"Já correu muita
tinta sobre a resposta de Miguel Sousa Tavares na entrevista ao Negócios. Mas,
estranhamente, não correu nenhuma sobre a pergunta. Não sobre a sua
legitimidade, mais do que natural, mas sobre a sua oportunidade. É que dois
dias depois da entrevista ser publicada, o ex-palhaço Beppe Grillo teve um
resultado desastroso nas eleições locais italianas, falhando a segunda volta
nas 16 maiores cidades de Itália. O "seu" movimento 5 estrelas, que
tinha sido o partido mais votado das últimas legislativas, foi quase reduzido a
pó. A sua insignificância foi visível por todo o lado (em Roma caiu de 27% para
12%) e nem nos locais onde o populismo tem razões para existir, Beppe Grillo
não foi a lado nenhum. Em Siena, sede do Banco Monte dei Paschi, envolvido num
gravíssimo e caríssimo escândalo financeiro, Grillo ficou pelos 8,4%. E não foi
por falta de esforço: o líder do 5 estrelas fez campanha por todo o país. Fez
campanha mas não teve frutos.
É
neste ponto que vale a pena regressar à pergunta. O problema europeu não são os
palhaços que podem aproveitar as brechas em democracias desacreditadas por uma
austeridade sem fim e por lideranças fracas e ziguezagueantes. Um palhaço como
Beppe Grillo não tem programa político, protesta mas não propõe alternativas,
sabe fazer campanhas mas não consegue governar. Pode ter momentos de glória -
como teve nas legislativas - mas depois tem dificuldade em viver com a
realidade. Grillo não conseguiu dar uma ideia para ajudar a formar governo e,
agora, os eleitores castigaram-no. Era inevitável.
O
problema europeu não são os palhaços, repito. Pelo menos literalmente. O
problema são os extremismos e os partidos antissistema que têm nesta crise um
campo de ação enorme. Esses movimentos e partidos têm ideologia e programa e os
exemplos surgem por todo o lado, da Finlândia ao Reino Unido. O modelo
social-europeu nasceu no pós-guerra por várias razões e uma delas foi a de impedir
o crescimento de movimentos extremismos, habituados a cavalgar crises
profundas. Não me lembro de algum palhaço ter feito muito mal a um país, mas
dos extremistas não posso dizer o mesmo. Foi por isso que me fixei na pergunta" (texto
de Ricardo Costa, Expresso com a devida vénia)