Primeira sondagem feita depois da queda do Governo aponta para um brutal aumento de indecisos, o dobro dos registados nas últimas legislativas. A incerteza é tanta entre eleitores da AD como do PS. O caso da empresa familiar de Luís Montenegro levou o primeiro-ministro a acionar a sua própria bomba atómica sem ter como medir o risco: como iria a população reagir a mais uma ida às urnas, sobretudo à boleia de um caso que atinge diretamente a sua imagem? A primeira sondagem feita depois do debate da moção de confiança que ditou a queda do Governo (realizada pelo ICS/ISCTE para o Expresso e a SIC, com trabalho de campo realizado entre 12 e 17 de março) mostra a AD na frente, com 20% de intenção de voto direta, surgindo à frente do PS, que se fica pelos 15%. Problema: os eleitores que dizem não saber em quem votar atingem um absoluto recorde — são 39%.
A cinco pontos percentuais da AD, o PS de Pedro Nuno Santos não parece sair beneficiado da crise política. A “culpa” pela crise, de resto, é repartida a meio: 37% acham que a responsabilidade é “mais do Governo”, 37% dizem que é sobretudo da oposição. Em terceiro lugar aparece o Chega, com 9% de intenção de voto direta (isto é, sem a habitual distribuição de indecisos), seguindo-se a IL com 4%. Os restantes partidos — CDU, Livre e BE — aparecem com apenas 1% de intenção de voto direta, com os autores do estudo a sublinhar que houve outros partidos também mencionados, como o PAN, mas em número insuficiente para chegar a 1%. É esta a fotografia do momento, tirada imediatamente a seguir à queda do Governo. Seguem-se quase dois meses de campanha.
Indecisos disparam
Com uma amostra de 802 entrevistas consideradas válidas, feitas excecionalmente pelo telefone, são muitos mais (39%) os que dizem que não sabem em quem vão votar do que os que, somados, admitem votar na AD e no PS. Trata-se de “um valor extremamente elevado, mesmo tendo em conta que este inquérito foi aplicado telefonicamente e não com recurso à habitual simulação do voto em urna”, notam os autores do estudo, realizado e coordenado por uma equipa do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e do ISCTE, com trabalho de campo realizado pela GfK Metris. Pela especificidade do momento e por esta sondagem ter por base uma metodologia diferente do habitual — a última vez que recorreu a entrevistas telefónicas, e não presenciais, foi durante a pandemia de covid-19 — não é feita uma comparação direta com sondagens anteriores, e devido ao elevado número de respostas “não sabe/não responde” não é feita também uma projeção dos votos dos indecisos.
Os que ainda não sabem em quem votar vão ser, assim, centrais na campanha eleitoral que se avizinha, que não deixará também de ser sobre quem terá maior capacidade de mobilizar os seus. Há precisamente um ano, no final de fevereiro de 2024, a duas semanas da ida às urnas, a sondagem do ICS/ISCTE para o Expresso e a SIC dava 18% de indecisos, com estes a representarem a terceira maior fatia de respostas, atrás da AD e do PS e à frente dos 17% atribuídos ao Chega. Agora, os indecisos mais do que duplicaram. Em 2022, na última sondagem das legislativas que deram maioria absoluta ao PS de António Costa, o PS aparecia dois escassos pontos à frente do PSD de Rui Rio, dentro do empate técnico, e o resultado foi bem diferente. Um estudo pós-eleitoral mostrou, na altura, que 14% dos eleitores foram indecisos até ao fim e só decidiram o voto no dia das eleições, e 9% apenas decidiram nas duas semanas de campanha eleitoral oficial. Foram, por isso, os indecisos que fizeram o jogo virar.
AD e PS em espelho
Nenhum dos principais partidos, porém, escapa à vaga de indecisos: 25% dos que votaram na AD há um ano admitem agora não saber em quem votar, enquanto 29% dos que escolheram o PS dizem agora que não sabem se vão manter o voto. Entre os que votaram no Chega, entretanto atingido por várias polémicas, os indecisos representam também um quarto do eleitorado. Os três partidos, de resto, parecem segurar a mesma base de fiéis (65% dos que votaram na AD há um ano dizem que vão votar outra vez, no PS a base é de 61% e no Chega de 60%) e os três mostram um número residual de arrependidos: entre 5 a 7% dos respectivos eleitorados admitem mudar para outro partido.
Um dado que parece sorrir a Montenegro é o da perceção. Questionados sobre quem acham que vai ganhar as eleições antecipadas, 33% dos inquiridos apontaram a AD e só 19% apostam numa viragem para o PS. E 77% duvidam que algum partido consiga vencer com uma maioria absoluta. Depois de oito anos de Governo PS e com o PSD ainda sem ter aquecido o lugar, a maioria acha que estas eleições vão ser apenas baralhar e dar de novo. Mas registe o alerta dos que trabalharam a sondagem: “Estes valores não devem ser vistos como tendo valor preditivo em relação ao que possa vir a ser o comportamento dos eleitores nas eleições de 18 de maio”. A campanha só começa agora.
FICHA TÉCNICA
Sondagem telefónica cujo trabalho de campo decorreu entre os dias 12 e 17 de março de 2025. Foi coordenada por uma equipa do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS-ULisboa) e do ISCTE — Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE-IUL), tendo o trabalho de campo sido realizado pela GfK Metris. O universo da sondagem é constituído pelos indivíduos com idade igual ou superior a 18 anos e capacidade eleitoral ativa, residentes em Portugal. Os números fixos, cerca de 33% do total, foram extraídos aleatoriamente, proporcionalmente à distribuição por prefixos no território. Os números móveis, cerca de 66% do total, foram extraídos aleatoriamente, proporcionalmente à distribuição por operadoras. Os respondentes foram selecionados através do método de quotas, com base numa matriz que cruza as variáveis Sexo, Idade (3 grupos), Instrução (3 grupos) e Região (9 Regiões NUTS II 2024). A informação foi recolhida através de entrevista telefónica, pelo sistema CATI (Computer Assisted Telephone Interviewing). Foram contactados 5397 números de telefone elegíveis (correspondentes a indivíduos pertencentes ao universo) e obtidas 802 entrevistas válidas (taxa de resposta de 15%, taxa de cooperação de 22%). O trabalho de campo foi realizado por 31 entrevistadores, que receberam formação adequada às especificidades do estudo. Todos os resultados foram sujeitos a ponderação por pós-estratificação de acordo com a frequência de prática religiosa e a pertença a sindicatos ou associações profissionais dos cidadãos portugueses com 18 ou mais anos residentes em Portugal, a partir dos dados da vaga mais recente do European Social Survey (Ronda 11). A margem de erro máxima associada a uma amostra aleatória simples de 802 inquiridos é de +/- 3,5%, com um nível de confiança de 95%. Nas páginas seguintes, todas as percentagens são arredondadas à unidade, podendo a sua soma ser diferente de 100%. (Expresso, texto da jornalista Rita Dinis e da jornalista infográfica Sofia Miguel Rosa)
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