quinta-feira, janeiro 02, 2014

Novo Orçamento do Estado com a mesma austeridade

Diz o Dinheiro Vivo que "em 2014, o país assistirá ao fim do atual programa de resgate, sem que saiba ainda exatamente como irá ser este período pós-troika. Mas independentemente de a solução passar por um segundo programa, um cautelar ou uma saída mais à irlandesa, a generalidade dos portugueses não sentirá que a sua vida vai melhorar face a 2013. Esperam-se subidas de preços em vários bens e serviços e a generalidade dos funcionários públicos irá ter uma redução de salário - alguns pela primeira vez, outros de forma mais acentuada do que aquela que até agora lhes foi imposta. Ao contrário do que sucedeu em 2013, em que se verificou um “enorme aumento de impostos”, o Orçamento do Estado para 2014 vai mais pelo lado da despesa, em que se propõe cortar cerca de 3,18 mil milhões de euros, e menos pelo lado da receita fiscal. As contas do OE apontam, ainda assim, para uma subida de 410 milhões de euros de receita fiscal, a que se somam mais 168 milhões de euros em acréscimos do lado das contribuições sociais. Do lado da despesa, os funcionários e os reformados e pensionistas surgem, mais uma vez, como os maiores visados pelos cortes que estão previstos e que, de novo, são apresentados como temporários de forma a contornar eventuais chumbos do Tribunal Constitucional (TC). Mas esta forma de apresentar o novo modelo de cortes salariais e de repetir a Contribuição Extraordinária de Solidariedade (que fica novamente ativa na sequência do veto do TC à convergência das pensões) não garante que estas medidas passem no crivo daqueles juízes. Mais certo é que estes e outros artigos do OE vão parar ao TC, porque mesmo que o Presidente da República não suscite a fiscalização sucessiva da constitucionalidade, os partidos da oposição já sinalizaram que o farão. Mas até que haja uma decisão do TC (em 2013, esta foi conhecida no início de abril), é com as regras do OE que entra em vigor no início de janeiro que famílias e empresas vão ter de lidar.
E muitas mudanças se perfilam.
Cortes nos salários da FP - Os salários dos funcionários públicos vão ficar sujeitos a um novo esquema de cortes já a partir de janeiro, que abrangerá todos os que ganham mais de 675 euros brutos por mês. A redução prevista no OE estabelece que os cortes começam em 2,5%, aumentando até aos 12%, sendo este o corte aplicável a todos os que auferem mais de 2000 euros brutos. Esta medida permitirá reduzir em mais cerca de 620 milhões de euros a despesa com salários na função pública, que se somarão aos cerca de 400 milhões que já eram poupados com o anterior esquema de cortes salariais, que está a ser aplicado desde 2011 e que abrange quem ganha mais de 1500 euros por mês. A proposta do OE previa inicialmente que os cortes começassem a partir dos 600 euros, mas durante a discussão na Assembleia da República os partidos da maioria apresentaram uma proposta para que o patamar subisse para os 675 euros por mês. Entre funcionários públicos e trabalhadores de empresas públicas, este corte abrange cerca de 600 mil pessoas, deixando de fora um universo de 140 mil. Esta é uma das medidas controversas que deverão ser sujeitas ao escrutínio do Tribunal Constitucional.
Subida da ADSE - As contribuições para a ADSE tiveram um aumento de 1,5% para 2,25% durante o segundo semestre de 2013 e irão voltar a subir a partir de janeiro, passando para 2,5%. Traduzindo em valores, este aumento fará que uma pessoa que ganha 990 euros por mês, e que agora desconta 22,75 euros, irá passar a pagar 24,75 euros por mês em 2014. As contribuições para a ADSE abrangem também os reformados da Caixa Geral de Aposentações e são devidas 14 vezes por ano, ou seja, aplicam-se também sobre os subsídios de férias e de Natal.
Requalificação - A lei que veio transformar a mobilidade especial em requalificação já está em vigor e a aplicar-se aos cerca de mil trabalhadores que estão neste regime, mas o seu efeito deverá começar a sentir-se de forma mais significativa nos próximos meses, quando o seu quadro começar a receber novos funcionários públicos. E quem for colocado em requalificação deve preparar-se para ganhar menos, já que este regime prevê o pagamento de 60% do salário durante os primeiros 12 meses e 40% a partir daí, se não conseguir uma recolocação num serviço. Destas percentagens nunca pode resultar um máximo de 1257 ou 838 euros e um mínimo de 485 euros mensais.
Taxa sobre as pensões - Em 2014, os pensionistas com reformas acima dos 1350 euros vão continuar a pagar a Contribuição Extraordinária de Solidariedade. Se a convergência das pensões tivesse passado na apreciação do Tribunal Constitucional, em 2014 a CES seria paga pelos reformados da Segurança Social e de fundos privados, mas os da Caixa Geral de Aposentações ficariam de fora quase na sua totalidade porque as suas pensões iriam sofrer um corte de 10%. Como a norma que previa este corte das pensões da CGA não passou, a CES aplica-se da mesma forma e nos mesmos moldes que em 2013. Esta taxa é progressiva, prevendo-se um corte direto de 10% quando a pensão ultrapassa os 3750 euros por mês. A receita da CES ascende a 430 milhões de euros.
Pensões de sobrevivência - A partir de 2014, quem acumule uma pensão de reforma com uma de sobrevivência verá esta última sofrer um corte, se a soma das duas ultrapassar os 2000 euros brutos por mês. As pensões de sobrevivência são pagas aos viúvos e órfãos correspondendo, no caso da Segurança Social, a cerca de 60% da pensão a que o seu titular teria direito. No regime da CGA, o cônjuge sobrevivo e os órfãos recebem o equivalente a 50% daquela pensão. Com esta medida o Governo espera poupar 100 milhões de euros em 2014, mas o seu alcance poderá ser alargado nos próximos anos, uma vez que não está descartada a hipótese de mais tarde virem a ser tidos em conta outros tipos de rendimentos para além das pensões.
Subsídio de Natal
Em 2014, os funcionários públicos e os pensionistas vão receber os subsídios de férias e de Natal, mas este último será pago em duodécimos. Esta solução permite “amortecer” o efeito que a subida do IRS e a sobretaxa deste imposto tiveram nos salários em 2013 e vão continuar a ter em 2014. Desta vez não se esperam acertos de IRS concentrados num determinado mês, como aconteceu em 2013, porque as tabelas de retenção na fonte serão à partida ajustadas para 14 meses de salários/pensões. Do lado dos privados, as empresas podem manter em 2014 o regime de pagamento de 50% destes subsídios em prestações mensais.
Rescisões por mútuo acordo
Ao longo de 2014, o Governo deverá insistir nos programas sectoriais de rescisões por mútuo acordo, tentando por esta via reduzir o número de funcionários públicos. Na calha, para arrancar em janeiro, está já um novo programa dirigido aos quadros mais qualificados do Estado, os técnicos superiores. E em abril deverá registar-se uma segunda edição de rescisões amigáveis para os assistentes técnicos e operacionais.
Baixas e desemprego - Quem ficar de baixa por doença em 2014 irá pagar uma taxa de 5% sobre o valor que receber e os desempregados verão o seu subsídio encolher 6%. Estas taxas já estiveram em aplicação em 2013 depois de a medida ter sido reformulada e ter passado a assegurar que, da aplicação destes 5% e 6% não resultaria um valor inferior ao mínimo que a lei estabelece para estas duas prestações contributivas. Já os casais em que ambos os elementos estão no desemprego e têm filhos menores a cargo manterão a majoração de 10% no valor do seu subsídio de desemprego.
IRS - Os partidos da maioria ainda tentaram reduzir em meio ponto percentual a sobretaxa de 3,5% do IRS, mas o rombo que essa descida teria na receita fez que a medida não passasse. Por este motivo, em 2014, a generalidade dos rendimentos que excedem os 485 euros do salário mínimo continuarão a pagar este extra do IRS.
IVA - Ao contrário das expectativas do sector, restaurantes e hotelaria (na parte não referente a alojamento) vão continuar com uma taxa de 23%. Mais uma vez, a perda de receita associada à redução desta taxa do imposto falou mais alto e impediu qualquer mudança.
Tabaco - O tabaco vai ficar mais caro e os fumadores encontram cada vez menos alternativas mais baratas. No essencial, o imposto sobre o tabaco de corte fino (para cigarros de enrolar) vai subir cerca de 33% (para 0,12 euros por grama), enquanto nos cigarros se prevê uma subida de 9,5%. Charutos e cigarrilhas vão também ficar mais caros, porque o objetivo é aproximar os níveis de tributação dos vários produtos “de modo a evitar efeitos substitutivos” de uns por outros.
Carros - Quem tem carros a gasóleo deve preparar-se para pagar mais de Imposto Único de Circulação em 2014, já que este sofre uma atualização de 1% e implicará um agravamento entre 1,39 e 68,85 euros.
Taxa de audiovisual - A taxa é cobrada na conta da eletricidade, mas é o Orçamento do Estado que a define e para 2014 o Governo decidiu que deveria passar de 2,38 euros para 2,65 euros, o que equivale a um agravamento de 27 cêntimos por mês.
IRC - Em 2014, a taxa do imposto que incide sobre os lucros das empresas vai baixar de 25% para 23%. Este imposto sofrerá ainda neste próximo ano várias mudanças na sequência da reforma que foi acordada entre os partidos da maioria e o PS. Há a criação de um regime simplificado para as pequenas empresas; a aplicação de uma taxa reduzida (17%) de IRC para os lucros inferiores a 15 mil euros e um agravamento da derrama estadual para os lucros acima dos 35 milhões de euros.
Idade da reforma - Atingir a chamada idade da reforma completa vai exigir um prolongamento da vida ativa em 2014, uma vez que será necessário ter 66 anos para que seja possível aceder à reforma. Este aumento da idade é uma consequência do agravamento do factor de sustentabilidade (que indexa a idade da aposentação à esperança média de vida). Em 2015, segundo afirmou já o ministro da Segurança Social, Pedro Mota Soares, manter-se-ão os 66 anos, indo a partir desse ano a idade da reforma “acompanhar” a subida do factor de sustentabilidade, que passa a ter por referência o ano 2000 e não 2006. Mas as pessoas que no final de 2013 reuniam já condições para se reformar (65 anos de idade) poderão fazê-lo com base nas regras então em vigor, mesmo que peçam a reforma mais tarde, já em 2014. Ao mesmo tempo, as carreiras contributivas mais longas terão um bónus que permite abater tempo na idade de acesso à reforma, nunca podendo esta ser inferior aos 65 anos. A todo este conjunto de mudanças que constam do Orçamento do Estado ou de diplomas que entrarão em vigor em 2014 (como é o caso da reforma do IRC), as famílias devem somar vários aumentos nas contas de luz, telecomunicações e transportes.
Eletricidade e gás - A Entidade Reguladora do Sector Energético (ERSE) definiu para 2014 aumentos de 2,8% na conta da eletricidade das chamadas tarifas transitórias. Os consumidores que já passaram para o mercado liberalizado deverão também contar com contas mais pesadas a partir de janeiro, já que por regra estes comercializadores seguem o que se passa no mercado transitório. No gás, apenas se esperam mudanças em julho, ainda que possam registar--se ajustamentos nos preços antes disso na sequência da cobrança das taxas de ocupação do subsolo definidas pelas autarquias.
Telecomunicações - A inflação esperada para 2014 ronda 1%, mas a conta do telefone, telemóvel ou televisão vai subir mais e já a partir de janeiro, tendo a PT e a Zon Optimus já anunciado subidas na casa dos 2%, ainda que tenham optado por manter inalterados os preços dos pacotes quádruplos (voz fixa e móvel, internet e TV).
Pão e leite - Estes dois produtos essenciais deverão manter-se com os mesmos preços de 2013, de acordo com as estimativas das respetivas associações sectoriais. Para que os preços não subam, deverá observar-se uma redução das margens da indústria.
Transportes - O preço dos transportes públicos vai aumentar, em média, 1% em janeiro de 2014, em linha com a inflação prevista no Orçamento do Estado. Este ajustamento tarifário irá estar em vigor a partir do início do ano e segue-se a uma subida de 0,9%, neste ano, e de 5%, em 2012.
Portagens - O preço das portagens vai manter-se inalterado em 2014 face aos preços praticados em 2013. Para esta decisão terá também contribuído a perda de tráfego nas autoestradas devido à crise".