segunda-feira, agosto 04, 2014

Um texto de opinião pessoal que subitamente ficou desactualizado...

Tinha eu um artigo sobre esta patifaria mafiosa no BES pronto para enviar para a secretaria de redação do Jornal da Madeira destinado a publicação na 3ª feira. Com estas medidas hoje reveladas, lá se foi o texto mas mesmo assim não hesito em publicá-lo:

Penso que já todos perceberam, os que acompanham mais de perto estas questões, e aqueles que irresponsavelmente ainda acreditam teimosamente no Pai Natal, quando sabem que não o deviam, que o que se passou no BES, seja o banco, seja o grupo Espírito Santo, é um tremendo regabofe que veio colocar a nú as patifarias do capitalismo e as vulnerabilidades de grupos financeiros, sem princípios, sem valores, sem regras, sem ética, que durante anos agiam com base na suposição, em meu entender permitida pelo próprio poder político, de que eram uma espécie de "donos de tudo isto", que controlavam todo o seu processo de decisão, que manipulavam os factos em função dos seus interesses, que funcionavam mais na lógica da defesa do captalismo selvagem e nojento e dos seus tentáculos do que na defesa do país e do seu povo.
O que é caricato neste processo é que não fosse uma denúncia anónima - curiosa e estranhamente ainda de contornos pouco claros, embora muitos digam que tudo isso resultou de uma guerra familiar - e ninguém saberia hoje o que se passava no BES. Pelo contrário, a tendência seria para um agravamento criminoso de tudo o que por lá se passava, abafando aquilo que penso que a justiça e o regulador têm o dever de colocar cá fora para que as pessoas tenham a noção dos factos.
O absurdo de tudo isto é que ao mesmo tempo que vemos o BES processar judicialmente clientes, que devido à crise, à queda abrupta e criminosa de rendimentos e à asuteridade, deixaram de poder cumprir os seus compromissos nos termos emque o vinham fazendo, porque tinham rendimentos para isso - muitos desses clientes que deviam algumas poucas dezenas de milhares de euros, quase sempre por terem sido aliciados na compra de habitação própria - andou anos a essconder todas estas patifarias que conduziram o banco a um buraco tremendo que poderá ser, na realidade, da ordem dos 5 a 6 mil milhões de euros, sem que os mentores, protagonistas e executantes de tudo isto sejam minimanente beliscados numa responsabilização criminal e judicial que já deveria ter sido posta em excecução.
Neste quadro, quando leio na comunicação social declarações, do próprio Passos, admitindo que o BES no âmbito da urgente recapitaliação (pessoalmente não acredito que os acionistas privados garantam os recursos financeiros urgentes que o banco precisa neste momento como de pão para a boca) pode ter que aceder aos cerca de 6 mil milhões de euros que ficaram disponíveis da verba da troika (12 mil milhões) inicialmente reservada ao setor bancário, a primeira reação é a de que este povo tem que sair do marasmo em que se encontra, do seu acomodamento passivo, da ideia tonta que tudo isto é assunto de políticos, tem que vir para a rua impor uma espécie de justiça popular em temos de observância de valores éticos e de exigência de uma resposta célere da justiça, do regulador e da investigação do Ministério Público, e de exigência da verdade absoluta a quem governa.
Custa-me muito acreditar a insinuação, que já vi escarrapachada nas redes sociais, que o facto do BES ser agora liderado por um economista identificado com o governo de coligação bandalho, que chegou a fazer declaraçães mais rafeiras que as proferidas pelos ministros mais radicais deste repugante governo, que inventou a teoria dos portugueses a "viverem acima das suas possibilidades" mas sem denunciar as responsabilidades de um sistema bancário-captalista corrupto e bandalho do qual ele próprio (Vitor Bento) fez parte enquanto gestor de uma instituição ligada ao sector bancário, juntando-se a tudo isto o facto de ter sido membro do Conselho de Estado por escolha pessoal de Cavaco, sejam razões suficientes para uma qualquer tramóia qualquer destinada a salvar o BES a todo o custo.
Como é possível que se ande a discutir os termos em que o banco vai recorrer a esse dinheiro público - que aliás é pago pelos portugueses em cada dia que passa - sem sabermos ao certo que se passou no BES e no Grupo Espírito Santo, qual a dimensão efetivamente real do buraco, que patifarias foram ali praticadas, quais os fretes das empresas de auditoria das contas do banco, qual o papel do Banco de Portugal, que cumplicidades existiam entre os antigos responsáveis pelo BES e a política e o regulador, que erros foram cometidos pela regulação, etc? Como é que depois do BES ter andado a distribuir durante anos dividendos de milhões, depois do Grupo Espírito Santo se financiar no BES em condições que ainda não conhecemos, deixando a dúvida sobre se os gestores do banco entendiam a instituição como "propriedade" sua e não como uma instituição dos accionistas e dos clientes dotadas de regras próprias de funcionamento.
Temo muito sinceramente - e reparem que não emiti qualquer opinião sobre a possibilidade da capitalização do BES ser feita à custa de injeção de dinheiro da troika pago pelos portugueses no âmbito do emprestimo ao país de 78 mil milhões de euros - que depois de Vitor Bento, usando da sua conhecida influência pessoal, resolver a questão da capitaliação, que o BES vai avançar com despedimentos e com o encerramento de balcões e de estruturas financeiras diretamente dele dependentes, criadas no quadro de uma doentia megalomania facilmente colada aos anteriores responsáveis pelo banco (LFM)