Praia era limpa e pedras eram retiradas, situação que
não aconteceu este ano. Geólogos defendem que as pedras na linha do mar, mesmo
prejudicando turismo, são "o que sustenta a praia". As pedras que mancham a imagem da praia de areia
dourada do Porto Santo, que tem uma extensão de nove quilómetros e é o 'ex-libris'
local, está a provocar reclamações de muitos visitantes daquela ilha do
arquipélago da Madeira.
Neste verão, no Porto Santo, "soube que houve
reclamações junto à Câmara e unidades hoteleiras, pelo facto de as pessoas
terem 'comprado' uma praia com um determinado tipo de fotografia e chegaram lá
e constataram outro tipo de realidade", disse à agência Lusa o geólogo e
investigador madeirense João Baptista. Este investigador apontou que até "foram pedir ao
presidente da Câmara se podia retirar a pedra" depositada em algumas zonas
da praia de areia amarela fina, que é o principal atrativo desta ilha, que nos
meses de verão chega a quintuplicar a sua população de cerca de 5.000
habitantes e aposta cada vez mais no turismo.
"Acabaram por ser poucas [as queixas] no vasto
universo de visitantes do Porto Santo num verão que foi um dos melhores de
sempre", disse, por sua vez, o presidente da Câmara Municipal do Porto
Santo, Filipe Menezes de Oliveira.
Segundo o autarca, muitas pessoas "desconhecem a
dinâmica" da praia, pois existem muitas outras zonas utilizáveis,
salientando que esta situação "não coloca em causa a qualidade [do
areal]". Confrontado com as queixas, o secretário regional da
Economia, Turismo e Cultura, Eduardo Jesus, desvalorizou a situação, afirmando
que "as pessoas que viajam para destinos de natureza têm a perfeita noção
da dinâmica que acontece, com as marés, com a própria evolução da duna e da
areia".
"Não me parece que isto constitua qualquer
preocupação do ponto de vista de uma publicidade enganosa", com base na
promoção feita com a imagem daquela praia "toda dourada", vincou.
Para o geólogo João Batista, "a carga sólida que
está na praia é precisa, porque esses calhaus e o próprio lajedo são o
esqueleto, o que sustenta a praia". Reconheceu, no entanto, que "foi
uma asneira" limpar o areal noutras alturas.
Segundo o investigador, "a praia está num regime
altamente deficitário, porque tirou-se e nunca se repôs" a areia e vários
estudos apontam existir uma "perda útil da secção de praia útil aos
banhistas". O areal do Porto Santo, em 2012, venceu o concurso das sete
maravilhas de Portugal, na categoria de praia de dunas.
O geólogo destacou, também, que o surgimento de pedras
junto à linha de mar está também relacionado com "variações, às vezes
sazonais", e "basta mudar o regime do vento" para acontecer
"uma engorda da praia e as pedras ficarem cobertas".
João Batista acrescentou, porém, que isto não é um
simples "areia vai ou vem", sustentando que "as pessoas têm de
interiorizar que é um recurso natural, não é renovável, estratégico para o
desenvolvimento sustentável do Porto Santo, sendo a praia o motor impulsionador
de toda a economia da ilha". Sobre as causas desta situação, disse serem
"múltiplas", como a construção do porto de abrigo, a extração de
inertes para vários fins, como a construção de hotéis, que provocaram
"perturbações no próprio cordão de mar" e o grande desastre do
derrame de crude ocorrido em janeiro de 1990. O pisoteio constante das dunas, a má utilização que as
pessoas fazem destas áreas ou o elevado número de acessos à praia também
contribuem para agravar o problema, frisou o investigador.
Em termos de intervenção, João Batista é de opinião
que não é possível "atacar a praia na sua totalidade", defendendo uma
ação faseada, por setores, para reposição de areia com recurso a bancos de
dunas terrestres ou marinhos, argumentando que as causas devem ser
individualmente analisadas e delineadas soluções específicas. Primordial, no seu entender, é a classificação daquela
da praia como geomonumento, de interesse local, regional e nacional, o que
permitiria um outro tipo de intervenção e de garantias para a sua preservação.A Secretaria do Ambiente e Recursos Naturais da
Madeira assegurou, entretanto, estar a "acompanhar atentamente a
situação", resultante "da dinâmica sedimentar anual da praia, com
base na agitação marítima dominante". Este gabinete do Governo Regional revelou, ainda, que
pretende "promover um fórum de debate com vários especialistas para
discutir o fenómeno", com vista ao surgimento de "elementos
cientificamente válidos, que permitam delinear uma correta estratégia de
intervenção, que não crie desequilíbrios na Natureza" (DN-Lisboa, Lusa)
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