domingo, junho 29, 2008

Opinião alheia: "A dar-nos música"

Da autoria da jurista Rita Marques Guedes e publicado no "Diário Económico": "O PS, em todos os momentos das suas governações, demonstrou não ter características para lidar com períodos de conjuntura negativa.Boas circunstâncias. Nos últimos três anos, o PS e José Sócrates beneficiaram de uma conjuntura positiva: a começar pela situação no PSD, em que Durão Barroso, Santana Lopes, Marques Mendes e Luís Filipe Menezes, cada um na sua circunstância e com a sua quota de responsabilidade, contribuíram para colocar o partido à beira de uma depressão com consequências na sua quase desagregação; passando por um quadro económico externo relativamente favorável; acabando numa relativa acalmia social e nuns míseros laivos de crescimento económico interno. Nesta conjuntura, Sócrates e a sua equipa deram-se até ao luxo de prescindir de um argumento pré definido, leia-se: de uma estratégia de fundo para o país, e actuaram em cima de um palco que lhes possibilitava ser estrelas únicas e ajustar o seu papel aos diferentes desejos dos diferentes públicos. O que não é tarefa de monta quando em causa estão bons actores. E o facto é que durante três anos, a actuação de Sócrates não podia ter sido mais brilhante: ele era os focos a incidir, todos, sobre si próprio; ele era os assistentes de produção a construir laboriosamente a sua imagem; ele era os técnicos de palco a cuidar para que nada falhasse nas suas coloridas apresentações, fosse o lançamento de mais um troço de auto-estrada ou um beijo simpático numa jovem beneficiada por um qualquer programa de distribuição de computadores; ele era o público extasiado a aplaudir; ele era a sensação quase generalizada de que agora sim! o país tem um líder. Más circunstâncias. Ponto é que nem tudo o que é bom sempre se mantém: o PSD aparenta querer reorganizar-se em torno de alguém cuja imagem vale tanto, à contrário, quanto valeu a de Sócrates para uma determinada circunstância; a crise económica mundial é uma certeza e a sua profundidade uma enorme preocupação; a situação social interna dá sinais de efectiva agitação, para não dizer de eminente colapso. Perante isto, esperava-se que as artes de representação de Sócrates se transformassem em verdadeiras capacidades para lidar com as necessidades do país e que colocasse o foco no essencial. Mas o facto é que, à laia de Titanic, enquanto o país se vai afundando numa crise económica e social que ameaça não ter precedentes, o primeiro-ministro dirige a orquestra sob o lema de que é preciso continuar a dar musica às pessoas. Não espanta. O PS, em todos os momentos das suas governações, demonstrou não ter características para lidar com períodos de conjuntura negativa. A condição de Sócrates não é, afinal, diferente da dos seus pares e, por mais que, ao longo deste três anos, tentasse demonstrar o contrário, sendo a verdade como o azeite, está a vir ao de cima a sua inaptidão para lidar com a actual realidade".

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