Escreve o jornalista do Jornal I, Filipe Paiva Cardoso que “a estratégia
de nivelamento salarial por baixo permite que governo evite reformas
estruturais. Salário líquido de 510? passa a 497? Os cortes transitórios nos
salários públicos vão atirar a despesa com pessoal do Estado para níveis bem
abaixo dos praticados na União Europeia. Se este ano, fruto da redução de 600
milhões de 2012 para 2013, os gastos do Estado com os seus trabalhadores já
ficaram ligeiramente abaixo da média europeia, com os cortes cegos do próximo ano
a diferença aprofunda-se ainda mais: se a norma europeia é dedicar 10,7% do PIB
às despesas com pessoal, Portugal, no próximo ano, vai dedicar apenas 9,5%. Os cortes salariais na função pública impostos pelo governo para
2014 começam logo a partir dos 600 euros brutos, com um corte de 2,5%. Isto
traduzido em termos práticos implica que um trabalhador do Estado ou de
empresas públicas que ganhe 620 euros brutos, cerca de 510 euros líquidos, vai
receber um salário bruto de 605 euros a partir de Janeiro, o que lhe dará 497
euros líquidos ao final de cada mês, menos 13 euros - nestes cálculos não foram
considerados os duodécimos, já que estes deturpam o salário mensal real. Segundo a proposta do Orçamento do Estado para 2014, anteontem
apresentada, o governo PSD/CDS prevê gastar 15,7 mil milhões de euros em
pessoal no próximo ano, valor que compara com os 17,5 mil milhões previstos
durante este ano. Considerando a subida do PIB prevista pelo executivo para o
próximo ano - de 0,8%, o que elevará o produto da economia nacional para 166,7
mil milhões de euros -, o total das despesas com trabalhadores em 2014 ficará
com um peso de 9,5% face ao PIB. Um valor que compara com os 10,6% deste ano -
17,5 mil milhões em despesas com pessoal para um PIB de 165,4 mil milhões de
euros.
Se olharmos para a norma europeia, constatamos que, tal como já
ocorre no sector privado, agora chegou a hora de os funcionários públicos
deixarem de receber conforme os padrões europeus. Na Europa a 27, a média das
despesas com pessoal é de 10,7% do PIB, valor que na zona euro desce
ligeiramente, para 10,5%. Considerando os 27 individualmente, o peso das
despesas com pessoal em relação ao PIB em Portugal baixará da 15.a posição de
2013 para a 20.a em 2014 - Eslováquia, Alemanha, República Checa, Luxemburgo,
Roménia, Bulgária ou Letónia serão os países que continuarão com um rácio
inferior ao português. "As iniciativas propostas pelo governo têm como
princípio global a equidade entre os trabalhadores do sector público e os do
sector privado", refere o executivo no relatório que acompanha o OE.
Considerando que esta equidade passa por cortes até 12% nos salários, o caminho
da igualdade de PSD/CDS é o nivelamento por baixo. A estratégia de esmagar os rendimentos pagos em Portugal está a
ocorrer independentemente de o país já em 2010 ter os salários bem abaixo dos
padrões europeus: um estudo da Adecco publicado em Maio deste ano mostrou que
ainda antes da chegada da troika o salário bruto mensal em Portugal era de 1078
euros, um valor que compara com a média de 1936 euros mensais brutos na União
Europeia - ou seja, na Europa ganhava-se em média mais 80%”