vários níveis e em
diferentes organizações partidárias no universo do PSD e muitos eleitos, ou
seja, uma massa militante que é obviamente mobilizável para estas reuniões. Mas
como a sala (Coliseu de Lisboa) é grande há que juntar mais umas centenas de
convidados e de observadores, duas figuras estatutárias que apenas servem
para circularem em determinadas zonas do espaço do congresso, que não podem
usar da palavra, não votam, apenas fazem número e ajudam a compor a sala para
as televisões e fotógrafos dando uma imagem de pujança de um partido e de uma
reunião que é o que interessa vender ao exterior via comunicação social.
Nem falo nos jogos dos barões que disputam
entre si os horários das intervenções - lamentavelmente os partidos portugueses
continuam de forma primária a dar importância a esta gente, quando muito deles
se limitam a usar a política para mais facilmente acederem a determinados
lugares apetecíveis ou a alcançarem o estatuto, financeiramente rentável mas
politicamente interessante de comentadores de televisões públicas ou privadas -
para que coincidam com os telejornais nas televisões. Nem falo nos truques de
uma certa "casta" dirigente que encomenda de véspera, aos
jornalistas, a atenção para a hora X, Y ou Z que curiosamente coincide com
aquela que vão falar. Muitos deles prometem discursos inflamados, de porrada, de denúncia de não sei mais o
quê. Há que vender o peixe da melhor maneira possível porque caso contrário a
clientela, neste caso a comunicação social, passa sempre e nem perde tempo.
Nestes congressos, que normalmente são
reuniões das "nomenclaturas" dirigentes ou eleitos mais alargadas, há
sempre o "outro congresso", que se passa nos bastidores desde o
primeiro dia e que se prolonga até o anúncio das listas de candidatos que devem
ser divulgadas até final do segundo dia. É uma azáfama que as pessoas não imaginam,
são dezenas ou centenas os que se fazem ao poleiro, os que querem ir nas
listas, os que ameaçam, as estruturas partidárias que exigem, reivindicam,
ameaçam e usam os seus galões, sem esquecer as pressões de "nótáveis" da treta, etc. Este ano,
no caso do PSD, com um adicional: a lista para as europeias num quadro de
desgaste eleitoral que se vai manter e aumentar, de redução dos deputados
portugueses e de coligação, com todo o desgaste que isso causa ao partido
maior, neste caso ao PSD.
As pessoas não imaginam o que se passa e do
que alguns tipos são capazes para aparecerem numa lista. Mas não é só aparecer
por aparecer, pelo que há que negociar o lugar na lista, sim porque isto de
"encher chouriço" não é para todos. Há quem dê a cara apenas se tiver
a garantia de que é eleito e que o seu nome é chamado na sessão de encerramento.
Para esses, a ideia de fazer apenas número ou emprestar o seu nome, é
impensável. Neste quadro, seguem-se aqueles almoços e jantares de
"negociação" onde no fundo tudo acaba por ser discutido e que assumem
por isso alguma relevância neste processo de escolha e de decisão complexo onde
há muitos jogos e equilíbrios a ter em consideração. Ali estão sentados à mesa
delegados que acabam de aplaudir freneticamente o discurso do líder, saltitam
vibrantes e histéricos na sala de congresso, tentando dar nas vistas, mas que
depois, durante o repasto num restaurante na vizinhança, ouvem na televisão que
a austeridade vai continuar, que o governo de coligação cede qual palhaço
amedrontado, ao FMI e à Comissão Europeia, que exigem mais cortes na despesa
pública, no fundo mais roubos, e compreensivelmente e são os primeiros a
enxovalhar o gajo que horas antes aplaudiram. A palhaçada do costume, assente
neste primado muito humano, mas muito decadente: o que importa é estar lá,
sobreviver, porque tal como a caravana passa e os cachorros ladram, hoje estes
estão, amanhã serão outros e a quem assim se comporta, o que realmente importa
é estar, ora com uns, ora ou com outros.
E nem falo dos amuos, as irritações, os
abandonos extemporâneos daqueles que estavam à espera de um lugar nas listas e
não foram escolhidos. E que dizer daquelas listas corporativistas, de um grupo de
amigalhaços, dos copos ou antigos colegas de universidade, que elaboram listas de
candidatura a alguns órgãos para que falem deles à custa de uns míseros 2 ou 3
lugares alcançados graças ao método de Hondt - que provavelmente questionam quando
se trata de eleições oficiais – como se isso trouxesse felicidade a alguém ou importasse
a qualquer pessoa, mesmo os que seguem com mais atenção estes fenómenos
políticos mediáticos.
No final do segundo dia, com as listas
entregues, as escolhas feitas e com os relógios já adiantados, há quem comece a
desmobilizar e a regressar às suas terras, porque domingo é dia de família e de
futebol. A organização resolve isso com o tal jogo de luzes e com a redução das
cadeiras disponíveis na sessão de encerramento Não se pode dar uma imagem de
cadeiras vazias porque isso dá uma ideia de fragilidade e de desmotivação e
desinteresse que não é recomendável, já que colide com o que na realidade está
subjacente a qualquer congresso em termos de propaganda.
No encerramento é mais do mesmo.
Convidados, uma lista infindável de convidados que ali vão ajudar a compor a
sala, delegações partidárias - e os jornalistas perdem muito tempo a discutir
quem foi, quem não foi, por que razão a delegação do partido A, B ou V, é
composta por fulano, beltrano e sicrano, etc, as histórias do costume que
ajudam a conseguir, ou não, "shares" de audiência quando é sabido que
a concorrência está toda a transmitir o mesmo - incluindo, no caso do PSD, a delegação
do PS, com quem os social-democratas andam desesperadamente a querer negociar o
pós-troika, mas que não deixaram de constituir o alvo preferencial de toda a pancadaria política ouvida nos discursos
lidos no dia e meio útil de congresso. No final da reunião, o essencial para a
comunicação social, depois do discurso de aclamação do líder eleito, é saber o
que pensam essas delegações de partidos, as reações políticas ao que acaba de
ser dito pelo líder eleito. O pano desce rapidamente, uma fila infindável de
pessoas vai ao humilhante beija-mão de circunstância, a sala vai ficando vazia,
os delegados, convidados e observadores que ainda restam, tratar de regressam a
casa. Muitos deles já aparecem no último dia de congresso com o "trolley" de viagem. Até dali a dois
anos, caso não aconteça nada de especial antes disso. Enquanto isso, os
delegados das ilhas, a quem não lhes é pago nada, acabam de estar três dias
numa reunião gastando em viagens aéreas, estadia e alimentação 500, 600 ou mais
euros, se não mais (quando os congressos de realizam no interior do continente
a despesa sobe ainda mais com aluguer de viatura, deslocações, portagens, etc).
Por isso "isto" não é para todos, não pode ser para todos, porque há
pessoas que não estão dispostas a gastar semelhante verba para tal fim (LFM)