terça-feira, fevereiro 17, 2009

PS-Madeira: a verdade que incomodava

Pedindo a tolerância dos que me lêm, recordo o que escrevi sobre este caso do PS-Madeira no Jornal da Madeira na passada sexta-feira, dia 13 de Fevereiro...:
"SURPRESA?
O grande erro de João Carlos Gouveia – e por isso não me surpreendem as notícias que li ontem num jornal regional – não resulta das sondagens, negadas por sectores socialistas, sobretudo aqueles aos quais estes resultados não interessam, nem do facto do líder socialista desvalorizar factos relacionados com o enquadramento futuro do PS e da respectiva liderança (que não passa por ele), mas por não ter percebido ainda, o que não augura nada de positivo, que existe, acima de discursos políticos, mais u menos radicalizados, um sentimento regional e uma dignidade colectiva que, gostem ou não alguns sectores da oposição regional, os Madeirenses não prescindem de defender. E neste contexto, queiram ou não, a polémica em torno da Lei de Finanças Regionais, a deliberada marginalização da Região por parte do poder central em Lisboa e a ausência absoluta de relacionamento institucional entre os dois governos, e que parecia ser possível normalizar depois da visita de Cavaco Silva no ano passado, acabam por constituir factores decisivos para moldarem a opinião que os Madeirenses têm sobretudo do PS, independentemente das pessoas afirmarem que os socialistas locais são cúmplices ou concordantes discretos dessa estratégia.
Julgo importante, e espero que existam sempre as tais “pontes” que nos permitam atravessar o rio – quando uma está obstaculizada, tentemos encontrar outra, em alternativa – o encontro ontem realizado em Lisboa entre José Sócrates e Miguel Mendonça porque certamente permitiu uma conversa aberta, pragmática, sem a pressão institucional, ainda por cima num quadro marcado pela sistemática especulação em torno do primeiro-ministro que eu continuo a acreditar nada ter a ver com o assunto, que não é acusado rigorosamente de nada e que não tem culpa – era o que faltava! – que familiares, mais ou menos próximos, usem abusivamente o seu nome. Mas tem ainda a particularidade de ter tido lugar quando caminhamos para o final de uma legislatura e quando existem indicadores que não afastam os socialistas de um cenário eleitoral vitorioso, embora sem disporem das condições que presentemente beneficiam, a maioria absoluta. Neste quadro, torna-se impensável, diria mais, é um absurdo, que a Madeira continue a alimentar, ou a ser vitima, por muito mais tempo, deste estado de coisas, desde logo porque sendo o elo mais fraco num conflito com estas características, acaba por ser a parte mais penalizada. Manda o pragmatismo, do qual não prescindo – e quando por causa disso sentirem que estou a mais, não será por isso que poderão continuar a fazer o que bem entenderem - que encaremos com o realismo que a política exige dos políticos, que tentemos, preferencialmente directamente – ou usando a intermediação mais adequada – lançar as sementes para posteriores boas colheitas.
Retomando a questão do PS local e particularmente a atitude de João Carlos Gouveia, ela não me surpreende, na medida em que o líder de um partido da oposição, ao aceitar ser candidato em eleições autárquicas, só o poderá ser na maior Câmara da Região, neste caso. Gouveia cometeu um erro, é isso que eu penso, de “pessoalizar” a sua perspectiva, despindo-se erradamente da condição de líder regional do PS para se refugiar numa candidatura à Câmara de S. Vicente, de onde é natural – existindo aqui o aspecto sentimental que, no entanto, não pode sobrepor-se ao da lógica política – mas correndo o risco de, em caso de um previsível desaire (aliás em tentativa anterior JCG disponha de sondagens que alegadamente o colocavam próximo de algum sucesso o que depois veio a não verificar-se), aparecerem prontamente a pedir a sua cabeça e substituição com base num argumento tão simples e facilmente aceitável: quem não ganha uma Câmara Municipal, não pode ser líder de um partido regional e candidatar-se à liderança do governo. Tal como achei despropositado e dispensável que JCG tivesse sido desmentido publicamente, depois de uma notícia sobre candidaturas autárquicas do PS, que todos perceberam ter tido como origem e fonte de informação, ele próprio.
Não me espanta por isso a notícia ontem publicada, quer quanto à contestação interna (que sobe de tom) – e que relaciono com os resultados das tais sondagens, desvalorizadas, mas que existem – quer quanto à tal estratégia de um grupo interno, organizado, e com ramificações diversas, incluindo no grupo parlamentar e nas estruturas máximas do PS madeirense, visando o derrube a curto prazo de JCG. "Dêem a cara!", explica o jornal realçando a reacção do dirigente socialista. Mas se ele próprio cometeu o erro de desvalorizar o que era evidente, e ele próprio se esquece que as principais figuras do PS regional são deputados apenas porque estão a substituir deputados eleitos que pediram a suspensão de mandato, afinal do que é que ele está à espera?
JCG fala sistematicamente no separatismo. Mas a quem importa isso? A quem interessa isso? Aos jovens que há 30 anos nem sequer eram nascidos? A uma importante faixa do eleitorado que há 30 anos tinham entre 5 e 10 anos e que nem sequer sabem do que se passou? E mais importante do que isso: os madeirenses são separatistas? Desde quando e com base em que indicadores? Porventura os madeirenses estão preocupados com essas tretas? Se o PS diz (erradamente) que os madeirenses não estão preocupados com a revisão constitucional que PSD da Madeira vai propor, por acaso julgam que o “separatismo” interessa a alguém? Gouveia não pode dar a ideia que parou no tempo, nem pode querer vestir a pele de um “salvador da pátria” que não salva coisa nenhuma. Gouveia é líder do PS, ele sabe-o melhor do que eu, porque deixaram que assim fosse, porque havia quem precisasse de ganhar tempo depois do descalabro de Maio de 2007, porque era preciso reequacionar uma nova estratégia e que, mais importante do que isso, era preciso saber o que iria suceder com Alberto João Jardim nas regionais de 2011. Lendo a notícia retive esta passagem: “ O líder diz saber que há uma tentativa interna para desestabilizar a sua Direcção, mas avisa que não voltará o PS dos anos anteriores e que não se verão livres da sua liderança empurrando-o para fora da Madeira. Daí o anúncio: João Carlos Gouveia não vai ser candidato à Assembleia da República - AR - e vai encontrar uma candidatura aberta ao partido e ao exterior". Ora aqui está algo que me surpreende, não por JCG ter demorado tempo demasiado a reconhecer publicamente (mas eu sei que se apercebeu) que lhe queriam “fazer a cama”, mas por ter tolerado que se criassem condições para que isso ocorra. JCG não tem protagonismo parlamentar nenhum, não lidera coisa nenhuma, mesmo sabendo que a Assembleia Legislativa é o principal palco do confronto político regional do qual o líder da oposição não pode estar afastado. O protagonismo dado a alguns dos seus pares ajudou, e muito, a esta situação que ele agora denuncia, ainda por cima envolvendo pessoas que perante a opinião pública não merecem qualquer credibilidade.
Constato – e nada tem a ver com o PS, embora conheça Gouveia há muitos anos, de S.Vicente, terra também de familiares meus, e porque com ele cheguei a trabalhar num projecto editorial que seria interrompido – que é o próprio JCG a acusar, coisa nunca antes vista, que “quem está a tentar desestabilizar o partido são pessoas com grandes responsabilidades de futuro (...). Eu não aceito isso". Fala de quem e refere-se a quê? Por acaso já não falei disso várias vezes neste meu espaço de opinião? Não lhe recomendei a necessidade de uma mudança de discurso e de atitude, apostando mais na defesa dos interesses da região, colocando-a acima de divergências políticas, que subsistirão? Tenho alguma dificuldade em aceitar, face ao que se foi passando neste último ano, e ao quadro que ele próprio hoje traça do PS local, que seja o próprio JCG a alegar que “no último ano, se deixou apagar para consolidar o poder interno". Mas terá consolidado mesmo? Onde? Como? Com quem? Em que estruturas? Com que solidariedades internas? Duvido".

Sem comentários: