Li no DN de Lisboa que os “alemães e ingleses foram os
que mais desinvestiram em dívida pública portuguesa, agravando as taxas de juro
da República, à medida que a crise política fermentava em Portugal, nos meses
de maio e junho, para atingir o seu ponto mais agudo no mês seguinte, com as
demissões de Vítor Gaspar e Paulo Portas, na altura, número dois e três do
Governo, respetivamente. Os números que foram ontem desvendados pela Agência de
Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública ( IGCP), na nova apresentação para
investidores estrangeiros ( setembro de 2013), mostram que, só em maio, o Reino
Unido vendeu, em termos líquidos ( já descontando as compras), mais de mil
milhões de euros em títulos, valor que se situou em cerca de 800 milhões no mês
seguinte. Em junho, a fúria vendedora seria reforçada pelos investidores
alemães, que desfizeram- se de 450 milhões de euros em obrigações e bilhetes do
Tesouro. A Alemanha foi o segundo país que mais penalizou as taxas de juro
portuguesas, nesse mês. Em meados de maio, os juros rondavam os 5,3%; em junho
chegaram aos 7%. Os norteamericanos também contribuíram para a subida. A puxar
em sentido contrário estiveram os investidores nacionais, essencialmente bancos
e fundos domiciliados no país, que, em termos líquidos, compraram (
emprestaram) perto de 250 milhões de euros em dívida soberana em maio e cerca
de 800 milhões no mês seguinte. Nas alturas de maior aperto e instabilidade,
são tradicionalmente os operadores de mercado nacionais que sustentam a dívida
do Estado. Os bancos, por exemplo, continuam a precisar desses títulos nos seus
balanços para terem acesso aos programas do Banco Central Europeu. Em
contrapartida, a dívida portuguesa é bastante apetecível pois dá taxas de
rendibilidade bastante elevadas em todos os prazos, quando comparada com os
casos mais próximos, como os de Irlanda ou Espanha. Assim, desde janeiro que os
fluxos líquidos dos investidores portugueses são consecutivamente positivos,
mês após mês. Na última emissão sindicada de obrigações do Tesouro a 11 anos,
de 7 de maio deste ano, apesar de os estrangeiros terem dominado o leilão, os
investidores portugueses já ficaram com 14% do total emitido, o dobro face à
primeira emissão sindicada deste ano ( uma obrigação a cinco anos lançada ainda
no mês de janeiro). No entanto, ilustra o IGCP na apresentação, o interesse dos
operadores nacionais não é suficiente para contrariar o declínio global nos
fluxos dos investidores “não domésticos”. Em junho, o afastamento destes
atingiu o pior nível desde maio de 2012, quando o País se encontrava numa crise
orçamental profunda. Vários operadores de mercado ouvidos pelo Dinheiro Vivo
apontam, essencialmente dois fatores que ajudam a explicar esta fuga à dívida
portuguesa: a noção de que o BCE poderá tentar acompanhar a Reserva Federal
americana na descontinuação dos instrumentos de alívio monetário ( dinheiro
barato para os bancos), mas também o crescendo da crise política que marcou
maio e junho e rebentou com estrondo em julho. A envolver tudo isto, está o
facto de a economia continuar totalmente apática e de os níveis de dívida
parecem incomportáveis aos olhos desses investidores. A maioria não vê no país
capacidade para sair da crise, passando a crescer 2%, 3% ou 4% ao ano em termos
reais. Aliás, foi o próprio Presidente da República, a 25 de abril, que nomeou
o problema latente: “Portugal não está em condições de juntar uma grave crise
política à crise económica e social em que está mergulhado.” Em maio, o
atualmente vice- primeiro- ministro, Paulo Portas, diria acerca da taxa
especial sobre as pensões anunciada por Passos Coelho: “O primeiro- ministro
sabe e creio ter compreendido. Esta é a fronteira que não posso deixar passar.”
Em junho, seria publicado o resultado da sétima avaliação da troika, com
diagnósticos muito críticos, sobretudo do lado do FMI. O clima de tensão,
escrutinado diariamente pelos investidores, teria o seu auge em julho com o
anúncio da saída “irrevogável” de Portas do Governo”.