
Por que é tão importante a revisão dos "plafonds" para a ZFM?
- Era premente para manter as empresas que ultrapassem esses "plafonds", e que se têm revelado importantes para a região, quer pela atractibilidade de outras empresas e quer num plano de competitividade com as Canárias.
Há casos concretos de empresas que dizem que saem da ZFM quando passarem para o outro regime?
- Ainda hoje fui abordado por um grupo importante, que está a construir a maior embarcação do mundo de exploração petrolífera. Os grupos multinacionais muito grandes, e que, ao contrário do Governo da República, costumam planear a sua vida atempadamente, têm de tomar decisões. Neste momento poderá ter decisão tomada. Se essa empresa, cuja consolidação do grupo é feita na Madeira, que tem 170 trabalhadores na área administrativa, e 457 trabalhadores registados, percebe que o plafonamento sobre o qual vai incidir a tributação não é suficiente face aos resultados que atinge, naturalmente, vai repensar a sua operação.
Há tempo para alterar a situação?
- Há sempre tempo. Agora, teria sido ideal que fosse no passado. Pela cronologia das negociações e pelo histórico das anteriores, tudo indicava que as negociações iriam a bom porto e foi transmitido aos investidores um clima de confiança. E, de repente, este impasse, provocado unilateralmente pelo Ministério das Finanças e ao que se sabe pelo senhor secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que, aparentemente, fez disto uma questão pessoal ou uma qualquer teimosia que ninguém compreende.
Acha que é uma questão pessoal?
- Eu espero que não seja, seria gravíssimo que em Portugal um secretário de Estado impusesse as suas convicções ou opiniões pessoais no plano de uma relação institucional que tem de se estabelecer entre um Estado e a União Europeia e o Estado e as regiões que o compõem. Mas a verdade é que emperrou esta questão e agora há um Governo demissionário. Infelizmente não se demitiu na altura certa que era por ocasião do Orçamento do Estado. O problema poderia, se calhar, já estar resolvido se o Governo tivesse saído mais cedo. Mas mais vale tarde do que nunca e ainda bem que se demitiu.
Não têm a certeza que o novo Governo vá lutar pela ZFM em Bruxelas?
- Temos de crer que o próximo Governo, entre tantas outras questões em que tem de ser inteligente e coerente, também o seja nesta. Não pode pesar o facto de aparecer no Orçamento do Estado uma despesa fiscal de mil milhões de euros associada à ZFM. Mil milhões é muito…
- Essa receita cessante é absolutamente virtual, porque não existiria. Se não houvesse um regime fiscal mais favorável, essas empresas não estariam em Portugal a pagar a taxa normal de IRC, deslocalizariam, como já estão a deslocalizar bastantes delas para outros paraísos ou para outros centros de negócios que connosco concorrem. Quanto à inscrição no Orçamento, decorre da Lei de Enquadramento Orçamental. A abordagem mais inteligente que eu vi sobre essa matéria foi do senhor sub-director-geral para a cobrança, Dr. Jorge Soares, sobre se essa despesa não deveria ser inscrita no Orçamento da Região Autónoma da Madeira (RAM). Essa receita a ser cessante é cessante no Orçamento da RAM, que eu saiba as empresas estão sedeadas aqui. Também já ouvi o Prof. Francisco Louçã a falar de sete mil milhões de euros. Garanto-vos, e eu não represento o Governo Regional, que se fosse esse o valor que estaríamos a perder, e porque essa receita é da região, trocaria já a zona franca por sete mil milhões. Esses números não fazem sentido.
Tende a ver isto como uma divergência Governo central com o Regional?
- A não ser que nos dêem uma outra qualquer explicação, temos muitas dificuldades em compreender o bloqueio deste processo negocial. Até porque os mais altos responsáveis do Governo tinham adiantado que a situação se iria resolver. Há benefícios que a ZFM tem trazido para o País. Todas estas empresas estão a ser assessoradas, acompanhadas e geridas por grandes escritórios de advogados e consultores que até estão instalados no continente. E penso que foi um erro o fim do sector financeiro. Cá estaremos para ver.
O IVA mais baixo não é suficiente para manter muitas empresas, nomeadamente comércio electrónico?
- Neste momento não é suficiente, porque 16% é superior à que vigora em outros centros ou países. Mas há mais questões. A partir de 2015, com a alteração da sexta directiva, passará a haver uma lógica de tributação no destino. Foi a pedrada no charco. Os aumentos sucessivos no IVA. Para um investidor, o pior é a instabilidade destas questões, cria insegurança. Há factores a condicionar a competitividade da zona franca nesse capítulo.
A Madeira deveria bater-se por um IVA mais baixo?
- E bateu-se em sucessivas negociações da Lei Finanças Regionais.
Devia insistir?
- Neste momento temos uma derrogação de 30% na taxa. No meu entender, e como a Madeira propôs, a derrogação poderia ser aumentada para empresas de comércio electrónico instaladas na ZFM.
Não pode parecer um novo benefício fiscal para a Madeira, no momento em que se pedem tantos esforços?
- Não há benefício fiscal para a Madeira nem injustiça tributária comparativa com as outras regiões. O que pedimos vai constituir uma receita pública para a região. Também na ZFM o que se pretendia era mais receita. Chego a pensar se ainda subsistem algumas questões do império quando possa haver receio que a Madeira arrecade mais receita, que ganhe mais autonomia financeira. Enraizou-se no continente a ideia que se passa a vida a transferir dinheiro para a Madeira, mas se eu tiver mais receita, o Governo central até terá mais margem para negociar as transferências”
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João Machado é, actualmente, director-regional dos Assuntos Fiscais. Já foi director do Orçamento. Diz que, pessoalmente, discorda de algumas medidas de austeridade, nomeadamente a de corte nas remunerações. E deixa a questão: como se distingue pelo mérito, se há corte de salários e congelamento de promoções? Num diagnóstico rápido, João Machado considera que "o problema está na contratação pública. O Estado contrata mal e caro. Há má gestão, sobreposição de estruturas na administração pública, duplicação de funções". E apela para que não se caia na euforia das privatizações, dizendo que se fizeram vendas sem benefícios para os cidadãos”.
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