quinta-feira, março 03, 2016

Tribunal de Contas Europeu demolidor acusa: A Comissão Europeia geriu a crise financeira de uma forma "geralmente insuficiente"

De acordo com um novo relatório do Tribunal de Contas Europeu, a Comissão não estava preparada para os primeiros pedidos de assistência financeira durante a crise financeira de 2008 porque os sinais de alerta tinham passado despercebidos. Os auditores constataram que a Comissão conseguiu efetivamente gerir os programas de assistência que deram origem a reformas, apesar da sua falta de experiência, e destacam um conjunto de resultados positivos.
Porém, assinalam igualmente vários domínios que suscitam preocupação quanto à forma "geralmente insuficiente" como a Comissão geriu a crise, designadamente o tratamento desigual dos países, o controlo de qualidade limitado, um acompanhamento insuficiente da execução e lacunas na documentação.
"Os efeitos da crise ainda hoje se fazem sentir, e os programas de empréstimo que dela resultaram já ascenderam a milhares de milhões de euros," declarou Baudilio Tomé Muguruza, o Membro do Tribunal de Contas Europeu responsável pelo relatório. "Por isso, é imperativo que aprendamos com os erros cometidos."
Os auditores analisaram a gestão, por parte da Comissão, da assistência financeira prestada a cinco Estados-Membros (Hungria, Letónia, Roménia, Irlanda e Portugal), tendo concluído que esta logrou assumir as suas novas funções de gestão, o que afirmam ter-se tratado de um feito, atendendo às restrições de tempo. À medida que a crise avançava, a Comissão recorreu cada vez mais aos seus conhecimentos especializados internos e empreendeu esforços junto de um amplo leque de intervenientes nos países que pediram ajuda. Reformas posteriores introduziram igualmente uma maior supervisão macroeconómica.
Embora destaque um conjunto de resultados positivos importantes, o relatório de auditoria pormenorizado assinala quatro domínios principais que suscitam preocupação quanto à forma como a Comissão geriu a crise, sendo eles as diferentes abordagens utilizadas, o controlo de qualidade limitado, um acompanhamento insuficiente e lacunas na documentação.
Resultados positivos importantes: os auditores observaram que os programas alcançaram efetivamente os seus objetivos. As metas do défice revistas foram cumpridas na sua maioria. Os défices estruturais melhoraram, ainda que com ritmos variáveis. Os Estados-Membros cumpriram a maioria das condições estabelecidas nos respetivos programas, apesar de alguns atrasos. Os programas lograram dar origem a reformas. Os países prosseguiram, em grande parte, com as reformas desencadeadas pelas condições dos programas e, em quatro dos cinco países, o ajustamento das transações correntes foi mais rápido do que previsto.
Abordagens diferentes: os auditores encontraram diversos exemplos de países que não foram tratados da mesma forma num cenário comparável. Em alguns programas, as condições da assistência foram menos rigorosas, o que facilitou o seu cumprimento. As reformas estruturais exigidas nem sempre foram proporcionais aos problemas enfrentados ou seguiram percursos muito diferentes. Algumas das metas do défice dos países foram objeto de uma redução superior àquilo que a respetiva situação económica, em princípio, justificaria.
Controlo de qualidade limitado: a revisão dos principais documentos pelas equipas dos programas da Comissão revelou-se insuficiente em vários aspetos. Os cálculos subjacentes não foram revistos por um técnico exterior à equipa, o trabalho dos especialistas não foi examinado em pormenor e o processo de revisão não foi bem documentado.
Acompanhamento insuficiente: a Comissão utilizou metas do défice com base na contabilidade de exercício, cujo cumprimento só pode ser observado após um determinado período de tempo. Este processo garante a coerência com o procedimento relativo aos défices excessivos, mas implica que ao ser tomada uma decisão sobre a continuação de um programa, a Comissão não pode informar com segurança se um Estado-Membro cumpriu realmente a meta.
Lacunas na documentação: a Comissão recorreu a uma ferramenta de previsão já existente e deveras complexa, baseada em folhas de cálculo. A documentação não estava organizada de modo a permitir recuar no tempo para avaliar as decisões tomadas. A disponibilidade dos registos melhorou, mas até os programas mais recentes tinham alguns documentos essenciais em falta. As condições previstas nos memorandos de entendimento nem sempre incidiram suficientemente nas condições gerais de política económica estipuladas pelo Conselho.
O Tribunal de Contas Europeu recomenda que a Comissão Europeia:
• estabeleça um quadro aplicável a toda a instituição para permitir uma rápida mobilização dos seus recursos humanos e conhecimentos especializados caso surja a necessidade de um programa de assistência financeira;
• submeta o seu processo de elaboração de previsões a controlos de qualidade mais sistemáticos;
• reforce a manutenção de registos, à qual deverá prestar atenção nos exames da qualidade;
• assegure procedimentos adequados de revisão da qualidade da gestão e do conteúdo dos programas;
• inclua, nos memorandos de entendimento, variáveis que pode recolher com desfasamentos temporais curtos;
• distinga as condições em função da sua relevância e centre-se nas reformas verdadeiramente importantes;
• formalize nos programas a cooperação interinstitucional com os outros parceiros;
• torne o processo de gestão da dívida mais transparente;
• analise de forma mais aprofundada os principais aspetos do ajustamento dos países após o encerramento dos programas (fonte: TCE)

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