domingo, setembro 20, 2009

Escândalos da democracia: Uma lista de espionagem nada secreta

"Ninguém pediu a lista, mas a lista não só foi elaborada como apareceu na edição de 28 de Maio de 1999 do semanário "O Independente". O relatório continha dados sobre operações efectuadas pelo recém-criado SIEDM (Serviço de Informações Estratégicas de Defesa e Militares), antepassado do actual SIED, entre 1997 e Abril de 1999, assim como a identidade, os estudos, o cargo e o país de colocação de todos os funcionários dos serviços secretos.A simples existência da auditoria foi classificada como "crime de lesa-pátria" por um ex-dirigente do organismo, o capitão-de-fragata Silva Ribeiro. Antes de ser filtrada pela imprensa, a lista tinha sido distribuída numa comissão parlamentar com 22 deputados, encarregue, precisamente, de investigar irregularidades e fugas no SIEDM, incluindo uma acusação contra o ministro da Defesa, Veiga Simão, por tentar averiguar "movimentações de almirantes e generais" denunciada meses antes pelo "Expresso".Mas as suspeitas de fugas de informação eram mais antigas ainda. Segundo outro ex-director do SIEDM, Monteiro Portugal, começaram depois de uma primeira auditoria conduzida pela Procuradoria-Geral da República no Verão de 1998. Quando o escândalo finalmente rebentou, quase um ano mais tarde, deu a volta ao mundo.Os responsáveis militares rasgaram as vestes e acusaram o governo de ter cometido uma "irresponsabilidade sem precedentes" por ter "queimado" toda a rede de espionagem militar. Durão Barroso, então líder da oposição, disse que era "inconcebível" o facto de o ministro da Defesa conhecer "a identidade dos agentes secretos". Paulo Portas acusou o executivo de ultrapassar "todos os limites da falta de sentido de Estado".Em declarações ao i, um formador do SIEDM, José Manuel Anes considera que a gravidade do incidente foi "enorme". "Todo o país que se respeita a si próprio tem de proteger os seus agentes de informação, muito em particular aqueles que estão no exterior. Se forem reveladas as identidades, essas pessoas correm risco de vida", recorda Anes, membro do conselho consultivo do Observatório do Terrorismo. A lista de espiões publicada por Inês Serra Lopes no antigo semanário de Portas tinha os nomes riscados, mas explicava como fora forjado o relatório e o roteiro até ao parlamento. Veiga Simão demitiu-se no próprio dia do governo liderado por António Guterres e só voltou a falar do assunto três anos mais tarde, depois de abandonar o PS e acusar o ainda primeiro-ministro de "postura imoral" por permitir "calúnias e vexames a um seu colaborador". Numa carta divulgada pelo "Público", justificava o fim da militância e acusava Guterres de, três anos mais tarde, não ter cumprido a "promessa de repor a verdade". O erro fatal de José Veiga Simão, hoje com 80 anos, é ainda mais difícil de explicar tendo em conta o longo currículo académico e político: foi doutorado em física nuclear pela Universidade de Cambridge e ministro da Educação Nacional entre 1970 e 1974. Durante esta etapa, defendeu a "democratização do ensino" e negociou com Marcelo Caetano o arquivamento dos processos relacionados com a crise académica de Coimbra, em 1969. O jornalista Eurico Mendes sugere que foi um intermediário do regime salazarista nas negociações com o MFA. Era amigo do general Spínola , que o nomeou embaixador nas Nações Unidas.De regresso a Portugal, foi ministro da Indústria no governo do Bloco Central, entre 1983 e 1985. Só muitos anos depois regressou ao governo, desta vez como titular da Defesa, onde substitui António Vitorino" (pelo jornalista Enrique Pinto-Coelho, do Jornal I)

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