terça-feira, outubro 21, 2008

PSD/Madeira: a revisão constitucional como principal aposta

O PSD da Madeira formalizará amanhã a entrega na Assembleia Legislativa da Madeira de um extenso projecto de resolução relacionado com a Revisão Constitucional, o qual foi analisado e aprovado ontem na reunião da Comissão Política Regional do PSD, e que tem mais de 10 páginas. O documento pretende essencialmente traçar as linhas gerais das posições dos social-democatras relativamente ao processo de revisão constituicional. Sobre esta extensa iniciativa recordo apenas a parte inicial do texto a ser entregue:
"Nos termos constitucionais, a Assembleia da República a eleger o ano que vem, terá poderes para rever a Constituição. Daí que a Assembleia Legislativa da Madeira, inequívoca representação democrática da vontade dos Madeirenses e dos Portossantenses, deva formular uma proposta concreta sobre o futuro constitucional da Região Autónoma, a par das contribuições que todos, institucional ou individualmente, queiram dar.
A Constituição da República não permite que os Parlamentos das Regiões Autónomas tenham directamente iniciativa legislativa nesta matéria, junto da Assembleia da República.
Mas não impede que as Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas exprimam a sua vontade democrática através de Resolução.
Assim, começa por exprimir o seu desacordo, ao facto de «Estado», na Constituição, ser apresentado com inicial maiúscula, e as Regiões Autónomas e o Poder Local com iniciais minúsculas.
Segue-se que a expressão «Estado unitário» é desajustada.
O Princípio fundamental é o da «unidade do Estado», aliás limite material de revisão.
Além de o facto de as Regiões Autónomas disporem de Poder Legislativo próprio – ainda que extremamente cerceado – o que em boa técnica jurídica parece tornar a expressão desajustada (veja-se a doutrina do Conselho da Europa sobre «Estado regional), a verdade é que a expressão «Estado unitário» tem dado cobertura aos abusos legislativos da República sobre este território autónomo, bem como a inqualificável jurisprudência ultra-restritiva do Tribunal Constitucional.
A Constituição da República proíbe «partidos de índole ou âmbito regional».
Em termos de Princípios Democráticos, trata-se de uma limitação inaceitável aos Direitos e Liberdades dos Cidadãos, pelo que, só por si, deve ser expurgada.
Depois, ainda por cima, reforça o sistema inconveniente de partidocracia, que marca o regime português, tornando-o mais limitado e restritivo das liberdades democráticas.
Com isto de caricatura. Basta fundar um Partido – a sede em Lisboa não é exigência constitucional – que os seus estatutos não refiram qualquer laivo de «índole» ou de «âmbito» regionais, mas que de facto o seja, e já é legal!...
É um Princípio de Liberdade Democrática que está em causa, o que, só por si, fundamenta extinguir a inadmissível limitação. A matéria de Orçamento, na Constituição, deve ficar redigida em termos de acautelar o futuro das Regiões Autónomas, não apenas quanto à solidez das expectativas e Direitos legítimos na matéria, mas de forma a que a Madeira e os Açores, definitivamente e tratados por igual, não possam ser objecto de discriminações, através da instrumentalização do próprio Estado. Quanto aos Estatutos Político-Administrativos das Regiões Autónomas, as suas normas devem ter uma inequívoca hierarquia jurídica, imediatamente a seguir às normas constitucionais.
O Estatuto da Madeira tem andado a ser subvertido, com os nossos Direitos permanentemente postos em causa, de maneira arbitrária, por outras normas quaisquer do Estado e pela jurisprudência ultra-restritiva do Tribunal Constitucional. A «blindagem» dos Estatutos, nestes termos, é a única maneira de as Regiões Autónomas terem as suas legítimas expectativas jurídicas e a sua estabilidade, devidamente asseguradas. A única lei da Assembleia da República que deve poder mexer com os Estatutos, é a própria lei de revisão Destes, nos termos actualmente em vigor de iniciativa reservada às respectivas Assembleias Legislativas. O referendo constitui a principal manifestação da vontade democrática soberana do Povo. Defende-se-o, também, para as matérias constitucionalizadas. Mas, por uma razão estabilizante no País concreto que somos, propõe-se a sua não realização apenas quanto às matérias que actualmente a Constituição considera bases do próprio Estado, fixando-as, assim, como limites materiais à própria revisão, e que não são poucas:
-a independência nacional e a unidade do Estado;
-a forma republicana de governo;
-a separação das Igrejas do Estado;
-os Direitos, Liberdades e Garantias dos Cidadãos;
-os Direitos dos Trabalhadores, das comissões de trabalhadores e das associações sindicais;
-a coexistência do sector público, do sector privado e do sector cooperativo e social de propriedade dos meios de produção;
-a existência de planos económicos, no âmbito de uma economia mista;
-o sufrágio universal, directo, secreto e periódico na designação dos titulares electivos dos Órgãos de soberania, das Regiões Autónomas e do Poder Local, bem como o sistema de representação proporcional;
-o pluralismo de expressão e organização política, incluindo Partidos políticos, e o Direito de oposição democrática;
-a separação e a interdependência dos Órgãos de soberania;
-a fiscalização da constitucionalidade por acção ou por omissão de normas jurídicas;
-a independência dos Tribunais;
-a autonomia das Autarquias Locais;
-a autonomia político-administrativa dos arquipélagos dos Açores e da Madeira.
Podendo haver uma revisão da lei eleitoral da Assembleia da República, com introdução dos círculos uninominais a par de um círculo nacional único, propõe-se um aditamento que acautele o mesmo regime ser também para os Açores e a Madeira. Não deve ser exclusivo dos Partidos, a apresentação de candidaturas à Assembleia da República e às Assembleias das Regiões Autónomas. Mais uma vez, inadmissivelmente, a Constituição restringe Direitos e Liberdades dos Cidadãos. E transforma, ainda mais, a Democracia em partidocracia. A Constituição diz que perdem o mandato, os «que perfilhem a ideologia fascista». Mas não diz o que entende por «ideologia fascista». O que pode dar azo a arbitrariedades, tal como está.
Para além do ridículo de uma Constituição que pretende ser democrática, transparecer medo de «fantasmas», ao ponto de «proibir»... ideologias!...
Mas, se se trata de defender o regime democrático, então a perda do mandato tem de considerar toda e qualquer ideologia totalitária, contrária a um Estado democrático!...
Não há interesse nas «autorizações legislativas» da Assembleia da República às Regiões Autónomas. Justificam-se, por motivos práticos, no caso do Governo da República, quase sempre maioritário no Parlamento nacional. Mas não se vislumbra autorizações legislativas, ou quase nenhumas, a uma Região Autónoma cuja maioria na Assembleia Legislativa seja diferente da Assembleia da República.
O importante, de uma vez por todas, é definir o que é competência do Estado nas Regiões Autónomas, e o que é competência Destas. Sem zonas cinzentas, hibridismos ou partilhas, que vêm sendo a fonte de conflitualidades e de abusos.
Assim, deve ficar reservado à Assembleia da República, em relação aos Açores e à Madeira:
-Eleições dos titulares dos órgãos de soberania;
-Regimes dos referendos;
-Organização, funcionamento e processo do Tribunal Constitucional;
-Organização da defesa nacional, definição dos deveres dela decorrentes e bases gerais da organização, do funcionamento, do reequipamento e da disciplina das Forças Armadas;
-Regimes do estado de sítio e do estado de emergência;
-Aquisição, perda e reaquisição da cidadania portuguesa;
-Definição dos limites das águas territoriais, da zona económica exclusiva e dos direitos de Portugal aos fundos marinhos contíguos;
-Associação e partidos políticos;
-Eleições dos Deputados às Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas;
-Eleições dos titulares dos órgãos do Poder Local ou outras realizadas por sufrágio directo e universal, bem como dos restantes órgãos constitucionais;
-Estatuto dos titulares dos Órgãos de soberania e do Poder Local, bem como dos restantes órgãos constitucionais ou eleitos por sufrágio directo e universal;
-Regime das Autarquias Locais;
-Restrições ao exercício de direitos por militares e agentes militarizados dos quadros permanentes em serviço efectivo, bem como por agentes dos serviços e forças de segurança;
-Regime de designação dos membros de órgãos da União Europeia, com excepção da Comissão;
-Regime do sistema de informações da República e do segredo de Estado;
-Regime geral de elaboração e organização dos orçamentos do Estado e das Autarquias Locais;
-Regime dos símbolos nacionais;
-Regime das forças de segurança;
-Regime da autonomia organizativa, administrativa e financeira dos serviços de apoio do Presidente da República;
-Bem ainda como de reserva absoluta da Assembleia da República, e não relativa:
-Estado e capacidade das pessoas;
-Direitos, liberdades e garantias;
-Definição dos crimes, penas, medidas de segurança e respectivos pressupostos, bem como processo criminal;
-Regime geral de punição das infracções disciplinares, bem como dos actos ilícitos de mera ordenação social e do respectivo processo.
O sistema de ensino nas Regiões Autónomas deve ser específico Destas, mas com correspondência ao nacional (tal como há correspondência em relação a outros países), desde que respeitados os artigos 74º a 77º da Constituição da República.
O regime geral de elaboração e organização dos Orçamentos das Regiões Autónomas, bem como o regime de Finanças das mesmas, devem ser da competência das respectivas Assembleias Legislativas.
Devem ainda ser transferidas para a competência das Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas, as até agora seguintes reservas relativas de competência legislativa da Assembleia da República:
-Regime da requisição e da exploração por utilidade pública;
-Bases do serviço regional de saúde;
-Bases do sistema de protecção da natureza, do equilíbrio ecológico e do património cultural;
-Regime do arrendamento rural e urbano;
-Criação de impostos e sistema fiscal e geral das taxas e demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas;
-Definição dos sectores de propriedade dos meios de produção, incluindo a dos sectores básicos nos quais seja vedada a actividade às empresas privadas e a outras entidades da mesma natureza;
-Regime dos planos de desenvolvimento económico e social;
-Bases da política agrícola, incluindo a fixação dos limites máximos e mínimos das unidades de exploração agrícola;
-Regime das finanças locais;
-Participação das organizações de moradores no exercício do poder local;
-Bases gerais do estatuto das empresas públicas e das fundações públicas;
-Definição e regime dos bens do domínio público;
-Regime dos meios de produção integrados no sector cooperativo e social de propriedade;
-Bases do ordenamento do território e do urbanismo;
Mantêm-se, assim, na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, em relação às Regiões Autónomas:
-Bases do sistema de segurança social;
-Meios e formas de intervenção, expropriação, nacionalização e privatização dos meios de produção e solos por motivo de interesse público, bem como critérios de fixação, naqueles casos, de indemnizações;
-Sistema monetário e padrão de pesos e medidas;
-Organização e competência dos Tribunais e do Ministério Público e estatuto dos respectivos Magistrados, bem como das entidades não jurisdicionais de composição de conflitos;
-Associações públicas, garantias dos administrados e responsabilidade civil da Administração;
-Bases do regime e âmbito da Função Pública;
-Regime e forma de criação das polícias municipais".(...)
A iniciativa dos social-democratas termina:
"Conformemente, a Assembleia Legislativa da Madeira resolve dar poderes ao Presidente da Assembleia Legislativa, para contratar uma equipa técnico-jurídica que elabore um normativo de acordo com as ideias-bases aprovadas.
O trabalho referido, deverá estar concluído e entregue ao Presidente da Assembleia Legislativa, até 30 de Abril, a partir de quando deverá ser apreciado e eventualmente aprovado, até 30 de Junho, sob forma de Resolução, na qual também se solicite aos Deputados eleitos pela Madeira à futura legislatura da Assembleia da República, que o apresentem como projecto de revisão constitucional.
Dado que os Candidatos à Assembleia da República tomarão as suas posições, bem como os respectivos Partidos políticos, nesta matéria que é prioritária para a Região Autónoma em termos de desenvolvimento futuro, as referidas eleições permitirão ao Povo Madeirense, discutir e plebiscitar legitimamente o seu futuro, com todas as incidências nacionais e internacionais".

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